O globo, n. 29827, 06/04/2015. Economia, p. 15

MAIS RAPIDEZ NAS CONCESSÕES

POR MARTHA BECK E DANILO FARIELLO | BRASÍLIA

O governo dará nesta segunda-feira mais um passo para acelerar o programa de concessões no setor de transportes e, assim, tentar retomar o crescimento da economia. Será publicado no Diário Oficial da União de amanhã um decreto com novas regras para os chamados Procedimentos de Manifestação de Interesse (PMIs), que são os estudos feitos pelo setor privado sobre determinado empreendimento para avaliar seus custos e ganhos potenciais em um leilão. Esse instrumento, que passou a ser a primeira etapa de uma concessão, foi aperfeiçoado para dar mais segurança jurídica ao setor privado e, assim, despertar o chamado "espírito animal" dos empresários. Isso está sendo feito por meio da redução dos entraves burocráticos e da possibilidade de participação de empresas pequenas e até estrangeiras.

A elaboração do decreto contou com aval dos ministérios do Planejamento, Transportes, Aviação Civil e Portos, além da Advocacia-Geral da União. O governo tem, atualmente, pelo menos quatro rodovias (que somam 2,6 mil quilômetros) e seis ferrovias (4,6 mil quilômetros) com PMIs abertos a manifestações ou a serem licitadas. Além disso, aeroportos e programas de concessão de dragagem e instalação de novos terminais em portos podem ser incluídos no modelo. Nos últimos meses, o governo prorrogou os prazos de PMIs abertos à espera de mais propostas.

A edição do decreto faz parte de um esforço do governo para tentar antecipar a retomada do crescimento da economia já para o terceiro trimestre de 2015. Para isso, um dos principais motores que o governo tem ao seu dispor é o programa de concessões. Esse programa vem passando por uma reformulação para se ajustar às atuais condições do mercado, que foi afetado pelos desdobramentos da Operação Lava-Jato, da Polícia Federal, e pelo baixo crescimento da economia. A expectativa da área econômica é que, no segundo trimestre, o nível da atividade fique estável em relação aos primeiros três meses do ano, mas que, a partir de uma reação no terceiro trimestre, o país possa retomar sua trajetória de crescimento.

APERFEIÇOAMENTO DO MECANISMO

Entre as rodovias que estão com esses procedimentos abertos está a BR-163/230, que liga o polo agrícola do Mato Grosso ao Porto de Miritituba, no Pará. Há anos o governo vinha encontrando dificuldades para duplicar e asfaltar esse trecho, até que decidiu, no ano passado, concedê-lo à iniciativa privada tendo o PMI como passo inicial. Também está na lista de empreendimentos abertos a projetos privados via PMI a Ferrovia Norte-Sul entre Açailândia (MA) e Barcarena (PA), que é o trecho final do lado norte, ligando todo o centro do país ao Oceano Atlântico, no Porto de Vila do Conde. Doze grupos apresentaram intenção de elaborar projetos para esse trecho e devem entregá-los até junho.

Segundo técnicos do Ministério do Planejamento, a principal novidade do decreto, ao qual o GLOBO teve acesso, é justamente criar uma norma detalhada para os PMIs, que hoje só têm amparo regulatório de forma genérica em um decreto de 2006, que trata das Parcerias Público-Privadas (PPPs). Os técnicos explicam que, embora os PMIs sejam usados em todos os tipos de investimentos em infraestrutura, e não apenas em PPPs, isso é tratado por meio de uma analogia, com autorização do Tribunal de Contas da União (TCU), e não por um normativo específico, o que acaba criando entraves burocráticos. O próprio TCU recomendou ao governo aperfeiçoar o mecanismo, e a equipe econômica temia inseguranças jurídicas que reduzissem a atratividade dos empreendimentos para os investidores.

Outra novidade na regulamentação está no fato de o governo ter incluído no decreto a possibilidade de esses estudos serem abertos por iniciativa de qualquer um, pessoa física ou jurídica (empresas), e não apenas pelos órgãos que detenham a competência para isso - como, por exemplo, o Ministério dos Transportes, no caso de rodovias e ferrovias. De acordo com os técnicos, isso significa que um parlamentar ou mesmo uma empresa poderão sugerir a adoção desse tipo de instrumento.

No ano passado, o governo federal contou com a participação inicial de onze grupos para presentar projetos para a PMI da ponte Rio-Niterói, que foi relicitada no mês passado. Ao fim da elaboração do edital, porém, apenas cinco estudos puderam ser aproveitados efetivamente, sendo que apenas dois foram contemplados no modelo que foi a leilão.

PEDIDO DAS EMPRESAS

O decreto vai regulamentar também a remuneração desses projetos, que terão valor nominal "fundamentado em prévia justificativa técnica" e que "não ultrapassará, em seu conjunto, 2,5% do valor total estimado previamente pela administração pública para os investimentos necessários à implementação do empreendimento ou para os gastos necessários à operação e à manutenção do empreendimento durante o período de vigência do contrato, o que for maior", informa o governo federal na exposição dos motivos para a apresentação do decreto. Esses projetos apresentados por meio de um PMI e aproveitados pelo governo são, portanto, remunerados após a realização do leilão de um determinado empreendimento.

Os PMIs foram adotados nos programas de concessão a pedido das principais empreiteiras do país - muitas das quais estão hoje envolvidas na Lava-Jato. Agora, o governo vem remodelando esses procedimentos para atender também a empresas menores ou estrangeiras. O decreto prevê, nesse sentido, que deverá ser avaliada "em cada caso, a conveniência e a oportunidade de reunir parcelas fracionáveis em um mesmo PMI". A medida visa a promover economias de escala, mas também atende a um pleito das construtoras menores.

NÚMEROS

2,6 mil quilômetros - É a extensão total das quatro rodovias com Procedimentos de Manifestação de Interesse (PMIs) já abertos ou a serem licitadas pelo governo

4,6 mil quilômetros - É a soma das seis ferrovias que atualmente têm PMIs em aberto ou que serão colocadas em licitação pelo governo                                

2,5% - Do valor total estimado pelo governo para os investimentos necessários a um projeto: este é um dos limites para o custo de um PMI, segundo o decreto.