O sistema de bandeiras tarifárias nas contas de luz, em vigor desdeo iníciode janeiro, já vaisofrer ajustes. Está na mesa da presidente Dilma Rousseff um decreto que aumenta, em torno de 50%, o valormáximo da "tarifa extra"paga pelos consumidores quando os reservatóriosdashidrelétricasesti-verem baixos. No caso da bandeira vermelha, que sinaliza o acionamento intensivo das usinas térmicas, o valor deve subir dos atuais R$ 30 para cerca de R$ 45 por me-gawatt-hora(MWh).

Com essa medida, o governo pretende resolver definitivamente os problemas financeiros das distribuidoras,quevãocontinuar enfrentando restrições de caixa para a liquidaçãomensal de seus contratos de energia em 2015. A tendência é que os novos valores possam ser aplicados a partir de março. No ano passado, o governo precisou recorrer a empréstimos bancários de R$ 17,8 bilhões para socorrer as distribuidoras, por causado forte uso das térmicas eda exposiçãoao mercado de curto prazo(que tempreços mais altos). Na prática, o aumento das bandeiras tarifárias antecipa o fluxo de caixa das empresas, que só receberiam esse dinheiro no momento da aplicação dos reajustes anuais.

O sistema de bandeiras tarifárias permite o repasse mensal, aos consumidores, do custo extra das distribuidoras com o uso de termelétricas. Elas não representam maior custo na conta de energia porque a RECEITA adicional obtida pelas distribuidoras com a aplicação das bandeiras amarela ou vermelha é considerada como redutor no momento do cálculo das tarifas de cada concessionária. Pa-raogoverno,acorficarávermelha durante todo oano, disparando o "gatilho"imediatodascontas.

Em outra iniciativa, que deve agradar às empresas, a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) anunciará anova taxa de retorno sobre ocapital investido das distribuidoras -Wacc, na sigla em inglês. Esse índice, que era de 9,95% ao ano para o segundo ciclo de revisões tarifárias (2007-2010), havia caído para 7,5% no período seguinte (2011-2014).

No quarto ciclo de revisões, entre 2015 e2018, a agência divulgou no ano passado uma taxa de 7,16% para remunerar os investimentos feitos pelas distribuidoras em suas redes. Depois de uma queda de braço com as empresas, que alegavam deterioração das condições de mercado nos últimos anos, a Aneel deverá fixar uma rentabilidade superior àsua proposta original -a área técnica sugere um índice de 8,09%.

Diante do agravamento da crise no setor elétrico,avertente financeira não é mais a única fonte de preocupação do governo, que coloca agarantia de oferta como prioridade máxima. O embrião de uma ampla campanha publicitária, com apelo à redução voluntária do consumo, já se encontra no Palácio do Planalto.

A campanha aguarda, porém, aval da presidente Dilma para seguir adiante. Nada será executado antes do Carnaval. No dia 12, a princípio, haverá uma reunião de avaliaçãodo quadro de abastecimento energético. A partir daí, podem surgir medidas concretas, mas oobjetivo do governo é circunscrever todas as ações a uma "racionalização" de energia - com foco na economia espontânea, marcando diferença em relação ao racionamento de 2001, quando houve redução compulsória de 20% nas residências.

Embora concebido como uma medida financeira, o aumento da bandeira vermelha também deve desestimular o consumo,ao deixar as contas de luz mais caras.

Além de conversas com donos de shopping centers e SUPERMERCADOS para forçar o uso de geradores nos estabelecimentos comerciais, ogoverno pretende negociar diretamente com grandes indústrias eletrointensivas, principalmente aquelas que geram sua própriaenergia. Atentativa é convencê-las a diminuir o ritmo de produção no horário de pico, entre 14h e 16h, e fazê-lasinjetar no sistema interligado o excedente de energia. Só com o uso dos geradores, conforme estimativas reservadas do governo,seria possível obter 1,5 mil megawatts.

