Valor econômico, v. 15, n. 3728, 02/04/2015. Brasil, p. A3

 

PIB do Nordeste destoa e cresce 3,7% em 2014, aponta índice do BC

 

Por Denise Neumann | De São Paulo

A estagnação da economia no ano passado "escondeu" uma forte disparidade regional. Pelo Índice de Atividade Econômica regional do Banco Central, considerado uma prévia do Produto Interno bruto (PIB), enquanto o Nordeste alcançou um expressivo crescimento de 3,7% em 2014 sobre 2013, o Sudeste amargou recessão de 0,8% na mesma comparação. Agricultura e varejo ajudaram os Estados nordestinos, enquanto a indústria foi a grande responsável pela derrocada de São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro, comprometendo a região mais rica do país, apesar do bom desempenho industrial do Espírito Santo.

Estimativas do setor privado apontam que a economia nordestina pode sofrer uma inflexão em 2015. Nas projeções da LCA Consultores, o PIB do Nordeste pode cair 1,7% este ano, retração superior a do Sudeste, estimada em 0,9%. Se confirmada, será a primeira queda desde 1998, e a expectativa é que a região nordestina perca fôlego pela deterioração do mercado de trabalho e pelo ajuste fiscal dos diferentes níveis do setor público. No Sudeste, 2014 já foi um ano recessivo.

 

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O Escritório Técnico de Estudos Econômicos do Banco do Nordeste (Etene-BNB) também espera uma freada no ritmo de crescimento da região, mas descarta recessão. Entre outras razões, o superintendente do Etene, Fran Bezerra, cita a demanda ainda firme por financiamento nos fundos geridos pela instituição. Depois de emprestar R$ 27 bilhões no ano passado, o plano para 2015 é de R$ 28 bilhões. "E as metas do primeiro trimestre foram alcançadas", diz ele.

Alexandre Rands, diretor da Datamétrica, consultoria localizada em Recife, avalia que o Nordeste ainda se beneficia dos efeitos da distribuição de renda, da política de correção do salário mínimo e dos programas sociais. "Quando você gera renda você não gera PIB imediatamente", diz ele. "Em pequenos municípios você tinha uma padaria e ela dava conta de atender a demanda por pão. Após anos de distribuição de renda e programas de transferência, você precisa de uma segunda padaria, que cria empregos", acrescenta, dando um exemplo do efeito positivo que os ganhos de renda acumulados nos últimos anos exercem sobre o produto da região.

Pelos dados do Banco Central - que reúne produção industrial, varejo, serviços, criação de empregos, oferta de crédito, consumo de energia e outra informações para compor o quadro de atividade regional -, as vendas do varejo ampliado (com automóveis e material de construção) subiram 2,1% no Nordeste e caíram 3,5% no Sudeste no ano passado, o que puxou para baixo a média nacional de 1,7%. Na indústria, a produção nordestina encerrou 2014 com uma leva queda de 0,3%, mas no Sudeste a retração chegou a expressivos 4,6%, dado pior que a média nacional de recuo de 3,2%.

Paulo Neves, economista da LCA Consultores especializado em análise regional da economia brasileira, diz que além do varejo, também a agricultura ajudou muito o Nordeste. Nas suas projeções, o crescimento da região foi de 1% no ano passado, dado bem mais modesto que o indicado pelo índice do Banco Central, mas bem melhor que a queda de 0,2% estimada para o Sudeste. De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o PIB do Brasil variou 0,1% em 2014.

Neves conta que a produção de soja foi destaque no Nordeste, puxada pela expansão da produção (e da área plantada) de soja no Piauí, onde a produção aumentou 60% para uma área 11% maior. No conjunto, a produção agrícola aumentou 9% no Nordeste e 1,8% no Brasil em 2014, diz ele.

Bezerra, do Etene/BNB, pondera que em todos os indicadores - varejo, indústria, agricultura e serviços - o desempenho do Nordeste superou a média nacional. Além do mesmo efeito desenhado por Rands (dos efeitos ainda positivos do ganho de renda dos últimos anos), ele também lista o aumento dos investimentos públicos e privados como impulsionador da economia nordestina. "E esses efeitos continuaram a fazer diferença em 2014", diz ele. No Sudeste, ao contrário, tudo andou pior no ano passado: renda, serviços, agricultura e varejo.

Na indústria, a composição e a diversificação da produção do Sudeste explicam porque a queda foi maior na região, pondera Rogério César de Souza, economista do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi). "Além de automóveis, o Sudeste concentra a indústria de bens de capital e de outros bens de consumo", observa Souza. No Nordeste, por outro lado, a indústria é menos diversificada e com forte participação de setores que sofrem menos em cenários de desaceleração, como acontece com a produção de alimentos.

