O telefone do vice-presidente da República, Michel Temer, tocou cedo ontem pela manhã. Era o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), com um aviso: Vou subir o tom. A petição é uma piada!, disse ele. Temer conhece o aliado. Sabe que ele não está brincando ao prometer subir o tom. Mais tarde, ao Correio, Cunha foi mais incisivo: Vou baixar o cacete. Até aqui, eu era apenas independente. Agora, serei independente babando de ódio do lado, afirmou.

Eduardo Cunha está convicto de que só será investigado para justificar a abertura de inquérito contra o senador tucano Antonio Anastasia (MG). É que os dois foram colocados no balaio da Lava-Jato pelo mesmo delator, o policial Jayme Alves de Oliveira Filho, que disse ter entregue dinheiro numa casa no Rio de Janeiro e que esse dinheiro seria destinado a Eduardo Cunha e, no caso de Anastasia, a alguém que ele julga ser o senador mineiro. A defesa de Youssef negou que ambos tivessem recebido dinheiro. Não tenho dúvidas de que o governo está por trás disso. O procurador escolheu contra quem abriria inquérito, avaliou o presidente da Câmara, apresentando de forma mais coloquial o que havia escrito na nota oficial divulgada ontem no início da manhã.

 O procurador-geral da República agiu como aparelho, visando à imputação política de indícios como se todos fossem partícipes da mesma lama. É lamentável ver o procurador, talvez para merecer a sua recondução, se prestar a esse papel. E criminalizar a minha doação oficial de campanha sem criminalizar a dos outros é um acinte à inteligência de quem quer que seja. Sabemos exatamente o jogo político que aconteceu e não dá para ficar calado sem denunciar a politização e aparelhamento da PGR, escreveu para, na conversa com o Correio, citar: Por que não colocou a Dilma, o Aécio, todo mundo que recebeu dinheiro de empreiteiras?.

Pauta-bomba
Instrumentos para Cunha cumprir o que diz não faltam. Como presidente da Câmara, ele tem o poder de elaborar a pauta da Casa e também de apressar ou retardar a condução dos trabalhos em plenário. Até aqui, o governo vinha se segurando com a camaradagem da Presidência da Casa, que evitava levar a votos a pauta-bomba. Agora, essa camaradagem acabou. A Câmara vai funcionar normalmente. O que estiver em pauta, irá a votação. Sempre divulgo a pauta com uma semana de antecedência, diz ele, antecipando desde já que não quer conversa com o governo, e sim uma relação institucional.

 Cunha tem também alguma ascendência sobre a CPI da Petrobras, onde esteve na última quinta-feira, e se colocou à disposição para depor. Foi dele a ideia de fazer do deputado Hugo Motta (PMDB-PB) o presidente da CPI. Agora, ele promete voltar: Vou lá, detalhar vírgula a vírgula dessa indecente petição do procurador-geral da República, que, certamente, vai envergonhar muitos daquela respeitosa instituição.

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Cardozo nega interferência

O governo não esperou passar o fim de semana para tentar tirar a presidente Dilma Rousseff e a equipe dela do foco do petrolão nessa fase pós-divulgação da lista de políticos alvos de inquéritos na Lava-Jato. Ontem, menos de 24 horas depois de conhecidos os investigados, o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, convocou uma entrevista na sede da Presidência da República em São Paulo para responder às acusações de que o governo teria influenciado na definição dos políticos citados. Ao mesmo tempo, tratou de tirar de cena a versão de que a presidente não será investigada apenas porque o artigo 86 da Constituição diz que um presidente, na vigência de seu mandato, não pode responder por fatos estranhos ao exercício de suas funções.

Tenho visto uma grande confusão na imprensa. É equivocada a leitura de que a presidente Dilma não foi investigada em decorrência do artigo 86. O texto é claro: ela não foi investigada, primeiro, porque não há fatos nem indícios que pudessem envolvê-la em nada nessa história. Não há nada a arquivar, disse o ministro.

Ele mencionou ainda o fato de o procurador ter citado o ex-ministro Antonio Palocci e possíveis doações da campanha de 2010. Que indício envolve a presidente Dilma Rousseff nisso? O senhor Paulo Roberto Costa diz que o senhor (Alberto) Youssef, a mando de alguém, que ele diz ser o senhor Palocci, teria pedido R$ 2 milhões para a campanha e que ele autorizou. Youssef nega. Qual é o fato? Não sabemos nem quem falou propriamente com o senhor Youssef, que nega que tenha falado.

O ministro foi ainda incisivo ao dizer que não houve interferência do governo no processo: Jamais o governo interveio, influenciou ou fez gestões para que delações premiadas seguissem numa linha ou em outra, disse ele, aproveitando para alfinetar governos anteriores. Se no passado havia interferência por se buscar pessoas que guardavam algumas situações de comprometimento com a atuação do poder Executivo, hoje não mais ocorre.