Se depender da vontade da presidente Dilma Rousseff e da direção do PT, o deputado Eduardo Cunha não será o próximo presidente da Câmara. Até agora, no entanto, a presidente nem o partido fizeram nada para conter o avanço de Cunha, cuja candidatura ao cargo parece a cada dia mais consolidada. Dilma tem como atrapalhar os planos do líder do PMDB na Câmara, segundo os líderes aliados, mas para isso precisa organizar a tropa e a equipe da coordenação política do governo no segundo mandato. Ao contrário de 2010, quando venceu a eleição por larga margem de votos e assumiu o cargo sem um grande contencioso com o Congresso e os partidos, Dilma começa o novo governo com uma agenda parlamentar que exige mais eficiência política do Palácio do Planalto. A eleição para a presidência da Câmara é apenas um dos itens. Na pauta está a esperada lista de parlamentares capturada na Operação Lava-Jato, assunto que pode paralisar o Congresso no momento em que o governo mais precisará de apoio legislativo ao ajuste econômico. Isso para não mencionar a ameaça permanente da oposição de pedir o impeachment da presidente da República. A pouco mais de 15 dias da posse, a presidente está atrasada na política, dizem líderes aliados. Dilma precisa se definir com urgência sobre a eleição para presidente da Câmara. Até as pedras do Alvorada sabem que ela não quer dividir a Praça dos Três Poderes com o deputado Eduardo Cunha, mas é consenso entre os partidos que o deputado do PMDB construiu uma candidatura forte, difícil de ser batida. Aliados de Dilma com experiências nas eleições para o Congresso, desde os governos Lula da Silva, afirmam que ainda é possível articular uma candidatura forte o suficiente para bater de frente ou negociar em melhores condições com o líder pemedebista. Em contas feitas no PT, um candidato efetivamente identificado com o Palácio do Planalto poderia largar com 200 votos, somados apenas os deputados do PR, do PSD, do bloco de esquerda imaginado pelo governador Cid Gomes (CE) integrado pelo Pros, PDT e PCdoB, de parte do PMDB sob a esfera de influência do vice-presidente Michel Temer e pelo PT, que está dividido mas pode ser enquadrado. A maioria de 258 deputados poderia ser alcançada em outros partidos, do PSOL a parte do PTB, que acaba de fazer o novo ministro da Indústria e Comércio, Armando Monteiro. Mas para isso precisa atender efetivamente as demandas partidárias e "empoderar" a equipe política, assim como fez com a nova equipe econômica. Na ponta do lápis, parece até fácil, mas as dificuldades começam na definição de um nome. Os nomes de que dispõe o PT dificilmente se elegeriam, como Arlindo Chinaglia (SP) e Marco Maia (RS), os dois ex-presidentes da Casa. O deputado José Guimarães (CE) é uma alternativa, tem trânsito no baixo clero mas é uma aposta para o futuro. Por enquanto, seria um bom nome para a liderança do governo na Câmara. E nos demais partidos da base aliada não há um nome que possa ser visto como uma solução natural. Por isso cresce entre os aliados do governo, ministros e setores do PT, sobretudo aqueles mais ligados a Lula, a ideia de um acordo com Eduardo Cunha. Por esse acordo, Cunha desistiria de fazer uma nova CPI da Petrobras, conforme tem prometido fazer sempre que se menciona a possibilidade de seu nome constar do listão da estatal. É a exigência número um. Cunha também teria de se comprometer a não encaminhar um eventual pedido de impeachment da presidente feito pela oposição. Pode parecer despropositado falar de impeachment recém-saído das urnas, mas a postura pós-eleitoral da oposição e as manifestações pedindo o impedimento da presidente fizeram o PT levar o movimento a sério. Na prática, seria a reedição do acordo de rodízio que PT e PMDB mantêm na Câmara desde o segundo mandato de Lula. Outro aspecto é o que fazer com o listão da Petrobras. Pelos cálculos dos líderes aliados, mais de 60 parlamentares já foram mencionados nas diversas delações premiadas ocorridas na esteira da Operação Lava-Jato. No entanto, boa parte dos envolvidos não deve retornar ao Congresso na próxima legislatura. Restaria algo entre 15 e 20 parlamentares. A ideia em curso é deixar tudo por conta do Supremo Tribunal Federal. O STF julgaria primeiro quem é inocente ou culpado. O risco apontado é a paralisia do Congresso, se forem abertos tantos processos de cassação simultâneos. E o governo vai precisar que o Congresso não só funcione como também dê aval às políticas econômicas, num período politicamente difícil de inflação no teto da meta, juros altos, estagnação da economia e desemprego. Dilma ainda não designou seus ministros políticos, mas a base aliada e o PT já dão como inevitável que Aloizio Mercadante será o ponta de lança da presidente, que já comanda o espetáculo a partir da Casa Civil da Presidência da República. Apesar das críticas à arrogância e ao estilo um tanto estabanado do ministro, é reconhecido na base que Mercadante tem o mérito de ter colocado o pé na porta e abrir uma passagem para botar a política dentro do gabinete da presidente, que é avessa aos negócios com o Congresso. Falta definir qual será o papel, na equipe, do governador da Bahia, Jaques Wagner, ao lado do governador eleito de Minas Gerais, Fernando Pimentel, hoje as duas principais referências do PT, depois de Lula e Dilma. O governador não quer um posto no Palácio do Planalto, muito próximo das explosões temperamentais da ocupante da cadeira número um e de um Mercadante cioso da função de coordenação do governo. Pode ir para o Ministério das Comunicações, pois Dilma o quer por perto. O ministro da Secretaria de Relações Institucionais, Ricardo Berzoini, deve ficar, mas os líderes dizem que a presidente deve lhe dar poder efetivo, se quiser eficiência. Uma SRI reforçada pode vestir bem em Wagner; Berzoini então iria para Comunicações. O quarto elemento dessa configuração é Miguel Rossetto, cotado para a Secretaria-Geral da Presidência. Será um desperdício se ficar limitado à coordenação dos movimentos sociais, dizem os líderes. É uma equipe que pode funcionar, se Dilma delegar poder e der autonomia ao grupo - e seus integrantes não boicotarem um ao outro.