No ano passado, a indústria de alimentos cresceu 6% no Nordeste, enquanto o refino de petróleo e derivados subiu 8% e o setor de vestuário, 1, 1%. Na média nacional, a produção de alimentos recuou 1,4%, a de combustíveis aumentou 2,4% e a de vestuário caiu 3,2%. Rands, da Datamétrica, considera possível que a queda nos custos logísticos nos últimos anos (com estradas melhores e maior profissionalismo na área de transportes) tenha favorecido a transferência de produção para o Nordeste no caso de uma empresa com fábricas em diferentes regiões. "Essa migração pode ter ajudado o Nordeste", avalia ele, que tem estudado essa hipótese. "É uma possibilidade", diz.

Para 2015, o economista da LCA projeta o primeiro ano de recessão no Nordeste desde 1998. E alguns indicadores da região, pondera Neves, já começaram a piorar no fim do ano passado, tendência que deve se aprofundar neste ano. O índice do BC, olhado trimestralmente, mostra que o ritmo da atividade ficou parado no Nordeste no quarto trimestre de 2014 em relação ao terceiro, na série com ajuste sazonal. No Sudeste, ele recuou 0,2% na mesma comparação.

"O crescimento da massa salarial foi um pouco maior no Nordeste, e o ganho veio principalmente da ocupação, que cresceu mais que o salário médio, na comparação com a média do país", diz ele. Como o desemprego vai crescer (e já cresceu), ele espera que essa perda de dinamismo no mercado de trabalho atrapalhe o desempenho do Nordeste em 2015. "Nos últimos anos, a construção civil e o setor de serviços puxaram a ocupação na região, o que não acontecerá neste ano", acrescenta.

Souza, do Iedi, espera que em 2015 a indústria do Sudeste, de novo, seja mais afetada que a média do país. Ele espera uma desaceleração da massa salarial, mas não uma queda brusca. Isso ainda protege mais os setores de não duráveis e semiduráveis (mais espalhados pelo país), mas os juros altos e a confiança baixa continuarão afetando investimentos e bens mais dependentes de crédito.

Rands acredita que o ciclo de crescimento no Nordeste ainda não acabou. Ainda que em 2015 possa acontecer um "tropeço", ele projeta que a região continuará a crescer acima a média nacional por mais alguns anos. Ele diz que hoje PIB per capita da região está entre 49% e 50% da média nacional, e ainda deve crescer até alcançar 55%. Em 2015, diz, o ajuste fiscal vai prejudicar a economia nordestina, mais dependente do setor publico que Sul e Sudeste.

Além da União, todos os Estados do Nordeste e muitos municípios estão com programas de ajuste fiscal, pondera Bezerra. "Essa restrição vai impedir que a economia do Nordeste siga um rumo diferente do resto do país, por isso esperamos uma freada no processo de crescimento, até porque os investimentos serão afetados, mas o estoque de ganhos acumulados nos últimos anos vai impedir um decréscimo no PIB da região", acredita.

 

Indústria cai em fevereiro e indica recuo da atividade no 1º tri

 

Por Arícia Martins e Robson Sales | De São Paulo e do Rio

Afetada pela desaceleração da demanda doméstica e, em menor medida, pela redução de dias úteis, devido ao Carnaval, a produção industrial recuou 0,9% de janeiro para fevereiro, feitos os ajustes sazonais. Como o resultado do primeiro mês do ano foi revisto para baixo - alta de 2% para apenas 0,3% - e os indicativos para março também são ruins, a Pesquisa Industrial Mensal - Produção Física (PIM-PF), divulgada pelo IBGE, reforçou a percepção de que o Produto Interno Bruto (PIB) deve voltar ao terreno negativo no primeiro trimestre.

Segundo economistas, o desaquecimento do consumo das famílias, a confiança do empresariado em patamar historicamente baixo e estoques ainda em nível elevado em alguns segmentos desenham um quadro mais complexo para o setor do que a crise de 2009 e impedem a recuperação da atividade industrial, que pode recuar cerca de 5% em 2015, sobre uma base já deprimida. Caso o ajuste fiscal seja bem-sucedido e tenha efeito positivo sobre as expectativas, dizem, o cenário só deve melhorar a partir do fim do ano.

 

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Na passagem mensal, a produção caiu em todas as quatro categorias econômicas que compõem a pesquisa, com destaque para bens de capital (ver tabela) e em 11 dos 24 ramos de atividade pesquisados. Para os analistas ouvidos, o principal sinal de deterioração adicional da indústria, no entanto, veio da redução de 9,1% da produção em relação a igual mês do ano passado. Foi o maior tombo do setor desde julho de 2009, quando os efeitos da crise internacional levaram a produção a encolher 9,9% em relação ao mês anterior.

