Os negócios sob suspeita entre a Caixa Econômica Federal e a IT7 Sistemas, de um irmão do ex-deputado André Vargas, somam quase R$ 90 milhões. Segundo investigações da Operação Lava Jato, a empresa de tecnologia contratada pelo banco público era usada pelo ex-parlamentar como duto de propinas. 

No dia 10 deste mês, a força-tarefa que investiga o escândalo da Petrobrás deflagrou sua 11.ª etapa, esta dedicada aos negócios suspeitos de Vargas, que deixou o PT e o Congresso em meio à revelação de sua ligação com o doleiro Alberto Youssef. As suspeitas levantadas na nova etapa da operação recaíram sobre contratos da Caixa e também do Ministério da Saúde.

Os investigadores da Lava Jato revelaram ter evidências de que pelo menos R$ 2,3 milhões recebidos pela IT7 entre 2013 e 2014 foram lavados por meio de subcontratações de outras empresas para realização de serviços fictícios. No fim, o dinheiro, segundo a Polícia Federal, ia parar nas mãos de Vargas, que hoje está preso em Curitiba por ordem do juiz Sérgio Moro, responsável pela Lava Jato. Agora, a força-tarefa tenta saber se um volume maior foi desviado.

Até agora inédito, o valor total dos negócios da Caixa Econômica Federal com a IT7 Sistemas – R$ 87,4 milhões – foi informado pelo próprio banco a pedido do Estado. Desde quando as suspeitas vieram à tona, no dia 10 passado, a Caixa suspendeu os pagamentos à companhia que tem Leon Vargas, irmão de André, como um dos sócios.

A IT7 já teve contratos com outros órgãos do governo federal como o Serviço de Processamento de Dados (Serpro). As suspeitas, por ora, recaem apenas sobre acordos da Caixa e da Saúde. 

Pregão. A Caixa Econômica Federal informou ter firmado dois contratos com a IT7 por meio de pregão eletrônico para fornecimento de licença de produtos da companhia Oracle (banco de dados) e serviços de manutenção. A empresa, segundo o banco estatal, venceu o pregão porque ofereceu o menor preço. 

No primeiro contrato, pagou R$ 16 milhões, sendo R$ 13,4 milhões pela compra da licença e R$ 2,7 milhões pelos serviços de manutenção entre março de 2012 e março de 2013. Pelo segundo contrato, que vigoraria até o fim deste ano, o banco estatal pagou R$ 49 milhões pela licença e desembolsaria R$ 22,5 milhões pela manutenção do software por dois anos, de dezembro de 2013 a dezembro de 2015. Dessa última quantia, R$ 10 milhões não chegaram a sair dos cofres do banco público pois os pagamentos foram suspensos. Ou seja, no total, o banco pagou R$ 77,5 milhões à empresa de tecnologia do irmão do ex-deputado André Vargas.

Trata-se de um valor bem maior do que o estimado por Sérgio Moro nas justificativas da ordem de prisão do ex-parlamentar. O juiz federal que atua no Paraná estimava que a Caixa tivesse desembolsado algo em torno de R$ 50 milhões para a IT7.

A Caixa também contratou a outra empresa investigada na 11.ª fase da Lava Jato, a agência de publicidade Borghi/Lowe. O banco estatal repassou R$ 949 milhões por dois contratos – o primeiro de agosto de 2008 a abril de 2013 e o segundo, firmado em 2013 e que ainda estava em vigor quando a operação foi deflagrada. O primeiro contrato era dividido com as agências Fischer&Friends e a Nova SB e o segundo, com Artplan, Heads e Nova SB. 

Segundo a investigação, Ricardo Hoffmann, diretor-geral da agência, era quem autorizava o pagamento para empresas subcontratadas que acabavam repassando as quantias para Vargas. 

Assim como o ex-parlamentar petista, Hoffmann está preso em Curitiba. Segundo publicou nesta quinta-feira, 23, o jornal Folha de S.Paulo, o dono da agência de publicidade estaria disposto a fazer delação premiada em troca de eventual redução de pena. Advogados de Hoffmann negam publicamente que essa seja, no momento, a intenção de seu cliente. 

