Quase um mês depois da maior manifestação desde a redemocratização do país, cerca de 700 mil pessoas em 25 estados e no Distrito Federal foram às ruas ontem para voltar a protestar contra a presidente Dilma Rousseff e o Partido dos Trabalhadores, de acordo com estatísticas da Polícia Militar. Vestidos de verde e amarelo e segurando faixas com pedidos de impeachment da petista, os manifestantes reclamaram das denúncias de corrupção. Os atos, que reuniram menos pessoas do que em 15 de março, ocorreram de forma pacífica.

O movimento em todo o país foi organizado pelas redes sociais. A maior concentração ocorreu em São Paulo, onde 275 mil pessoas participaram do ato na avenida Paulista, segundo a PM. Considerado o maior grupo convocador, a organização virtual Movimento Brasil Livre (MBL) comandou a caminhada na capital paulista. O grupo puxou vaias e “Fora PT”, mas também reclamou do PSDB, por não defender abertamente o impeachment de Dilma. O juiz Sérgio Moro, responsável pela Operação Lava-Jato na Justiça Federal, foi lembrado como herói.

“Juiz Sérgio Moro, só o senhor e a sua equipe podem nos tirar desta lama podre implantada pelos corruptos pelo PT”, registrou um dos cartazes. Os manifestantes levaram ratos de brinquedo e colocaram em cima de uma bandeira do Brasil. Um grupo que pedia a intervenção militar foi retirado da Paulista pela PM, com a justificativa de que usava um carro que não havia passado por vistoria. Extraoficialmente, policiais disseram que queriam impedir conflito entre o grupo e manifestantes contrários ao golpe militar. Em 15 de março, a PM estimou que havia 1 milhão de pessoas na Paulista.

No Rio de Janeiro, cerca de 10 mil pessoas participaram do movimento, de acordo com a Polícia Militar. Os manifestantes caminharam pela orla de Copacabana. O ato foi pacífico, com três princípios de tumulto, em que defensores da presidente Dilma foram agredidos verbalmente. Essas pessoas foram retiradas do local pela PM. Em um trio elétrico, organizadores pediram aplausos para Sérgio Moro e procuradores que investigam o escândalo da Petrobras. Em coro, os manifestantes cantaram várias vezes o Hino nacional. Ambulantes aproveitaram para vender bandeiras do Brasil. No mês passado, a PM disse que havia 15 mil pessoas no ato.

A segunda rodada de manifestações contra a presidente Dilma em Belo Horizonte levou 5 mil pessoas à Praça da Liberdade. Elas levantaram bandeiras, cantaram o Hino nacional e gritaram “Fora PT”. O protesto ocorreu em clima pacífico e reuniu várias gerações. Além de “demitir os corruptos do PT”, quem foi ao protesto pediu auditoria nos bancos do Brasil, do BNDES, da Caixa Econômica Federal e até da urna eletrônica. Um grupo se organizou para colher assinaturas em defesa de um projeto de lei de iniciativa popular que transforma a corrupção em crime inafiançável. Em 15 de março, eram 20 mil pessoas nas ruas de BH, de acordo com a polícia.

No Recife, a PM não estimou o número de participantes. Dois trios elétricos e um carro de som acompanharam o ato, que começou em Boa Viagem. Os manifestantes disseram que a resposta do governo Dilma às manifestações de 15 de março, quando 8 mil foram às ruas na capital pernambucana, de acordo com a PM, não foi satisfatória. Outros grupos menores defendiam a intervenção militar. 

Marco na história

Para o cientista político Paulo Baía, professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro, a redução no número de pessoas se deve mais a um erro tático dos organizadores do que a uma queda da insatisfação da presidente Dilma. “As manifestações de 15 de março foram um marco na história política do país. O impacto foi grande. Representou uma novidade. Impôs uma pauta política ao governo: enfrentar a corrupção e a crise de representatividade”, disse. “O erro tático foi marcar um novo ato tão cedo, em um momento que o governo ainda está sob o impacto da primeira.”

Baía diz que o erro impôs uma derrota ao movimento. “Embora tenha havido muita gente nas ruas, na comparação com 15 de março, fica o peso de uma derrota política”, diz o cientista político. A consequência da estratégia será uma reação diferente do governo, segundo Baía. “No mês passado, o governo foi obrigado a reagir. Dessa vez, vai usar um discurso de naturalização do movimento, dizer que é normal na democracia e que é importante dialogar”, diz Baía.

No mês passado, o governo convocou coletiva de imprensa de ministros no dia do protesto e anunciou medidas, como um pacote anticorrupção. Ontem, não houve entrevista coletiva. Apenas o vice-presidente Michel Temer comentou rapidamente as manifestações no velório do ex-ministro Paulo Brossard (leia mais na página 5). “Temos que estar muito atentos a essas manifestações. O governo está prestando atenção a essas manifestações”, disse Temer. “O fato de ter menos gente nas ruas não diminui a importância do alerta que está sendo dado.”

“Não quero me prender a se as manifestações foram maiores ou menores. São legítimas, mesmo que discorde de parte delas, como as que pedem o impeachment de Dilma. Não podemos deixar de dialogar com a população. O diálogo é o melhor enfrentamento”, diz o líder do governo na Câmara, José Guimarães (PT-CE), acrescentando que os manifestantes perceberam o “esforço de Dilma” para atender as demandas das ruas.

Parlamentares da oposição participaram dos atos. O senador Ronaldo Caiado, do PSDB-GO, foi à Paulista. “Estou na manifestação. Agora vamos subir a tag #SaiDilmaVez. Renuncia, Dilma! Vamos lá!”, escreveu no Twitter. Presidente nacional do PSDB, Aécio Neves (MG), divulgou nota em apoio aos manifestantes (leia mais na página 4).

Colaboraram Carolina Braga,
Juliana Cipriani e Marcelo da Fonseca

Perfil na rede

Sem se referir diretamente às manifestações, o perfil da presidente Dilma Rousseff em uma rede social publicou um texto pequeno em que defende o combate à corrupção. “Ela encaminhou, em março, um conjunto de propostas ao Congresso que vão permitir maior atuação contra diferentes frentes da corrupção”, registra o texto.

"O fato de ter menos gente nas ruas não diminui a importância do alerta 
que está sendo dado. Temos de estar atentos a essas manifestações”

Michel Temer,
vice-presidente da República 


"O PSDB se solidariza com os milhares de brasileiros que voltaram 
às ruas e ocuparam as redes sociais mais uma vez”

Nota do PSDB,
divulgada logo depois das manifestações