Professor da Unicamp e ex-secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda, Júlio Gomes de Almeida pondera que, devido ao feriado, o segundo mês deste ano contou com dois dias úteis a menos do que fevereiro de 2014, o que também pesou sobre a queda expressiva da produção industrial nessa comparação. De qualquer forma, afirma Almeida, enquanto ainda não gera impacto positivo sobre a atividade, o ajuste econômico deprime as expectativas dos empresários, o que repercute especialmente no comportamento da indústria de bens de capital e de bens duráveis.

Em relação a fevereiro do ano passado, esses dois segmentos recuaram 25,7% e 25,8%, respectivamente. "As expectativas acabam influenciando os investimentos e o consumo de bens duráveis, que são bens cuja aquisição também depende muito da visão do futuro", afirma o economista, para quem a piora no humor dos consumidores também se refletiu na produção.

Segundo Luis Otávio de Souza Leal, economista-chefe do banco ABC Brasil, o menor dinamismo da demanda das famílias já teve impacto sobre a produção de bens semi e não duráveis, que dependem mais da renda disponível do que do crédito e que, em fevereiro, cederam 0,5% sobre o mês anterior na PIM-PF.

"Esses setores industriais foram privilegiados nos últimos anos pela estratégia de crescimento baseada no consumo", diz Leal. "A partir do momento em que a renda disponível começa a diminuir, a tendência é que os números piores do varejo comecem a se refletir também nessa parte da indústria", afirma. Como, agora, não há espaço algum para políticas anticíclicas que foram usadas no pós-crise, Leal acredita que a indústria atravessa agora uma fase mais difícil do que naquela ocasião.

Alexandre de Andrade, da GO Associados, também identifica a perda de fôlego da demanda doméstica como o principal entrave a um crescimento da indústria na conjuntura atual. Andrade observa que, de 2011 a 2013, os incentivos ao consumo concedidos pelo governo ainda deram algum alento à atividade industrial, mas, a partir de meados daquele ano, quando os estímulos começaram a mostrar sinais de esgotamento, o setor manufatureiro entrou em trajetória de declínio, que persiste até agora.

Em março, diz o economista, os indícios são de que a atividade teve mais um mês de fraqueza, com perda da confiança dos empresários, aumento do volume de estoques em alguns segmentos e paralisação em linhas de produção de montadoras. Juntando essas informações ao desempenho pífio da indústria no primeiro bimestre do ano, Andrade estima que o PIB voltou a recuar nos primeiros três meses de 2015, depois de ter crescido 0,3% entre o terceiro e o quarto trimestres do ano passado. Por enquanto, a GO trabalha com retração de 0,2% no período.

Para a equipe econômica do Bank of America Merrill Lynch (BofA), os indicadores já conhecidos continuam a apontar para um início de ano fraco. Em relatório, os economistas David Beker e Ana Madeira afirmam que os industriais estão ajustando sua produção frente ao aperto nas políticas fiscal e monetária e estimam que a atividade do setor deve encolher novamente neste ano, prejudicada pelo alto nível de mercadorias paradas e pelo aumento de impostos.

Diante do ambiente doméstico pouco promissor, a taxa de câmbio mais depreciada poderia dar alguma ajuda à indústria brasileira, mas os economistas ouvidos veem pouco potencial de contribuição do setor externo, ao menos no curto prazo. Segundo Beker e Ana, a balança comercial sentirá os impactos da desaceleração econômica nos principais parceiros comerciais do Brasil, como a China e a Argentina, embora os Estados Unidos e a União Europeia estejam em recuperação.

André Macedo, gerente da coordenação de indústria do IBGE, avalia que a desvalorização do câmbio ainda não foi sentida pela indústria. "Pode ser um alento para o setor, mas até fevereiro não conseguimos observar influência do dólar nos resultados."

Produção registra queda pelo 2º mês

 

Por De São Paulo

A atividade da indústria brasileira caiu pelo segundo mês consecutivo e atingiu o menor nível em 42 meses, segundo o Índice de Gerentes de Compras (PMI, na sigla em inglês), calculado pelo HSBC e divulgado pela Markit. O indicador recuou de 49,6 pontos em fevereiro para 46,2 pontos em março.

O PMI mede a atividade da indústria levando em conta parâmetros como produção, estoques, novas encomendas, preços e emprego, a partir de informações levantadas entre cerca de 400 companhias. Leituras acima de 50 indicam expansão e, abaixo, retração.

Segundo o banco, houve forte queda de novas encomendas, da produção (maior recuo desde setembro de 2011), de compras de insumos e estoques, além de redução de emprego.

"O mês de março apresentou a maior contração da atividade manufatureira em três anos e meio, uma situação agravada pelas dificuldades da economia doméstica, aumento da inflação e depreciação cambial. As empresas indicaram que o aumento dos custos de importação afetaram a capacidade de competir no mercado global e, como consequência, os pedidos de exportação estagnaram", afirmou, em nota, Pollyanna de Lima, economista da Markit.