O governo da primeira presidente do país tem pouco a celebrar. Das ações prometidas contra a violência de gênero, só o transporte para vítimas de agressão foi providenciado. -BRASÍLIA- Promessas não cumpridas e lentidão marcam a gestão da primeira presidente mulher do Brasil nas ações de combate à violência de gênero. O programa Casas da Mulher Brasileira, lançado por Dilma Rousseff ainda no primeiro mandato, previa 27 unidades, mas a primeira somente foi inaugurada este ano em Campo Grande ( MS). A coleta de vestígios de crimes sexuais no SUS e o encaminhamento direto das denúncias recebidas pelo serviço Ligue 180 para polícias militares e para o Samu são outros pontos emperrados do plano Mulher, Viver sem Violência. O balanço do programa traz poucos avanços a serem comemorados neste Dia Internacional da Mulher.

O único item do Mulher, Viver sem Violência já cumprido integralmente é a entrega de 54 ônibus — dois por unidade da Federação — para atender vítimas de agressões em áreas distantes. A construção de centros de atendimento nas fronteiras está pela metade: dos sete previstos, faltam três. Na última sexta- feira, a Secretaria de Políticas para as Mulheres ( SPM) anunciou que o Ligue 180 funcionará em mais 13 países, entre eles Noruega e Paraguai, para atender brasileiras no exterior. A expansão do serviço havia sido prometida no lançamento do programa, há três anos. Procurada, a SPM não comentou a execução do programa de governo.

Para Clair Castilhos, secretária-executiva da Rede Nacional Feminista de Saúde, Direitos Sexuais e Reprodutivos, as políticas do governo federal são “úteis e interessantes”, mas esbarram na dificuldade de articulação com estados e municípios, prejudicando projetos como a Casa da Mulher Brasileira — que reúne, num mesmo espaço, diversos serviços.

— Não adianta o estado doar o terreno, mesmo que o governo federal construa e até custeie parte das despesas da Casa da Mulher Brasileira, se não houver profissionais nesses espaços. E esses profissionais precisam ser disponibilizados pelo estado ou pelo município, mas há uma dificuldade enorme nisso — afirma Clair.

 

Em um mês, 582 vítimas atendidas em Campo Grande

 

No primeiro mês de funcionamento da única Casa da Mulher Brasileira no país, inaugurada em 3 de fevereiro em Campo Grande, no Mato Grosso do Sul, 582 vítimas de violência foram atendidas. Exceto a delegacia e o setor psicossocial, que funcionam 24 horas todos os dias no local, os demais serviços de assistência disponíveis — como a Defensoria e o Ministério Público — são prestados em horário comercial. A unidade vem funcionando sem a presença de um juiz. Um magistrado começará a atuar no centro a partir desta semana, afirma Eloisa Castro Berro, coordenadora do local.

Na avaliação da subprocuradora-geral da República Ela Wiecko, que tem atuação destacada nas questões de gênero, a ideia de reunir os serviços em um único lugar é bem-vinda. Ela ressalta, entretanto, que “a implementação deixa muito a desejar” por razões “compreensíveis” que vêm da dificuldade de articular órgãos que são de Poderes diferentes. A segunda Casa da Mulher Brasileira tem inauguração prevista para abril e será em Brasília.

Um dos pontos-chave do programa federal, na opinião de quem acompanha o tema da violência, é garantir que vítimas de crimes sexuais sejam atendidas em ambientes humanizados e possam ter os vestígios — como sêmen ou saliva — colhidos ainda na rede de saúde, evitando que a prova se perca. Essa prática, entretanto, não foi implantada no SUS. Dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública apontam 50.320 registros de estupros no Brasil em 2013, base de dados mais recente.