BRASÍLIA

O instrutor de voo Marco Archer Cardoso Moreira, de 53 anos, foi executado na Indonésia às 15h31m de ontem - pelo horário de Brasília - depois de o presidente do país, Joko Widodo, rejeitar o pedido de clemência feito pela presidente Dilma Rousseff no dia anterior. Com o fuzilamento do brasileiro condenado por tráfico de drogas, o primeiro a cumprir pena de morte em território estrangeiro, o governo Dilma já começou a estudar retaliações concretas à Indonésia. A presidente convocou o embaixador do Brasil no país asiático, Paulo Alberto da Silveira Soares, para consultas em Brasília. No fim da tarde, o Itamaraty convocou o embaixador da Indonésia.

O Palácio do Planalto divulgou uma nota de Dilma nos minutos seguintes à execução, em que a presidente se disse "consternada e indignada" com o fuzilamento do brasileiro. Na nota, Dilma afirma que "o recurso à pena de morte, que a sociedade mundial crescentemente condena, afeta gravemente as relações entre nossos países". Às 17 horas, o Itamaraty entregou ao embaixador da Indonésia no Brasil, Toto Riyanto, uma nota de repúdio pela execução do brasileiro e por terem sido ignorados os pedidos de clemência e os apelos feitos pelo governo brasileiro. O secretário-geral do Itamaraty, Sérgio Danese, foi quem entregou a carta ao representante indonésio. Danese disse que Riyanto não fez qualquer comentário sobre o assunto, tendo apenas recebido o comunicado e se retirado.

"O Ministério, em nome do governo brasileiro, manifesta à embaixada a sua profunda inconformidade com a execução do cidadão brasileiro e com o fato de que gestões do mais alto nível e apelos presidenciais à clemência em favor do condenado tenham sido ignorados pelas autoridades indonésias", diz trecho da nota.

"Cria uma animosidade", diz chanceler

O ministro das Relações Exteriores, Mauro Vieira, disse que informou pessoalmente a presidente Dilma a confirmação da execução de Archer. Vieira afirmou que a medida adotada pela Indonésia cria uma animosidade na relação entre os dois países.

- Cria uma sombra de dúvida, cria uma animosidade, uma dificuldade na relação bilateral. O Brasil tem princípios que lhe são caros - afirmou, sem esclarecer que outras medidas o governo brasileiro pode adotar.

Ontem, a ministra da Secretaria de Direitos Humanos, Ideli Salvatti, deixou claro que o governo brasileiro já discute retaliações ao governo indonésio. Segundo ela, a retaliação já havia sido expressa de forma indireta por Dilma a Widodo, no telefonema da sexta-feira. Ideli acompanhou a ligação em que a presidente pediu por clemência. A ministra disse que Dilma aguardava apenas o retorno do ministro Mauro Vieira, que estava nos Estados Unidos, para detalhar as medidas da retaliação.

- A presidente fez apelo como mãe e já deu a entender na conversa que as relações entre os dois países não ficarão iguais com esse episódio - disse Ideli.

A convocação do embaixador brasileiro, no entanto, já significa um movimento diplomático do governo de descontentamento. Na nota do Planalto, foi reiterada o conhecimento da gravidade do crime cometido por Archer, de tráfico de drogas, mas a presidente afirmou que a decisão da Indonésia afeta as relações entre os dois países.

Ideli, por sua vez, considerou "política" a execução do instrutor de voo:

- Ele estava condenado à morte esse tempo todo, mas o presidente anterior da Indonésia deixou isso quieto. A decisão da execução (na gestão do atual presidente), de não acatar o pedido de clemência, foi também uma decisão política. Essa questão (do rigoroso combate ao tráfico de drogas) foi levada para a campanha dele. O brasileiro já estava condenado há muito tempo.

A ministra disse ser "inadmissível" a existência de pena de morte em determinados países:

- É absurda por não permitir nenhuma possibilidade de arrependimento e reintegração. A presidente deixou claro no telefonema que o Brasil não tem pena de morte e que isso era incompreensível aos brasileiros. Ela fez apelo como mãe e deu a entender na conversa que as relações entre os dois países não ficarão iguais depois desse episódio.

Ideli revelou que o outro brasileiro na fila das execuções na Indonésia por tráfico de drogas, Rodrigo Goulart, vem apresentando um "quadro psíquico muito grave" e, em razão disso, a Embaixada do Brasil na Indonésia tenta uma internação a ele, em vez da execução. Para isso, também haveria a necessidade de clemência por parte do presidente da Indonésia. As chances são remotas, segundo a ministra.

- As informações que chegaram até nós é de que o outro brasileiro está totalmente transtornado. Mas as possibilidades de clemência também são extremamente remotas - disse Ideli.

Além do brasileiro, foram executados na ilha de Nusakambangan, Ang Kiem Soe, um cidadão holandês; Namaona Denis, um residente do Malawi; Daniel Enemuo, nigeriano, e uma cidadã indonésia, Rani Andriani. Outra vietnamita, Tran Thi Bich Hanh, foi executada em Boyolali, na Ilha de Java.