Após derrota política, a defesa do arrocho

Correio Braziliense - 03/02/2015

AMANDA ALMEIDA / ANDRÉ SHALDERS

Na mensagem enviada aos parlamentares, Dilma afirma que não haverá recessão. Opositor chama a presidente de "mentirosa" em trecho do discurso sobre refinaria nordestina
Com a previsão de que enfrentará dificuldades para dar andamento aos projetos de interesse do governo no Congresso, a presidente Dilma Rousseff focou a mensagem enviada aos parlamentares no primeiro dia de trabalho da legislatura na defesa das medidas econômicas anunciadas pelo ministro da Fazenda, Joaquim Levy. Parte das decisões precisa ser aprovada pelos congressistas. Dilma assegurou que não haverá recessão e justificou as iniciativas, atacadas pela oposição, como meio de dar continuidade à inclusão social.
O texto foi lido ontem pelo primeiro-secretário do Congresso, deputado Beto Mansur (PRB-SP), ao plenário lotado de parlamentares. O ministro da Casa Civil, Aloizio Mercadante, e o ministro da Secretaria de Relações Institucionais, Pepe Vargas, foram os representantes da presidente na solenidade de abertura dos trabalhos legislativos. Pelo Poder Judiciário, o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Ricardo Lewandowski, compôs a Mesa e entregou um balanço dos trabalhos da Corte e do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) aos parlamentares.

No texto, Dilma minimiza os problemas na economia do país. "A inflação, por exemplo, foi mantida em 2014, mais uma vez, dentro do intervalo admitido pelo REGIME das metas inflacionárias, assim como em todos os demais anos do meu mandato", diz a presidente. Ela admite, no entanto, que o controle da inflação será a prioridade da "gestão macroeconômica". Dilma atribuiu a alta dos preços dos alimentos à seca. "Enfrentamos, em anos sucessivos, um choque no preço dos alimentos devido ao pior regime de chuvas de que se tem registro."

Segundo a presidente, essa "alta dos preços dos alimentos" é um dos dois choques que a economia brasileira vem sofrendo. Dilma diz que o outro é a "redução expressiva nas taxas de crescimento" da economia mundial. Na lista de países afetados, ela citou a China. A presidente afirmou ainda que as "medidas corretivas" do governo não afetarão "a redução das desigualdades, a eliminação da pobreza e a ampliação dos direitos sociais". "São medidas necessárias para atingir um objetivo de médio prazo, que, em nosso caso, permanece o mesmo: crescimento econômico com inclusão social. Não promoveremos recessão e retrocessos."

"Petrolão"

Beto Mansur precisou de 1 hora e 18 minutos para ler a mensagem de Dilma. Foi ignorado pela maioria do plenário. Dispersos, os parlamentares conversavam em tom alto, enquanto poucos prestavam atenção ao texto lido pelo colega. Alguns chegaram a cobrar agilidade do orador. No meio da leitura, quando Mansur reproduzia trecho em que Dilma defende a construção Refinaria de Abreu e Lima, em Pernambuco, os deputados José Carlos Aleluia (DEM-BA) e Antônio Imbasahy (PSDB-BA) gritaram "Petrolão" e "mentirosa". A obra foi citada por delatores da Operação Lava-Jato como uma das que foram alvo de superfaturamento.

No texto, Dilma repetiu temas do discurso de posse, feito no mês passado. Citou o lema "Pátria Educadora", garantindo que promoverá a universalização do "ensino de qualidade em todos os níveis". A presidente disse ainda que encaminhará ao Congresso proposta para aumentar a participação do governo federal no planejamento da segurança pública.

Mais brevemente do que o texto enviado por Dilma, Cunha, o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), e Lewandowski também discursaram. Em comum com a presidente, os comandantes da Câmara e do Senado prometeram dar prioridade à reforma política. "Podemos destacar, como imediata prioridade para ser tratada pelo Poder Legislativo, a reforma política, ponto que todos têm em mente que, obrigatoriamente, teremos que apreciar", disse Cunha. "Como disse ontem (domingo) ao Senado Federal, é preciso melhorar a política para que a política ajude a melhorar o Brasil. Uma das nossas propostas é, sem dúvida alguma, a reforma política, que se arrasta neste parlamento há 12 anos", acrescentou Renan.

