BRASÍLIA

Pressionada pelo Congresso, a presidente Dilma Rousseff declarou ontem que está comprometida com um reajuste de 4,5% na tabela do Imposto de Renda (IR) em 2015. Depois de vetar a correção de 6,5% aprovada pelos parlamentares, a presidente não havia dado qualquer sinal concreto de como conduziria o assunto, correndo o risco de ter o veto derrubado já na semana que vem pelos congressistas. Por isso, Dilma resolveu vir a público explicar as razões de ter rejeitado uma correção mais alta. O reajuste de 4,5% fica abaixo da inflação de 2014, que foi de 6,41%. Então, na prática, os brasileiros vão pagar mais imposto este ano.

- Eu tenho um compromisso, eu vou cumprir meu compromisso: é 4,5%. Eu sinto muito (se o Congresso fizer diferente), porque nós não estamos vetando porque queremos, nós estamos vetando porque não cabe no Orçamento - afirmou Dilma, acrescentando em seguida: - Se por algum motivo não quiserem os 4,5%, nós vamos ter que abrir um processo de discussão novamente. O governo tem condições perfeitamente de agora olhar os 4,5%. É isso que nós faremos.

Pelas contas do governo, a correção de 4,5% representa uma renúncia fiscal de R$ 5 bilhões. Já com um reajuste de 6,5% o impacto nos cofres públicos passaria a ser R$ 7 bilhões.

Em maio do ano passado, o governo editou uma medida provisória (MP) fixando o reajuste em 4,5%, a partir de janeiro de 2015. Mas, com o recesso branco durante a campanha eleitoral, a MP não foi votada e perdeu a validade em agosto. O Congresso, então, incluiu a correção em outra medida, após as eleições, com apoio da oposição, e elevou o percentual para 6,5%.

'nunca deixamos de esconder'

Num ato falho, durante a entrevista a presidente acrescentou:

- Nunca deixamos de esconder que era 4,5%. Eu já mandei por duas vezes (a MP). Vou chegar à terceira vez.

Semana passada, o presidente da Câmara, deputado, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), sinalizou que o veto seria votado no dia 24. E mandou um recado a Dilma: caso o governo não garantisse ao menos uma correção de 4,5%, o Congresso derrubaria o veto.

A presidente também disse ontem que o pacote que restringe o acesso a benefícios trabalhistas não é uma flexibilização dos direitos dos trabalhadores, mas um aperfeiçoamento da lei.

- Flexibilização da lei trabalhista é acabar com o décimo terceiro, com férias, com aviso prévio. Nós estamos aperfeiçoando a legislação. Porque a legislação tem que ser aperfeiçoada, da mesma forma que nós fizemos com o Bolsa Família - disse, após receber embaixadores estrangeiros no Palácio do Planalto.

- Acho que sempre há negociação. Ninguém acha que um país democrático como o Brasil, que tem um Congresso livre, que tem movimentos sociais sendo ouvidos, com os quais você dialoga, seja algo fechado, que não há negociação. Sempre há negociação. Mas há posições claras.

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Joaquim Levy vai discutir ajuste fiscal com PMDB     

BRASÍLIA

O ministro da Fazenda, Joaquim Levy, foi convidado pelo vice-presidente Michel Temer para jantar segunda-feira no Palácio do Jaburu e discutir com as cúpulas do PMDB e do Congresso as medidas de ajuste fiscal. Além de Levy, estarão no encontro os seis ministros do partido; os presidentes do Senado, Renan Calheiros, e da Câmara, Eduardo Cunha; e os líderes do PMDB na Câmara, Leonardo Picciani, e no Senado, Eunício Oliveira. Nenhum ministro da articulação política foi convidado.

O PMDB quer discutir a possibilidade de flexibilizar as medidas de restrição à concessão de benefícios como o seguro-desemprego. A intenção de Temer é se posicionar favoravelmente ao ajuste fiscal - mas com alguns acertos.

- Vamos ter uma conversa franca e sem censura, sem a pressão da mídia e da oposição. Estamos cientes de que é momento de fazer sacrifícios pela manutenção de programas sociais - disse um peemedebista.