 

 

Aliados tentam neutralizar ofensiva contra Kátia Abreu

 
O embate pelo comando do Ministério da Agricultura obrigou uma contraofensiva de aliados da senadora Kátia Abreu (PMDB-TO), que já se movimentam para reforçar a indicação da pemedebista. O objetivo é neutralizar a resistência do Grupo JBS e de movimentos sociais, até que sua indicação seja formalizada. A presidente Dilma Rousseff não recuará da indicação de Kátia, que será anunciada no pacote de nomeações do PMDB. O nome da pemedebista ainda não foi formalizado porque ela precisa ser empossada na presidência da Confederação da Agricultura e Pecuária (CNA), onde assumirá o terceiro mandato consecutivo. A posse ocorrerá no dia 15, e contará com a presença de Dilma. Além disso, ela será anunciada no conjunto dos nomes do PMDB, conforme pactuado por Dilma com o vice-presidente Michel Temer e o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), embora Kátia (ex-DEM e ex-PSD) seja considerada uma estrangeira na sigla. O Valor mostrou que o Grupo JBS - maior doador da campanha à reeleição de Dilma - reagiu ao anúncio informal de Kátia para o ministério. Um dos executivos da empresa, líder mundial no processamento de proteína animal, Joesley Batista, reuniu-se com o ministro-chefe da Casa Civil, Aloizio Mercadante, para desaconselhar a nomeação da pemedebista. O enfrentamento entre Kátia e o JBS tornou-se público em agosto do ano passado, quando o grupo lançou a campanha publicitária da Friboi, inaugurando a estratégia de conferir grife à carne brasileira. A senadora subiu à tribuna para defender os pequenos e médios frigoríficos, acusando o grupo de prática de monopólio. " Peço que todos denunciem e pressionem esse cartel, especialmente o BNDES. Que se retire essa propaganda enganosa! Não são só eles que têm carne boa, mas todos os que têm certificados municipal, estadual ou federal", protestou. Kátia lembrou que o banco de fomento concedeu crédito de R$ 7 bilhoes para o grupo empresarial. Outro capítulo da disputa entre a senadora e o JBS envolve a substituição do secretário de Defesa Agropecuária, Ênio Marques, um dos maiores especialistas na área, pelo advogado Rodrigo Figueiredo, ligado ao grupo, que impôs seu nome. Para Kátia, esse movimento prejudicou o poder de representação dos frigoríficos pequenos e médios junto ao ministério. Enquanto a indicação formal não vem, Kátia fica sob bombardeio. Nesse contexto, lideranças do setor movimentam-se em sua defesa. Pelo menos 25 das 27 federações estaduais ligadas à CNA, entidade presidida por Kátia desde 2008, elaboraram uma carta defendendo sua gestão. O documento será enviado para suas redes de sindicatos rurais, associações e serviços filiados ao Sistema S, como o Serviço Nacional de Aprendizagem Rural (Senar), nos Estados. Em outra frente, executivos de grandes empresas da indústria de carnes reforçam a frente pró-Kátia. "Hoje o poder de representatividade no ministério está concentrado no JBS, que tem excelência em gestão", diz José Zeferino Pedroza, presidente da Federação de Agricultura e Pecuária de Santa Catarina. "Tem muita gente torcendo para que a Kátia assuma e garanta igualdade de condições", completa. Também aumenta a pressão contra Kátia em outras frentes, como movimentos sociais, como o Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST) e lideranças indígenas. Veio a público processo relativo às eleições de 2010, em que o Ministério Público Eleitoral no Tocantins acusa a senadora de fraude na campanha de seu filho, Irajá Abreu (PSD-TO), eleito deputado federal. O processo aguarda julgamento no Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Sem nenhum aceno do governo, o atual ministro, Neri Geller (PMDB), fez movimentos para continuar no cargo. Mas uma operação da Polícia Federal que investiga o comércio ilegal de áreas da reforma agrária no Mato Grosso enterrou seus planos. Seus irmãos, Odair e Milton Geller, chegaram a ser presos no curso da investigação. Procurada, a JBS diz que "nunca desaconselhou a indicação de Kátia e não tem nada contra a senadora".