Um clima de constrangimento contaminou o início do jantar oferecido pela presidente Dilma Rousseff à cúpula do PMDB ontem à noite, no Palácio da Alvorada, em meio ao esforço para refazer os laços com o principal aliado. Horas antes da reunião, o presidente do Congresso, Renan Calheiros (PMDB-AL), cancelou a participação no evento, surpreendendo o governo e evidenciando o desconforto de lideranças da legenda com o Palácio do Planalto. A data também foi considerada inoportuna: véspera da divulgação da lista formal de investigados pela Procuradoria-Geral da República na Operação Lava-Jato, que apura os desvios na Petrobras.

Há receio de que pemedebistas constem da relação, o que envolve a negociação de cargos no segundo escalão do governo. Dilma só vai autorizar novas nomeações depois da divulgação da lista. Em vazamentos já divulgados pela imprensa, mas não confirmados pelo Ministério Público Federal, foram citados os nomes de Renan Calheiros e do ex-presidente da Câmara Henrique Alves (PMDB-RN). Alves é cotado para assumir o Ministério do Turismo, caso seu nome não apareça na relação oficial do procurador-geral da República, Rodrigo Janot.

Além disso, no esforço de articulação política deflagrado pelo Palácio do Planalto na semana passada, houve acenos de que o PMDB poderia ser contemplado com mais um ministério, a depender da divulgação da "lista de Janot". Na rodada de conversas entre lideranças da sigla com ministros, e até com o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, cogitou-se a possibilidade de que o Ministério da Integração Nacional, atualmente na cota do PP, seja confiado ao PMDB. Nomes do PP também devem constar da relação de Janot.

Antes de se deslocar para o jantar, o vice-presidente Michel Temer admitiu aos jornalistas o ambiente de apreensão: "É bom que venha logo [a lista oficial], que seja objeto de inquérito, para acabar, ainda que pela metade, esse assunto, porque aí as coisas estarão definidas", afirmou.

"O jantar [com Dilma] vai ser um momento oportuno para estabelecer relações muito sólidas entre o PMDB e o governo", completou. Na véspera, Dilma discutiu a relação com o partido com o governador do Rio de Janeiro, Luiz Fernando Pezão, e o prefeito da capital fluminense, Eduardo Paes. A presidente conta com ambos para ajustar os laços com o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), esperado no jantar.

Já a versão oficial do presidente do Congresso para sua ausência - a de que deve colocar a "instituição acima da condição partidária" - não convenceu o Planalto. Na última semana, Renan participou de uma rodada de reuniões para discutir a relação com o governo. Foi ao jantar no Palácio do Jaburu com os ministros da Fazenda, Joaquim Levy, e da Casa Civil, Aloizio Mercadante. E abriu a residência oficial para um encontro dos senadores do PMDB com o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Após a reunião com Lula, Renan disse que todos concordaram que Michel Temer deveria ser mais ouvido no governo.

Valor apurou, ainda, que Renan disse a interlocutores que cogitava não comparecer ao jantar porque estava pagando um preço alto "aparecendo como governista" e defendendo o governo, sem enxergar contrapartida. Renan tem reclamado abertamente que a coalizão governista é "capenga" e que o PMDB só é lembrado na hora de socorrer o governo, mas que não participa das decisões.