Valor econômico, v. 15, n. 3737, 16/04/2015. Opinião, p. A16
Recessão e inflação põem país na contramão da economia global
O Brasil está na contramão da economia global e no bloco dos poucos países que estão ingressando em uma recessão, segundo as estatísticas do Fundo Monetário Internacional. Não é um consolo saber que o país encolherá menos que os 7% previstos para a Venezuela, em 2015, ou que a Rússia (-3,8%), nem que o Brasil faça parte dos 10 países cujo PIB decrescerá, em um total de 105 para os quais há estimativas discriminadas. O grande e extenso desarranjo econômico provocado pela política econômica nos últimos quatro anos tirou o chão dos argumentos oficiais, que apontavam a crise externa como determinante para a má performance doméstica.
O Brasil faz feio não apenas no quesito crescimento, com retração de 1% em 2015 e expansão de 1% em 2016. A inflação é outro destaque negativo relevante, especialmente diante da tendência desinflacionária dominante fora de suas fronteiras. O Fundo aponta que países com um ritmo de aumento de preços inferior a 1% ou deflação perfazem 60% do PIB mundial. Se a conta incluir uma variação de preços anual de 2%, ainda baixa, o resultado é de 70% do PIB.
A inflação brasileira é hoje bastante inferior à do período anterior ao Plano Real, mas ganhou uma persistência incômoda depois de políticas macroeconômicas inadequadas recentes. Neste ponto, o Mercosul é um bloco que dá um exemplo bastante negativo. A Venezuela tem hoje a maior inflação mundial, que deverá atingir 96,8% este ano. O índice da Argentina, de 18,6%, e crescendo em 2016, é o terceiro maior do mundo, ficando atrás do Sudão, com 37%. O Brasil, com 8% supera em pouco o Uruguai, com 7,7%. Apenas o Paraguai, sócio menor do bloco, não faz feio, nem em crescimento, com 4% - Argentina, Brasil e Venezuela estão em recessão - nem no aumento de preços (3,5%). E, apesar da queda das commodities, que não deverá ser revertida este ano, os demais países sul-americanos deveram obter melhor desempenho que o Brasil e uma inflação menor.
A forte deterioração fiscal de 2014, com um déficit primário de 0,6% do PIB, o que não ocorria em mais de uma década, piorou indicadores comparativos já por si só ruins. O déficit nominal, que cairá de 6,2% do PIB para 5,3% este ano, se o ajuste for executado, continuará sendo um dos maiores, considerando-se economias avançadas e países emergentes relevantes. Será inferior apenas aos 7,2% estimados para a Índia, país que deverá crescer mais que a China em 2015 e também aos 6,2% do Japão, empenhado no maior programa de relaxamento monetário da história (o balanço do BC japonês está a caminho dos 70% do PIB).
Apesar de diferente metodologia do FMI, a dívida bruta do Brasil (com Estados e municípios) deverá atingir este ano 66,2% do PIB, a maior dentre os principais países emergentes e de renda média. Mesmo a dívida líquida, na casa dos 34% do PIB, ainda é superior à média desses países, de 10,9% do PIB. Com isso, não é de estranhar que de outubro de 2014 até agora o Brasil tenha sido o país que mais elevou os juros reais entre países relevantes da economia global.
O FMI, em suas estimativas, assumiu que o governo brasileiro fará o ajuste fiscal de 1,2% do PIB em 2015 e de 2% no ano seguinte, prometido pelo ministro da Fazenda, Joaquim Levy. O alcance do aperto fiscal será 0,25 ponto percentual maior nos dois anos seguintes, chegando a 2,5% do PIB em 2018, último ano do mandato de Dilma Rousseff. Com esse esforço, será possível que ao fim de quatro anos a dívida bruta do governo geral decline 1 ponto percentual da que era em 2014, ano do desatino fiscal, de 65,2% do PIB.
Nas simulações do Fundo, será possível derrubar o elevado déficit nominal em 1 ponto percentual do PIB já em 2015, para 5,3% do PIB e, depois, em cerca de 0,5% do PIB por ano, concluindo uma redução de 2,76 pontos, até a atingir 2,59% do PIB, um pouco maior que o de 2012. Até 2018, as receitas subirão 0,9 ponto do PIB, enquanto que as despesas totais, incluindo juros, cairão 0,5 ponto do PIB por ano.
Com tudo isso, o crescimento será de 2,25% em 2017 e não muito mais nos anos seguintes, chegando a 2,5% em 2020. Os ganhos contra a inflação serão graduais. Em 2016 ela poderá atingir 5,3% no fim do período, ainda distante do centro da meta de 4,5%, que só será atingido em 2020. Nesse cenário, se tudo der certo, o governo passará quatro anos para conseguir corrigir erros dos quatro anteriores. E, no caso do crescimento, não conseguirá.