BRASÍLIA - A passagem relâmpago de menos de três meses de Cid Gomes pelo Ministério da Educação (MEC) foi marcada pela polêmica restrição ao crédito do Fundo de Financiamento Estudantil (Fies), atritos com o setor privado, além do anúncio de uma reforma do ensino médio em dois anos e cortes de orçamento na pasta, que atingiram em cheio as universidades federais. Cid também deixou para trás a promessa de adotar uma versão eletrônica do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), que seria feito mais de uma vez por ano.
A presença do político cearense na equipe ministerial era vista no Palácio do Planalto como um dos trunfos da presidente Dilma Rousseff, que elegeu o lema Pátria Educadora para sua segunda gestão. De todos os ministros que atuaram na gestão Dilma, Cid foi o que passou menos tempo à frente do cargo. E foi o primeiro não petista a chefiar a Educação desde que o PT assumiu o Planalto, em 2003.
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Em seus primeiros dias no cargo, Cid anunciou reajuste de 13,01% no piso dos professores - de R$ 1.697 para R$ 1.917,78.
Financiamento. Cid manteve relação tensa com o setor privado, após o MEC mudar o acesso ao Fies e a forma de pagamento às instituições - as portarias com as alterações foram publicadas na gestão de seu antecessor, Henrique Paim, mas seus desdobramentos ocorreram depois da posse do ex-governador do Ceará.
Com as mudanças, ações de empresas do setor despencaram na Bolsa de Valores. "Eu não entendo muito de Bolsa, não. Quero trabalhar pela educação, focando na questão da qualidade na educação pública", disse o então ministro em 13 de janeiro, ao defender a exigência de uma pontuação mínima de 450 pontos no Enem para obter acesso ao financiamento.
Em fevereiro, Cid cedeu à pressão e autorizou reajuste de até 6,4% nas matrículas do Fies. Os problemas com o programa ainda atingiram os estudantes, que enfrentaram dificuldades para acessar a página do programa.
Na sequência, foi a vez de o Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego (Pronatec), uma das principais vitrines do Planalto, ser alvo de críticas. Depois de vir a público a notícia de que escolas privadas não haviam recebido o pagamento previsto pelo governo, o MEC liberou R$ 119 milhões para regularizar o fluxo de caixa referente às mensalidades de 2014.
No lugar de Cid, assumiu interinamente a pasta o secretário executivo Luiz Cláudio Costa, ex-presidente do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep). Ele já propôs a aplicação de um Enem ao fim do primeiro ano do ensino médio. O "Enem Light" teria apenas fins pedagógicos, com adesão voluntária, sem ser requisito para ingresso na universidade.
O PT quer retomar o controle do Ministério da Educação, que ocupou durante 12 anos, desde o primeiro mandato de Luiz Inácio Lula da Silva.
Sob o argumento de que o titular das Comunicações, Ricardo Berzoini, nada tem a fazer naquela pasta, uma vez que Dilma não comprou a ideia de regulamentação da mídia, integrantes da corrente Construindo um Novo Brasil (CNB), majoritária no PT, querem agora que ele seja transferido para Educação. A troca deixaria a pasta de Comunicações no jeito para ser ocupada pelo PMDB, que ganharia, assim, o oitavo ministério.
A sugestão foi apresentada ontem ao chefe da Casa Civil, Aloizio Mercadante, que foi ministro da Educação. Mercadante respondeu que enviaria a ideia a Dilma e não deu mais pistas. Dirigentes do PT estão contrariados porque, quando deixou a Secretaria de Relações Institucionais e foi para Comunicações, Berzoini recebeu a garantia de que o ministério ficaria com a verba de publicidade do governo.
Ao que tudo indica, porém, não haverá projeto de regulamentação da imprensa para tocar, como deseja o PT, nem dinheiro em caixa para gastar. A verba de publicidade continuará centralizada na Secretaria de Comunicação da Presidência (Secom), que vive uma crise após o vazamento de um documento reservado, apontando um "caos político" e falhas na estratégia de governo.
Dilma ficou irritada porque a ruidosa demissão de Cid, anunciada pelo presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), abafou o anúncio do pacote anticorrupção, na quarta-feira. Além disso, a leitura política foi a de que a presidente é refém do PMDB, que exigiu a cabeça de Cid após ele reafirmar que a Câmara tem uns "400, 300 achacadores".
A reforma ministerial pode ser menor do que deseja Lula, mas Dilma terá de dar uma "chacoalhada" na equipe, como diz seu padrinho político, se quiser sobreviver ao PMDB, que comanda a Câmara e o Senado.