Recado palaciano

Confira os principais tópicos abordados pela presidente Dilma Rousseff na mensagem enviada ao Congresso Nacional

Medidas econômicas

"Ajustes fazem parte do dia a dia da política econômica, bem como do cotidiano de empresas e pessoas. Ajustes nunca são um fim em si mesmos. São medidas necessárias para atingir um objetivo de médio prazo, que, em nosso caso, permanece o mesmo: crescimento econômico com inclusão social. Não promoveremos recessão e retrocessos."

Inflação

"No mandato que se inicia, manteremos o controle da inflação como prioridade da gestão macroeconômica. Ainda que o IPCA tenha permanecido, pelo 11° ano consecutivo, dentro do limite definido, queremos resultados ainda melhores e vamos dedicar esforços para que a inflação convirja para o centro da meta nos próximos anos, o que resultará, em médio prazo, em maior bem-estar para a população e em mais competitividade para a nossa economia."

Segurança pública

"Queremos, ademais, propor uma nova forma de atuação dos governos na área de segurança pública. Submeterei ao Congresso Nacional proposta de alteração da Constituição Federal de 1988 para que a segurança pública se torne atividade comum de todos os entes federativos."

Educação

"Nossa grande prioridade neste novo mandato será fazer do Brasil uma pátria educadora. Perseguiremos obsessivamente o objetivo de universalizar o acesso a um ensino de qualidade em todos os níveis, democratizando o acesso ao conhecimento. Sabemos perfeitamente que só a educação de qualidade para todos, em todos os níveis, mudará, em definitivo, o patamar econômico, social e tecnológico do Brasil."

Reforma política

"Conto com o Congresso Nacional para realizarmos a tão demandada, e sempre adiada, reforma política, de responsabilidade constitucional do Poder Legislativo. Urge definir novas regras para a escolha dos representantes da população nas Casas legislativas e estabelecer novas formas de financiamento das campanhas eleitorais."

Corrupção

"Temos combatido sem trégua a corrupção, com a criação de leis mais severas e pela ação, livre de amarras, dos órgãos de controle interno, pela autonomia da Polícia Federal como instituição de Estado, e pela independência assegurada ao Ministério Público. Ao contrário do que acontecia até um passado recente, hoje o Brasil avança firme no combate à sua histórica impunidade."

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Oposição ironiza discurso

Correio Braziliense - 03/02/2015

A oposição reagiu à mensagem enviada pela presidente Dilma Rousseff. Além de taxar o texto de "peça de ficção", os adversários da petista mandaram o recado de que darão prioridade à instalação de comissões parlamentares de inquérito para investigar aliados do governo federal. "Nós queremos dar continuidade à CPMI da Petrobras, que foi interrompida pela mão do Planalto, para que retome as investigações de onde parou. E temos também a do BNDES, a do Setor Elétrico, a dos Fundos de Pensão. São CPIs importantes para que o país possa investigar aquilo que o governo não deixa ser investigado", disse o líder do PPS na Câmara, Rubens Bueno (PR). Ontem, a oposição começou a recolher assinaturas para a criação dos colegiados.
O deputado paranaense afirmou ainda que a oposição não vai trabalhar pelo impeachment da presidente Dilma. "Ninguém fala nisso. Nós estamos falando é do Brasil, das dificuldades que tem, pelos erros que o governo cometeu durante quatro anos e que nós temos, urgentemente, que consertar. E fazer mudanças estruturais para modernizar o país".

Escolhido para liderar o DEM no Senado em 2015, Ronaldo Caiado (GO) foi duro nas críticas à presidente. "Nós assistimos a uma mensagem que carece de credibilidade. O que ela apresentou aqui não tem nenhuma compatibilidade com o que está ocorrendo no país. É mais uma peça de ficção do que realmente uma mensagem que pudesse trazer qualquer sentimento desse momento grave pelo qual passa a economia brasileira, com uma crise social que se instala. Acho que deixou muito a desejar", disse Caiado, logo após a leitura da mensagem presidencial pelo deputado Beto Mansur (PRB-SP).

