Aumenta a pressão

 

Nova delação da Lava-Jato leva procurador-geral a pedir mais provas contra políticos

29 jun 2015

VINICIUS SASSINE, MARIA LIMA E CRISTIANE JUNGBLUT

As revelações de Ricardo Pessoa, dono da empreiteira UTC, levaram o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, a fazer novos pedidos de produção de provas contra políticos nos inquéritos da Operação Lava-Jato no âmbito do Supremo Tribunal Federal (STF). Também haverá desdobramentos numa ação da Justiça Eleitoral sobre contas de campanha da presidente Dilma, que, ontem, evitou o assunto, no primeiro dia de sua viagem aos EUA. -BRASÍLIA- A Procuradoria Geral da República (PGR) já encaminhou ao Supremo Tribunal Federal (STF) os primeiros pedidos de produção de provas com base na delação premiada do dono das construtoras UTC e Constran, Ricardo Pessoa. O empreiteiro relatou o envolvimento de diversas autoridades com foro privilegiado em esquemas de desvio de recursos da Petrobras e de outras obras públicas. Por ter citado nomes novos, pedidos de abertura de inquéritos serão feitos pela PGR ao STF, além dos procedimentos já em curso contra dezenas de autoridades.

A delação de Pessoa também terá desdobramentos na ação de investigação eleitoral aberta no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) para analisar a prestação de contas da campanha à reeleição da presidente Dilma Rousseff. Segundo o ministro João Otávio de Noronha, relator da ação, Pessoa será ouvido no próximo dia 14. Uma eventual comprovação das informações reveladas poderá ser levada em conta no julgamento.

As solicitações de diligências foram encaminhadas pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot, ao ministro do STF Teori Zavascki, relator dos processos envolvendo políticos na Operação Lava-Jato. Os pedidos se referem a casos com investigações em andamento desde março deste ano, quando os primeiros inquéritos relacionados a políticos foram abertos no âmbito do STF. Teori ainda não proferiu decisão sobre os pedidos de produção de provas formulados pela PGR.

PROCEDIMENTOS SOB SIGILO

O ministro homologou a delação de Pessoa na última quinta-feira, 25, o que significa que os depoimentos prestados pelo empresário passam a ter validade para o início das investigações sobre os 40 episódios delatados e sobre pelo menos 18 pessoas relacionadas a eles. A partir da homologação, a PGR deu encaminhamento ao STF dos primeiros pedidos de diligências a serem executados pelo órgão e pela Polícia Federal (PF). Esses procedimentos podem ser depoimentos dos investigados e de testemunhas; quebras de sigilos bancário, fiscal e telefônico; ou busca e apreensão de documentos, entre outros. Todos os procedimentos tramitam sob sigilo, inclusive o próprio conteúdo dos depoimentos do dono da UTC.

Com base nas primeiras delações da Lava-Jato que fizeram referência a políticos com foro privilegiado — do doleiro Alberto Youssef e do ex-diretor de Abastecimento da Petrobras Paulo Roberto Costa —, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, encaminhou em março a Teori uma lista de nomes com pedidos de abertura de inquérito. O ministro do STF determinou a abertura dos procedimentos e, desde então, as investigações vêm sendo feitas pela PGR e pela PF. Ao todo, 13 senadores e 22 deputados federais são investigados, entre eles os presidentes do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), e da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ).

Agora, a delação de Pessoa vai ampliar a quantidade de investigados, pois o empreiteiro citou novos episódios e nomes. Caberá a Janot decidir sobre quais nomes deverão haver pedidos novos de investigação. Ainda não há informação sobre encaminhamentos desses pedidos, o que pode ocorrer nos próximos dias.

As menções a autoridades com foro e outros políticos já investigados no STF devem ser remetidas aos inquéritos já abertos no STF. São os casos dos senadores Fernando Collor (PTB-AL), Edison Lobão (PMDB-MA), Benedito de Lira (PP-AL) e Ciro Nogueira (PP-PI), dos deputados federais Eduardo da Fonte (PP-PE) e Arthur Lira (PP-AL) e do ex-tesoureiro do PT João Vaccari Neto. Todos eles já são investigados no STF, por suspeitas como corrupção passiva e lavagem de dinheiro. Por aparecerem na delação de Pessoa, os inquéritos abertos contra eles terão novas frentes de apuração.