Atualizado. No total, as duas empresas suspeitas de fazer pagamentos que iriam parar nas mãos de Vargas – IT7 Sistemas e Borghi/Lowe – receberam da Caixa Econômica Federal R$ 1,036 bilhão em valores não corrigidos pela inflação nos últimos oito anos. 

Já o Ministério da Saúde, o outro órgão governamental sob suspeita na 11.ª fase da Lava Jato, desembolsou R$ 113 milhões à agência Borghi/Lowe, de acordo com dados disponíveis no Portal da Transparência. O valor foi repassado pelo ministério em 2011, depois de fechar o contrato no ano anterior, e é referente a campanhas de publicidade do Programa Mais Médicos, uma das principais bandeiras do governo Dilma Rousseff, e de campanhas de prevenção de doenças como tuberculose, poliomielite e a gripe H1N1.

A Lava Jato foi deflagrada em 17 de março de 2014 e tinha os negócios de Youssef como alvo inicial. Com o passar do tempo, além de descobrir as conexões políticas do doleiro – como sua relação com Vargas –, a força-tarefa da operação acabou se deparando com os desvios nas megaobras da Petrobrás, cujo montante admitido pela própria estatal pode ter chegado a R$ 6,42 bilhões entre 2004 e 2012.

 

Banco já suspendeu repasses às fornecedoras investigadas

 

Depois de deflagrada a fase da Operação Lava Jato batizada de “A Origem”, a Caixa Econômica Federal informou que suspendeu os pagamentos de serviços prestados pelas empresas IT7 e Borghi/Lowe e que não contratará os serviços dos dois fornecedores alvo da Polícia Federal e do Ministério Público até que sejam concluídas as apurações do caso.

Os contratos sob suspeita teriam favorecido o ex-deputado paranaense André Vargas, ex-dirigente do PT que deixou o partido após ser envolvido no escândalo da Lava Jato. O Ministério Público Federal recolheu provas em quatro supostos esquemas nos quais Vargas teria usado o cargo público para obter vantagens de natureza pessoal. Entre eles, contratos fictícios de publicidade e na área de tecnologia da Caixa. 

O banco estatal já tinha informado que abriu investigação interna para a apuração do caso logo que a operação veio à tona. Segundo a Caixa, a comissão terá um mês para a realização dos trabalhos.

“A Caixa Econômica Federal esclarece que nos relatórios da Polícia Federal e do Ministério Público, que deram embasamento à Operação A Origem, não houve nenhuma indicação de prática de irregularidade pela Caixa ou por seus empregados”, diz a nota enviada pela assessoria de imprensa. 

Documentos. A instituição informou que enviou cópia dos processos de licitação dos fornecedores e dos contratos firmados à Polícia Federal, ao Ministério Público, à Controladoria-Geral da União (CGU) e ao Tribunal de Contas da União (TCU). Segundo o banco, são cerca de 30 mil processos, que foram transferidos do arquivo de Goiânia para o edifício-sede da Caixa, em Brasília. Os documentos estão em “ambiente seguro e com acesso controlado”. O banco afirmou estar à disposição dos órgãos para os esclarecimentos necessários. 

O Ministério da Saúde designou uma comissão interna de sindicância para averiguar supostas irregularidades no contrato de publicidade da pasta apontadas pela Lava Jato. A comissão é formada por três integrantes e tem um mês (até 13 de maio) para a conclusão dos trabalhos. O ministério também suspendeu os pagamentos à agência acusada de sublocar outras prestadoras de serviços para repassar valores para o ex-deputado e para seu irmão Leon Vargas. Os dois foram presos pela PF, mas só o ex-parlamentar segue na carceragem.

A pasta também vai repassar as informações dos contratos de publicidade no período analisado pela PF – janeiro de 2009 a março de 2015 – à CGU, ao TCU e ao Ministério Público, “para reforçar as medidas de controle e auxiliar nas investigações”. 

A reportagem tentou falar com Nicole Trauczynski, advogada de André Vargas, mas não conseguiu localizá-la na noite de ontem no celular. Ela fez a defesa de Enivaldo Quadrado na Lava Jato, também investigado no mensalão. Quadrado colaborou com os investigadores e já obtém os benefícios disso. 

O advogado Alexandre Augusto Loper, que defende o empresário Leon Vargas, afirmou que só vai se pronunciar quando tiver “claramente a noção de que crimes querem imputar” no cliente dele.