Um dia depois do primeiro pronunciamento do segundo mandato em rede nacional de rádio e televisão e de ter a sua fala abafada, em diversas capitais brasileiras, por panelaços, buzinas e gritos defendendo o afastamento do cargo, a presidente Dilma Rousseff afirmou que as pessoas têm o direito de se manifestar, mas o debate sobre o impeachment e um terceiro turno das eleições pode provocar a “ruptura democrática”. Os oposicionistas, que consideram as reações de domingo à noite como um aperitivo das manifestações marcadas para o próximo domingo, refutaram a tese presidencial. “As manifestações que ocorrem nas redes sociais, nos panelaços e nas ruas não defendem um terceiro turno. O PT não é uma instância suprema que pode decidir quais opiniões são legítimas e quais não são”, rebateu o presidente nacional do PSDB, senador Aécio Neves (MG).

A segunda-feira conflituosa apenas exacerbou o beco em que o governo se meteu e do qual está com dificuldades de sair. Seguindo a orientação estratégica dada pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, Dilma fez questão de fr isar que foi ela q u e m ven c e u a s ele ições de outubro, não a oposição. “No Brasil, a gente tem que aceitar a regra do jogo democrático. A eleição acabou, houve primeiro e segundo turno. Terceiro turno das eleições para qualquer cidadão brasileiro não pode ocorrer, a não ser que se queira uma ruptura democrática”, argumentou.

Durante ato em defesa da Petrobras, há duas semanas, Lula afirmou que a presidente deveria andar de cabeça erguida pelo Brasil e lembrar que foi o PT que venceu as eleições do ano passado, não o PSDBDilma deve almoçar hoje com seu mentor político em São Paulo. Existe ainda a possibilidade de os dois se encontrarem em Brasília. “Nós ainda não combinamos. O presidente Lula é uma liderança (cuja) presença sempre contribui, porque ele tem noção de estabilidade e tem compromisso com o país”, disse a presidente.

Avaliação

Os aliados torcem para que a estabilidade chegue o mais rápido possível. “Dilma não está conseguindo encaminhar a agenda de governo. O segundo mandato não começou”, reconheceu um governista. A questão teria deixado de ser apenas política e econômica. O avanço das investigações da Operação Lava-Jato e a divulgação da lista dos parlamentares investigados pelo Supremo Tribunal Federal validaram, segundo aliados do Planalto, um ódio que já existia contra o PT e o governo.

A presidente minimizou ontem as vaias durante o pronunciamento. “Os que são a favor do ‘quanto pior, melhor’ não têm compromisso com o país. O Brasil não está vivendo hoje um momento do passado, em que ele quebrava. Ele esta passando por um ajuste, é um ajuste momentâneo em direção à retomada do crescimento econômico”, justificou a presidente. “O PT continua tentando tapar o sol com a peneira ao tentar responsabilizar a oposição pelas repetidas, e cada vez mais frequentes, manifestações críticas ao governo. Fazer uma mea-culpa, admitindo os graves erros cometidos do ponto de vista gerencial e ético, talvez seja um bom recomeço para se tentar resgatar, pelo menos em parte, a confiança perdida”, disse Aécio. “O panelaço é uma forma das pessoas se manifestarem. Quando estava na oposição, o PT fazia protestos muito mais incisivos”, lembra o líder do PSDB no Senado, Cássio Cunha Lima (PB).

Para o líder do governo na Câmara, José Guimarães (PT-CE), o governo não pode esperar que a oposição aplauda a iniciativa. “Quem deve defender as medidas é o PT. Até porque não é uma defesa apenas da presidente ou do ajuste, mas do nosso projeto”, completou Guimarães. Dilma jantou ontem com lideranças petistas no Palácio da Alvorada para costurar apoio às medidas.

A rejeição ocorre no momento em que ela resolveu colocar em prática sua agenda positiva. A presidente tem aproveitado as cerimônias de que tem participado para falar com jornalistas e ampliou o rol de viagens. Ela vai hoje para São Paulo; amanhã para o Acre, sobrevoar as áreas atingidas pelas enchentes; e deve ir ainda ao Rio de Janeiro nesta semana.