Apesar da relação ruim entre o PMDB e o núcleo político do governo, a sinalização interna é que o partido, o maior em número de votos no Senado e o segundo maior da Câmara, apoiará as medidas da equipe econômica, desde que possa modificar alguns pontos.

No jantar, também será discutido o veto à correção de 6,5% da tabela do Imposto de Renda. O PMDB não deve se opor à manutenção do veto presidencial e ajudará na aprovação de projeto intermediário, que garante 4,5% de correção, como defendeu ontem a presidente Dilma Rousseff.

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Risco de racionamento pode forçar mais cortes   

BRASÍLIA

O racionamento de água e energia, inevitável para especialistas, é considerado por integrantes da equipe econômica a principal ameaça ao cumprimento da meta fiscal prometida para 2015, equivalente a 1,2% do Produto Interno Bruto (PIB, conjunto de bens e serviços produzidos no país). Há receio de que o racionamento, principalmente em Minas, Rio e São Paulo, prejudique a indústria e gere uma retração de até 2% da economia, com queda acentuada nas receitas. Além disso, será preciso fazer despesas extras com ações emergenciais para não deixar a população na mão em caso de restrição ao consumo de água (carros-pipas, adutoras).

- Se houver racionamento, a meta será prejudicada sem dúvida - disse um integrante da equipe econômica.

Mas, para técnicos da área econômica, como se trata de um fator externo (que não depende da vontade do governo e sem relação com a contabilidade criativa adotada nos anos anteriores), a tendência é que o mercado aceite um resultado menor. No esforço para atingir a meta, o governo trabalha nos cortes do Orçamento, que, segundo uma fonte, será um dos maiores dos últimos anos. O número ainda não está fechado, mas os técnicos já sabem que a tesourada terá que incluir tanto programas sociais quanto investimentos.

As discussões preliminares apontam para a necessidade de um corte de até R$ 70 bilhões, atingindo as emendas parlamentares na mesma proporção dos demais cortes (com o orçamento impositivo, as emendas não podem ser discriminadas e contingenciadas totalmente). Entretanto, dentro e fora do governo, a avaliação é que um corte dessa magnitude seria praticamente inviável. Seria preciso zerar os investimentos, pois a margem do lado do custeio, o que inclui programas sociais e pessoal, é limitada. De acordo com dados do Tesouro Nacional, em 2014 o total de investimentos da União ficou em R$ 77,5 bilhões (valores pagos). Na proposta orçamentária enviada ao Congresso neste ano, estão previstos R$ 77,6 bilhões.

PRONATEC E FIES NA MIRA

Além das medidas para reduzir as despesas com seguro-desemprego, abono salarial (PIS) e pensões por morte em R$ 18 bilhões e aumento de imposto (Cide, sobre combustíveis), os técnicos buscam alternativas para ampliar o esforço fiscal. Ajustes no PIS/Cofins e na desoneração da folha estão no radar da Receita Federal para elevar a receita.

Do lado das despesas, o corte pode atingir programas sociais, como Fies, Pronatec e o Bolsa Família. Haveria restrições à entrada de novos beneficiários, além da suspensão de reajustes. As mudanças já começaram, como é o caso do Fies, que passou a exigir nota mínima dos alunos inscritos. Investimentos em novas escolas técnicas e universidade deverão ser adiados. No programa Minha Casa Minha Vida, a ideia é reduzir um pouco o ritmo dos desembolsos e aguardar a entrega das unidades contratadas. Contratações de servidores públicos serão postergadas e reajuste salarial, somente os que foram acordados anteriormente.

Para fechar o valor do contingenciamento, o governo aguarda as votações do Orçamento para este ano e também das medidas provisórias que restringem os direitos trabalhistas.

- A previsão de cortes com as MPs é de R$ 18 bilhões, mas dependendo das negociações, este valor pode cair, então, não há como ter ainda certeza sobre o tamanho do contingenciamento - disse um ministro.

Integrantes do governo lembram que desde janeiro o contingenciamento já vem ocorrendo. Os orçamentos dos ministérios são liberados normalmente na proporção 1/12 ao mês e, há dois meses, a liberação é de 1/18. E a tendência para os próximos meses é piorar.