Apesar do reconhecimento de gravidade da crise, oP lanalto avalia que nada se compara à situação hídrica de São Paulo e o diagnóstico de assessores presidenciais é que um cenário caótico aguarda os paulistas. Oclima é de cooperação entre Dilma e ogovernador Geraldo Alckmin (PSDB), mas issonão elimina aexistência de algumas arestas.Na sexta-feira, quando esteve em Brasília, Alck-min levou uma "reprimenda" da ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira, depois que seus auxiliares disseram ter alertado a população com antecedência sobre o colapso do sistema Cantareira e terem insinuado suposto tratamento discriminatório da AgênciaNacionaldeÁguas(ANA) contraoEstadodeSãoPaulo.

A linha de defesa de Alckmin começa a ser de que o governo paulistaagiu de formamais rápida e transparente do que o Rio de Janeiro ou Minas Gerais. Na ava-liaçãoreservadadoPlanalto,oRio conseguirá atravessar o ano de 2015semumcolapsonoabasteci-mento de água, embora tenha que usar o volumemorto de suas principaisrepresas.EmMinas,auxiliares da presidente garantem que não será difícil jogar toda a responsabilidade pela crisehídrica no colo do PSDB,que governou oEstadonosúltimos12anos.

O Planalto já tem sinais de que a popularidade de Alckmin teria despencado, nas últimas semanas, mas a ordem é despolitizar a questão porque o sofrimento dos paulistas será grande, nas palavras de um assessor. Só um fato foi comemorado: a nomeação de Jerson Kelman, ex-presidente da ANA e da Aneel, para o comando da Sabesp. Ele goza da confiança absoluta da própria Dilma.

 

Especialistas aprovam medidas de eficiência energética

 

Rodrigo Polito

O presidente da consultoria PSR, Mario Veiga, aprovou as medidas em estudo pelo governo para estimular aeficiênciaenergética e a redução do consumo de energia. Oespecialista se referiu à ideia de estimular consumidores do setor de comércio e serviços a utilizar energia de geradores a óleo ediesel no novo horáriodepico,entre 14h e16h, eo plano de aumentar o valor das bandeiras tarifárias cobradas nas contas de luz.

"É o primeiro passo na adequação entre a realidade física do sistema e as regras. Essa medida está correta e pode efetivamente contribuir para aredução de problemas na ponta", disse o especialista sobre o estímulo ao uso de geradores no horário de pico. Ele, porém, admitiu que não será uma tarefa simples, já que existe toda uma estrutura tarifária em vigor que estimula o consumidor a utilizar esses equipamentos no antigo horário de pico, entre 18h e 20h. "Não sei o quanto você precisaria de instrumentos legais para fazer isso [a mudança]".

Segundo Veiga, comenta-se que existe um potencial da ordem de 9 mil megawatts (MW) de capacidade a ser adicionada ao sistema a partir de geradores a óleo e diesel já disponíveis por consumidores, como shopping centers e postos de gasolina.

Veiga afirmou que, em curtíssimo prazo,apenas medidas voltadas para a demanda de energia podem solucionar o aperto entreoferta edemanda de energia no país hoje. "A única coisa que pode fazer diferença para chegarmos no fim do ano com nível de armazenamento [dos reservatórios hidrelétricos] razoável são ações do lado da demanda", completou.

Para o diretor da Coppe/UFRJ e ex-presidente da Eletrobras, Luiz Pinguelli Rosa, "já passou da hora de se fazer uma política de economia de energia". Oespecialista enviou na última semana documento ao ministro de Minas eEnergia, Eduardo Braga, recomendando medidasderedução doconsumo.

O documento, assinado tam-bémpeloex-conselheirodeFurnas ediretor da ONG Ilumina, Roberto d"Araujo, alerta que o impacto da crise do setor ultrapassa os R$ 100 bilhões. Acifra inclui R$ 60 bilhões

avaliados pelo Tribunal de Contas da União (TCU) relativos à Conta de Desenvolvimento Energético (CDE) eaos empréstimosfeitos pela Câmara de Comercialização de EnergiaElétrica(CCEE)parasocor-rer as distribuidoras, além do déficit de geração hídrica eaperda de valor da Eletrobras, devido à Medi-daProvisória 579.

