Pressionada, inclusive por aliados, a mudar a diretoria da Petrobras, a presidente Dilma Rousseff disse ontem que não pretende fazer alterações e defendeu a gestão de Graça Foster à frente da estatal. Em café da manhã com os jornalistas que fazem a cobertura diária do Palácio do Planalto, Dilma, no entanto, reconheceu que fará alterações no conselho administrativo da Petrobras. As mudanças, entretanto, dependem da composição da Esplanada do próximo governo. Antes de anunciar os nomes dos próximos ministros, porém, a presidente disse que consultará o Ministério Público para saber se os cotados foram citados na Operação Lava-Jato. Aos jornalistas, a presidente admitiu que abrirá o capital da Caixa Econômica Federal e que o Banco de Desenvolvimento Social e Econômico terá um papel diferenciado no próximo governo (leia mais na página 3). 

Ao chegar ao Salão Leste do Planalto e se deparar com a mesa de café da manhã, a presidente - 4kg mais magra - disse logo que não podia saborear nada do que estava na mesa e bebeu apenas suco de melancia enquanto conversava com os jornalistas. O bate-papo começou com uma pergunta sobre os ministeriáveis. Segundo a presidente, os nomes devem sair até segunda-feira e poderão ser anunciados em uma ou duas etapas. Um dos pontos que faltam ser definidos é a fatia do PMDB na Esplanada. No fim da tarde, ela chamou o vice-presidente da República e presidente do PMDB, Michel Temer, para uma conversa. O principal interlocutor do partido sobre a reforma ministerial ficou cerca de 30 minutos com a presidente. Faltam fazer alguns ajustes e a expectativa é que o martelo sobre os nomes seja batido ainda hoje. 

Antes de fechar os nomes, entretanto, a presidente disse que perguntará ao Ministério Público se "há alguma coisa contra fulano que me impeça de nomeá-lo". Um dos nomes que corre perigo de ser excluído é o do presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), que estava cotado para entrar na fatia do partido, mas foi supostamente citado na delação premiada do ex-diretor de Abastecimento da Petrobras Paulo Roberto Costa. 

Só depois de concluir o redesenho da Esplanada é que a presidente decidirá o futuro da Petrobras. Segundo ela, o conselho administrativo da empresa só será definido após a escolha do futuro ministro de Minas e Energia, ao qual é subordinado. O principal cotado para o cargo é o senador Eduardo Braga (PMDB-AM). Apesar das críticas, Foster e os demais diretores continuam nos cargos. "Eu conheço a Graça, sei da seriedade da Graça e da lisura da Graça", elogiou Dilma. A presidente destacou que levou um ano "trabalhando" para colocar Foster na diretoria da estatal, em substituição ao antigo comando da Petrobras. "Pergunte quais os interesses que estão por trás disso? A quem interessa tirar a Graça?" 

Nota de crédito 

Além de defender a diretoria, a presidente reforçou que o governo fará todos os esforços para evitar o rebaixamento da nota de crédito da Petrobras, o que dificultaria a captação de recursos no exterior. Ela, contudo, frisou que a estatal tem dinheiro em caixa suficiente para enfrentar o ano sem precisar recorrer a empréstimos no mercado. "Não vamos compactuar com qualquer processo de fragilidade da Petrobras, nem alterar o processo de partilha do pré-sal", assegurou. Ela também explicou que o balanço da empresa, atrasado desde novembro, não foi publicado por falta de informações seguras sobre as perdas provocadas pelos atos de corrupção na empresa. Questionada se esse levantamento não poderia levar anos, Dilma reagiu com aspereza. "Não se pode investigar um ato de corrupção por anos, isso reforça a impunidade. Queremos celeridade, eficiência e punição", cobrou a presidente. 

Em uma hora e 20 minutos de conversa, a presidente também traçou um panorama da situação econômica do país, abordou temas que permearam a campanha e fez uma defesa da sua gestão. Na avaliação dela, o governo atual foi objeto do "maior escrutínio possível. "Poucos presidentes sofreram um ataque tão grosseiro quanto eu, no jogo de abertura da Copa. Não digo em escala mundial, porque, lá fora, algumas vezes se matam presidentes", ironizou. Para Dilma, é preciso saber perder. "Essa história de querer pedir impeachment a cada virada do ponteiro do relógio é algo ultrapassado", protestou. "É algo do Brasil da década de 1980, não desta década", disparou. Quando já tinha tentado encerrar o bate-papo, a presidente foi questionada se era teimosa. Em resposta a última pergunta dos jornalistas, Dilma parafraseou Guimarães Rosa em Grande Sertão Veredas e arrematou. "A vida é perigosa. Se não teimar, você não sobrevive", encerrou. 

Ponto a ponto 

Confira os principais trechos da entrevista da presidente Dilma Rousseff 

Petrobras 

Dilma disse achar um absurdo "os volumes de dinheiro" envolvidos no esquema. Ela fez uma forte defesa da presidente da empresa, Graça Foster, negou que pretenda mudar a diretoria, mas admitiu que fará alterações no Conselho Administrativo da Petrobras. Segundo ela, não há provas contra Foster. "Tem que ter alguma prova apresentada sobre qualquer conduta da presidente da Petrobras, Graça Foster. Eu conheço a Graça. Eu sei da seriedade da Graça. Sei da lisura da Graça", enfatizou. "Eu não vejo nenhum indício de irregularidade na conduta da atual diretoria da Petrobras. Eu não compactuo com indício de irregularidade", acrescentou. Ela também destacou que foi na gestão de Foster que as investigações foram abertas. 

