Caciques do partido ignoram equipe econômica do Planalto e marcam reunião com empresariado para discutir medidas de combate à crise. Governo já estuda um novo pacote de arrocho
 
Enquanto o Planalto prepara um novo pacote para apertar ainda mais o cinto da população ao mesmo tempo em que admite recuar das propostas já encaminhadas ao Congresso, o PMDB quer isolar o governo da discussão sobre as soluções para a crise econômica e negociar medidas diretamente com o empresariado brasileiro. Os presidentes da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), e do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), vão oferecer um almoço, no próximo dia 25, para pesos-pesados do PIB brasileiro, sem a presença de representantes da equipe econômica.
 
 
 
Os caciques peemedebistas vão indagar dos empresários quais medidas e projetos em tramitação no Congresso serão úteis para destravar a economia do país. A ideia é mostrar que o Brasil pode retomar o desenvolvimento sem depender apenas “saco de maldades” elaborado pelo ministro da Fazenda, Joaquim Levy. E, claro, com a ajuda do PMDB, que está na coligação da presidente Dilma Rousseff, mas articula uma postura de independência em relação à chefe do Executivo.

 

 
Os presidentes das duas Casas do Congresso já mostraram, após o encontro com as centrais sindicais na terça-feira, que vão engrossar o caldo de pressões da própria base aliada — incluindo o PT — para que sejam feitas mudanças nas medidas provisórias que promovem alterações nos direitos trabalhistas e previdenciários. “O ajuste fiscal deve acontecer, mas sem prejudicar os direitos dos trabalhadores”, avisou Renan.

 


Agora, é a vez da aproximação com o empresariado. No encontro, estarão representantes da Confederação Nacional da Indústria (CNI), da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) e do Conselho Nacional da Saúde (CNS), além de setores importantes para a economia do país, como o automobilístico, que será representado pela Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea) — área na qual os dois peemedebistas transitam bem, sobretudo Cunha. Um integrante da bancada do PT no Senado admitiu que a legenda está enfraquecida em relação ao principal aliado. Na Câmara, foram alijados da Mesa Diretora. No Senado, ficaram reféns de Renan Calheiros para não perder espaço no colegiado que comanda a Casa. “O quarteto Renan Calheiros, Eduardo Cunha, Eunício Oliveira (líder do PMDB) e Romero Jucá (relator do Orçamento) está dando as cartas políticas neste momento”, lamentou outro petista.

Tesourada

O mercado percebeu a armadilha em que o governo se meteu e está mais reticente ao voto de confiança dado ao ministro da Fazenda anteriormente. Já há um temor concreto de que a economia prevista pelas medidas provisórias 664 e 665 caia dos R$ 18 bilhões estimados para R$ 12 bilhões. O ministro Joaquim Levy já se prepara para compensar essa perda.

O contribuinte pode se preparar para um segundo pacote de arrocho, que seria, no mínimo, do mesmo tamanho do primeiro, anunciado em janeiro, de R$ 20,6 bilhões. Mas, considerando o rombo nas contas públicas de 2014 e as primeiras medidas tomadas pela área fiscal, a novidade não deve ser suficiente para Levy cumprir a meta de superavit primário (economia para o pagamento dos juros da dívida pública) de 1,2% do Produto Interno Bruto (PIB), ou R$ 66,3 bilhões.
 
“As medidas que vinham sendo tomadas eram corretas e na direção certa para o reequilíbrio fiscal. Mas o enfraquecimento político do governo pode colocar em risco a viabilidade da retomada da credibilidade”, alertou Gabriel Leal de Barros, pesquisador de economia aplicada do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre/FGV).

“Esse pacote de R$ 18 bilhões nunca seria concretizado, mas era importante para o médio prazo”, avisou o especialista em contas públicas Mansueto Almeida. O ministro do Trabalho, Manoel Dias, disse ontem que aguarda as contrapropostas das centrais sindicais para que as negociações avancem. Há uma discussão interna do Executivo. Não existem pontos detectados como possíveis de serem alterados. A decisão final sobre o assunto caberá a deputados e senadores”, comentou.

» Colaboraram Antonio Temóteo e Julia Chaib



Calculadora na mão
 
 
 
» A nova equipe econômica de Dilma Rousseff, liderada pelo ministro da Fazenda, Joaquim Levy (foto), promete fazer uma economia de 1,2% do Produto Interno Bruto (PIB) — o que corresponde a R$ 66,3 bilhões — para o pagamento dos juros da divida pública neste ano
 
» Para atingir essa economia, contudo, falta cobrir os 
R$ 32,5 bilhões de rombo fiscal de 2014

» Logo, a meta fiscal será o equivalente a 
R$ 98,8 bilhões, ou 1,8% do PIB
 
» Com as medidas de aumento dos impostos da gasolina, dos importados, dos cosméticos e do crédito para pessoas físicas, o governo pretende aumentar a receita em 
R$ 20,6 bilhões
 
» A manutenção do percentual de 4,5% na tabela de correção do IRPF deverá ampliar em R$ 2 bilhões a receita neste ano, pelos cálculos da Federação Brasileira de Associações de Fiscais de Tributos Estaduais (Febrafite)
 
» A alteração nas regras de acesso a benefícios, como seguro-desemprego, abono salarial, pensão por morte e seguro defeso (para a pesca artesanal), devem, pelos cálculos do governo, implicar economia de R$ 18 bilhões
 
» Mas, devido à resistência do governo, essa economia com as distorções podem implicar, no máximo, 
R$ 12 bilhões, pelas contas de especialistas
 
» Logo, considerando esses R$ 12 bilhões com os R$ 22,6 bilhões de receita adicional garantida com impostos, e uns R$ 4 bilhões a mais advindos do impacto real do Orçamento Impositivo, o governo ainda precisaria de R$ 67,4 bilhões para cumprir a meta
 
» Isso representa mais do que todo o investimento previsto no PAC para este ano: R$ 65 bilhões
 
Mais pressão na Câmara
 
Picciani: "A tratativa com o Executivo dependerá da vontade da bancada"
 
O PMDB da Câmara elegeu ontem o deputado Leonardo Picciani (RJ) como líder do PMDB na Casa. Por apenas um voto de diferença, ele superou Lúcio Vieira Lima (BA), sendo escolhido por 34 colegas. Todos os deputados da bancada do partido votaram, menos o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (RJ), que se absteve.
 
 
Picciani apoiou o senador Aécio Neves (PSDB-MG) na corrida pelo Planalto no ano passado, mas assegurou que a escolha na disputa para a
 
 
Presidência da República não influenciará na forma como ele conduzirá a bancada do partido. “Nós fazemos parte da base do governo, temos em Michel Temer nossa presença na Vice-Presidência. Vamos debater com governo e oposição, mas a tratativa com o Executivo dependerá da vontade da bancada”, afirmou.
 
 
De acordo com Picciani, as prioridades de sua liderança serão a reforma política e a CPI da Petrobras. “Queremos que a CPI cumpra o papel de investigar todos os casos de corrupção na Petrobras, mesmo que haja membros do PMDB nos processos”, disse.

No Senado, o PMDB indicou o senador João Alberto Souza (MA) para mais um mandato como presidente do Conselho de Ética do Senado. Aliado do presidente da Casa, Renan Calheiros (PMDB-AL), ele assumirá o cargo pela quinta vez. Em uma das passagens, em 2010, arquivou processos contra o ex-senador José Sarney (PMDB-AP) em meio ao escândalo dos atos secretos. A eleição para o cargo, que tradicionalmente fica com a maior bancada do Senado (o PMDB é a atual), deve ocorrer depois do carnaval.