Pinguelli, Roberto d"Araujo e Veiga participaram de um debate, de mais de três horas de duração, com experientes especialistas do setor para discutir a situação do sistema e propor alternativas. Entre divergências técnicas e acadêmicas, houve pelo menos um consenso entre os especialistas: acrise do setor, a qual o governo nem mesmo reconhece, não é recente. Os primeiros sinaisforam detecta-dosem2012,quandoosreservató-rios hidrelétricos se esvaziaram rapidamente, mesmo com um volu-medechuvasdentro damédia.

"Às vezes, as coisas dão errado. O que é imperdoável é não aprender com os erros. Jogar a culpa em São Pedro éimperdoável. Essa sensação de que está sempre se atribuindo [o problema] a poderes maiores e não se aprende dá uma frustração muito grande", desabafou Veiga.

 

 

ANA tenta evitar colapso e reduz vazão no Paraíba

 

A Agência Nacional de Águas (ANA) determinou a redução temporária, até o dia 28 deste mês, do limite mínimo de vazão para a barragem de Santa Cecília, no rio Paraíba do Sul, que abastece a região metropolitana do Rio. Devido à seca no Sudeste do país, a vazão cairá de 190 para 140 metros cúbicos por segundo.

Ao fundamentar a decisão, a ANA informou que considera a importância de preservar os estoques de água disponíveis na bacia hidrográfica do Paraíba do Sul.

A medida será acompanhada de avaliações periódicas dos impactos que poderá ocasionar nos diversos usos da água feitos pela própria agência, pelo Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) e pelo governo do Rio.

A agência decidiu prorrogar até o próximo dia 28 a redução da saída de água dos reservatórios de Sobradinho e Xingó, no Rio São Francisco, de 1.300 para 1.100 metros cúbicos por segundo, também em virtude da seca.

Em São Paulo, as principais represas que abastecem a região metropolitana mantiveram seus volumes d"água ontem. Segundo a Sabesp, o nível dos sistemas Cantareira, Alto Tietê, Guarapiranga e Alto Cotia não se alterou.

Já o nível do sistema Rio Claro subiu de 28,8% para 29,2% após receber 17 mm de chuvas.

O sistema Cantareira amanheceu ontemcom 5% de sua capacidade preenchida,já considerada a segunda cota do volume morto- parte do fundo da represa não computada em situações normais. O sistema Cantareira é o maior da Grande São Paulo e abastece 6,2 milhões de pessoas, cerca de 30% daregião metropolitana.

Já o nível do reservatório Alto Tietê, que também sofre as con-sequências da seca, operava ontem com 11% da capacidade. O sistema abastece 4,5 milhões de pessoas na região leste da capital paulista e Grande São Paulo. Ovolume do Alto Tietê também considera o volume morto desde o dia 14 de dezembro.

A represa de Guarapiranga, que fornece água para 5,2 milhões de pessoas naszonas Sul eSudeste da capital paulista, operava com 47,9% de sua capacidade. O nível do reservatório Alto de Cotia estava na manhã de ontem em 28% de sua capacidade. Já o sistema Rio Grande, que atende a 1,5 milhão de pessoas, operava com 75% da capacidade, 0,2 ponto percentual abaixodoregistradono domingo.

O reservatório de Rio Claro,que atende a 1,5 milhão de pessoas, operava com 29,2% da capacidade.

 

Redução no consumo de energia pode levar inflação a superar 8%

 

Uma redução no consumo de energia de 10% em um período de 12 meses pode tirar entre 0,7 e 1,5 ponto percentual do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro. No mesmo intervalo, o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) pode superar 8% e a taxa de desemprego subir a 6,5%. As estimativas são do banco UBS, que prevê crescimento econômico próximo de zero em 2015.

Em relatório distribuído a clientes, a instituição diz que um racionamento colocaria sua previsão para a Selic, hoje em 13%, em viés de alta, e teria potencial para levar o dólar a R$ 2,90. O maior impacto sobre o PIB ocorreria nos dois primeiros trimestres, diz o banco.