Balanço da Petrobras 

A presidente disse que a estatal tem adiado a divulgação do balanço por causa das denúncias de desvio de verba na empresa. "É de todo oportuno que se saiba o terror das delações premiadas porque se não soubermos, não saberemos o volume indevidamente retirado dos cofres da Petrobras", disse. Segundo ela, a empresa aguarda informações do Ministério Público e o valor será lançado como prejuízo. "Nós estamos esperando. Na reunião do conselho, resolveram postergar", arrematou. 

Corrupção 

Sobre a possibilidade de um esquema de corrupção semelhante ao da Petrobras existir em outras estatais, a presidente destacou que se aparecer em qualquer outro lugar, ela tomará providências. "Eu quero dizer que tem um nível de especulação que carece de base técnica. Não estou dizendo que não possa aparecer, pode. Agora, pode aparecer em qualquer empresa privada do Brasil, em qualquer lugar", disse. Para a presidente, no entanto, é preciso que indiquem os indícios. "Não pode ser acusação ao vento. Porque aí se cria uma situação absurda. Nós temos que investigar e punir. Isso não significa acabar com as empresas, não significa acabar com os empregos", emendou. 

Reforma ministerial 

Prestes a anunciar a nova composição da Esplanada, a presidente disse que, para bater o martelo, consultará o Ministério Público para saber se a pessoa está envolvida na Operação Lava-Jato. "Qualquer pessoa que eu for indicar, eu consultarei o que tem quanto à pessoa. Eu não quero que ele (o procurador-geral da República, Rodrigo Janot) me diga o quê. Eu só quero que ele me diga sim ou não", disse. "Eu vou perguntar o seguinte: há alguma coisa contra fulano que me impeça de nomeá-lo? Só isso que vou perguntar. Não quero saber o que ele não pode me dizer. Como disse outro dia o Mujica, muito sabiamente, a gente não pede coisa que não podem dar nem pergunta coisas que não podem ser respondidas", pontuou. 

Indicações políticas 

Questionada sobre a possibilidade de reduzir as indicações dos partidos por causa do escândalo da Petrobras, a presidente disse que não há uma disputa de políticos versus técnicos e que ninguém está acima do bem ou do mal. "Eu não vou demonizar aqui indicação política. Se vocês querem isso, não contem comigo. É de um simplismo grotesco em um país fazer isso. É não ver um palmo à frente do nariz no resto do mundo", reiterou. Para ela, essa categoria políticos são maus e técnicos são bons, não convence. "Não acho que a corrupção seja uma questão do lugar em que a pessoa está situada." 

Economia 

Para o próximo ano, os brasileiros podem esperar uma reorganização da economia, com medidas drásticas. Segundo a presidente, isso, no entanto, não significa em hipótese alguma reduzir os programas sociais. Segundo ela, as medidas drásticas são como a redução em R$ 8 bilhões do Programa de Sustentação do Investimento (PSI). Ela negou, contudo, as especulações de cortes na ordem de R$ 100 bilhões. "Isso é chute puro. Esse número não foi discutido internamente ainda." 

Caixa Econômica e BNDES 

A presidente admitiu que abrirá o capital da Caixa Econômica Federal, mas reconheceu que isso não será feito agora. "Eu vou (abrir o capital), mas demora", disse. Dilma também reconheceu que o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) exercerá um papel diferente em seu segundo mandato, como adiantou a coluna Brasília-DF. "Precisamos ter uma participação maior dos bancos privados nos processos de financiamento de longo prazo. O país não aguenta esse processo concentrado todo nos bancos públicos." 

Porto em Cuba 

Sobre a decisão dos Estados Unidos de reatar as relações diplomáticas com Cuba, a presidente disse que a melhor forma de se relacionar com a ilha caribenha é o investimento. "Agora que os EUA reconheceram a relação com Cuba, parece que eles (a oposição) sancionaram também a legalidade do nosso empréstimo. É ridículo isso, gente, vocês me desculpem. Mas é ridículo não ser capaz de ter autonomia num país desta envergadura. (.) A melhor forma de se relacionar com Cuba não é o bloqueio, é o investimento. Agora que o porto é mais perto da Flórida, ficou um "must"", arrematou. 

Impeachment 

Em uma repetição do discurso de que prega o republicanismo, a presidente acrescentou uma crítica aos que pedem o impeachment dela. Segundo Dilma, uma campanha eleitoral num regime democrático não é uma guerra, não tem a figura do vencido. "Acho que tem de saber perder, essa história de querer provocar impeachment a cada virada do ponteiro do relógio é pouco ultrapassada, eu diria. É ultrapassado, porque cabia no Brasil dos anos 1980, dos anos 1990, não cabe no Brasil desta década", disse.