O líder do PSDB na Câmara, Carlos Sampaio (SP), concordou com o senador democrata. "O Brasil ao qual a presidente Dilma se refere, o das mil maravilhas, não é o Brasil real, que sofre com as incompetências e omissões de seu governo. A mensagem ao Congresso é mais uma peça de ficção, ação de marquetagem, uma tentativa de ocultar os problemas reais com os quais os brasileiros se deparam: inflação alta, economia estagnada, apagão, aumento de impostos e risco de desemprego", afirmou.

Para Sampaio, a mensagem "reforça a desconfiança da sociedade". "A presidente gerentona das propagandas do PT é a mesma que deixou os projetos de infraestrutura do PAC ao Deus dará; a especialista em energia é a mesma que desestruturou o setor elétrico à base da canetada e que permitiu que, hoje, o país conviva com apagões e com o risco de racionamento." (AA e AS)

"A mensagem ao Congresso é mais uma peça de ficção, ação de marquetagem, uma tentativa de ocultar os problemas reais com os quais os brasileiros se deparam: inflação alta, economia estagnada, apagão, aumento de impostos e risco de desemprego"

Carlos Sampaio (SP), líder do PSDB na Câmara

"Nós assistimos a uma mensagem que carece de credibilidade. O que ela (Dilma) apresentou aqui não tem nenhuma compatibilidade com o que está ocorrendo no país"

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Reguffe corta despesas

Correio Braziliense - 03/02/2015

GRASIELLE CASTRO

O ano dos dois novos representantes do Distrito Federal no Senado começou com a intenção de buscar uma marca própria. Na abertura dos trabalhos, o senador José Antônio Reguffe (PDT) apresentou nove ofícios à Direção-Geral, em que abriu mão de uma série de benefícios aos quais os congressistas têm direito. No mandato, ele disse que economizará R$ 16,7 milhões. O senador Hélio José (PSD), que assumiu a cadeira do governador Rodrigo Rollemberg (PSB), aproveitou o dia para sentir como será o clima na Casa. Ele promete trabalhar por alternativas na matriz energética. "Ouvimos o que o governo pensa e podemos perceber como será a boa vontade do Planalto conosco", disse. Já o veterano senador Cristovam Buarque (PDT), que inicia a segunda legislatura, teve um dia de "gratidão e frustração", devido "à luta por tentar mudar a cara do Senado".
O primeiro ato de Reguffe seguiu a ideia do correligionário. Com o foco de manter o mandato com base em três pilares -a reforma política, a redução da carga tributária e de gastos com o mandato -, o senador anunciou o corte de despesas que, se seguido pelos colegas, poderia gerar uma economia de mais de R$ 1,3 bilhão. "Só de gastos diretos, isso sem contar os encargos que essas contas geram, como gasolina, entre outros", disse. "Prometi reduzir o número de servidores para 14, e acabei ficando com 12", exemplificou. Entre as despesas que o senador cortou, estão os salários extras que os parlamentares recebem no início e no fim de cada legislatura, a Cota para Exercício da Atividade Parlamentar e o plano de saúde vitalício. Ao abrir mão da cota, a economia será de R$ 2 milhões nos oito anos de mandato.

Também com a bandeira da mudança na Casa, Cristovam viveu, no domingo, um dia de articulação política para tentar eleger o senador Luiz Henrique (PMDB-SC) presidente da Casa. Ontem, o pedetista lamentou a vitória de Renan Calheiros (PMDB-AL). "Perdemos a grande chance de dar um salto no Senado, de colocar o Senado em sintonia com as ruas, que pediram mudanças", diz. Na opinião dele, a relação entre o governo e o senador Luiz Henrique seria mais republicana. Ainda na segunda-feira, Cristovam dedicou o dia à pauta do DF, em uma conversa com a bancada do PDT e o governador Rollemberg.