Um racionamento de água no Sudeste, contudo, poderia ampliar o efeito da queda compulsória no consumo de energia, lembra o UBS, com potencial maior sobre agricultura, em especial a irrigada, e alguns serviços, como alimentação e hospitais. Do lado da demanda, o investimento tenderia a ser o mais afetado, com uma queda de 11%, enquanto o consumo privado recuaria 1,5%.

 

Aneel decide hoje futuro de três megaprojetos de hidrelétricas no Norte

 

O futuro de três megaprojetos de usina hidrelétrica, em construção na região Norte, será decidido hoje pela diretoria da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel). A depender da posição assumida pelo comando da agência, as concessionárias responsáveis pela construção de Belo Monte, Jirau e Santo Antônio deverão arcar com obrigações contratuais e multas pelo descumprimento do cronograma de obras.

A situação atual destes projetos de geração reúne os principais dilemas enfrentados pelo setor elétrico em seu desafio de ampliar a infraestrutura de abastecimento do país. Desde a assinatura dos contratos, os empreendedores tiveram que administrar atrasos decorrentes da demora na liberação de licenças ambientais, dos quebra­quebras em alojamentos promovidos por movimentos grevistas, das paralisações por ordens judiciais e das ocupações dos canteiros de obra por representantes das populações indígenas.

A deliberação da Aneel não é simples, pois precisa constatar se cada uma das justificativas de atraso realmente impactou o cronograma da forma como os empreendedores argumentam. No entendimento da diretoria, as concessionárias devem, com estratégias de engenharia, contornar ao máximo os possíveis prejuízos ao calendário
definido no contrato.

As usinas Jirau e Santo Antônio, ambas no rio Madeira (RO), também foram afetadas pela dificuldade com entrada em operação da rede de transmissão responsável por escoar a energia. Com o atraso na entrega da linha Porto Velho­Araraquara, as duas hidrelétricas tiveram que adiar a fase de testes das turbinas que iniciavam a
operação.

As consequências decorrentes do descumprimento dos cronogramas das usinas do Madeira colocaram as concessionárias da usina ­ a Energia Sustentável do Brasil e Santo Antônio Energia ­ em pé de guerra com as distribuidoras. Os atrasos na entrega da energia na data contratual fizeram as distribuidoras recorrerem, em proporções ainda maiores, à compra de energia no mercado de curto prazo (spot).

Tanto Jirau como Santo Antônio recorreram à Justiça para suspender as obrigações previstas nos contratos de geração até que a Aneel tomasse a decisão final sobre os atrasos.

Diante da dificuldade financeira, o segmento de distribuição manifestou posição contrária aos pleitos das duas usinas que serão julgados.

No caso de Belo Monte, no rio Xingu (PA), a concessionária ­ Norte Energia ­ tem tentado desde o início do ano passado convencer a Aneel de não ter sido responsável pela postergação do prazo de início da geração, previsto para fevereiro de 2015. Ao longo da tramitação do processo da Norte Energia, as áreas técnicas e jurídicas da
agência já expediram dois pareceres desfavoráveis ao empreendedor da usina.

Na reunião de hoje, a diretoria da Aneel pode tomar outras decisões aguardadas pelo setor. A pauta inclui a primeira rodada de reajustes tarifários anuais, a revisão da atual remuneração das distribuidoras e o orçamento 2015 da Conta de Desenvolvimento Energético (CDE).A primeira leva de reajustes das distribuidoras envolve as concessionárias CPFL Mococa, CPFL Santa Cruz, CPFL Sul Paulista, CPFL Leste Paulista, CPFL Jaguari e Borborema Distribuidora. Com a atualização de tarifas no início do ano, as empresas podem não contar com a revisão extraordinária prevista pela autarquia. Quanto ao orçamento da CDE, a agência previa um déficit de R$ 23 bilhões, que ­ segundo previsões mais atualizadas ­ será um pouco menor.