Pessoa delatou ainda uma suposta pressão por recursos para a campanha de Dilma Rousseff à reeleição, com citação ao nome do tesoureiro da campanha, o atual ministro da Secretaria de Comunicação Social (Secom), Edinho Silva. O dono da UTC também afirmou ter havido caixa dois na campanha de Lula em 2006.

Na delação do ex-diretor da Petrobras, Paulo Roberto Costa, também apareceram citações a uma suposta destinação de recursos ilegais à campanha de Dilma em 2010. Segundo Costa, o pedido de R$ 2 milhões foi feito pelo ex-ministro Antonio Palocci, que passou a ser investigado na primeira instância. Janot considerou não haver razões para investigar Dilma. Ele também descartou investigar o senador Aécio Neves (PSDBMG), citado em delação de Youssef. Agora, as menções à campanha da presidente devem levar a uma nova análise do procurador-geral.

CINCO SENADORES CITADOS NA DELAÇÃO

O dono da UTC citou ainda supostos repasses ilegais à campanha do atual ministro da Casa Civil, Aloizio Mercadante, ao governo de São Paulo em 2010; propina para abafar a CPI da Petrobras no ano passado, direcionada ao ex-senador Gim Argello (PTB-DF); compra de informações privilegiadas do Tribunal de Contas da União (TCU), com repasses ao advogado Tiago Cedraz, filho do presidente do tribunal, Aroldo Cedraz; e propina ao então presidente da Transpetro, Sérgio Machado, que ocupou o cargo por 12 anos por indicação de Renan Calheiros.

Pelo menos cinco senadores e três deputados federais foram citados na delação. Há ainda menções à campanha do prefeito de São Paulo, Fernando Haddad (PT), e ao ex-ministro José Dirceu, que recebeu recursos por meio de sua consultoria. A lista tem políticos da oposição: o senador Aloysio Nunes (PSDB-SP) e o deputado Júlio Delgado (PSB-MG).

Pessoa será ouvido no dia 14 pelo corregedorgeral-eleitoral do TSE, ministro João Otávio de Noronha, na ação de investigação judicial eleitoral protocolada pelo PSDB para cassar o registro da chapa de Dilma e de Michel Temer. Segundo Noronha, o delator terá que provar as acusações.

— Não basta só declarar a doação ao TSE. O senhor Ricardo Pessoa será ouvido. Se provar que o dinheiro doado veio da Petrobras, com a empresa sendo usada como barriga de aluguel para a doação, é fraude. Tudo vai depender da prova.

Ex-presidente do TSE e ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), o ministro Marco Aurélio Mello acha que esses fatos novos serão levados em conta no julgamento desse e de outros recursos do PSDB e da oposição contra a campanha de Dilma, na Justiça Eleitoral. As contas da campanha petista de 2014 foram aprovadas em dezembro no TSE . O PSDB entrou com duas ações para tentar contestar o mandato da presidente:

— O que percebo é que as coisas estão aflorando e revelando as deficiências do sistema. É época de correção de rumos. Mil vezes o conhecimento dos fatos, embora revelem os desmandos dos últimos tempos, do que empurrar para debaixo do tapete. Só lamento que a crise econômica, que ainda não chegou no seu pior momento, agora se agrave com a crise política e o esgarçamento das instituições. Temos que garantir que as instituições funcionem para apurar todas as responsabilidades.

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Menção a doações legais como propina abre nova frente de investigação

 

Denúncia pode indicar que houve corrupção e lavagem de dinheiro

29 jun 2015

(Cristiane Jungblut)

-BRASÍLIA- O depoimento do presidente da UTC, Ricardo Pessoa, deu uma nova dimensão ao escândalo da Petrobras ao misturar em sua delação premiada doações legais de campanha e recursos não declarados que financiaram candidatos. Na época do escândalo do mensalão, as investigações eram sobre pagamento a políticos por meio de caixa dois. A investigação sobre doações legais foi apontada ontem como um diferencial desse depoimento por ministros do Supremo Tribunal Federal. O empresário diz que boa parte dos recursos, mesmo os declarados, repassados a políticos é compensada por desvios de contratos com a Petrobras. Para investigadores, isso pode ser considerado ilegal, mesmo havendo registro no Tribunal Superior Eleitoral ( TSE). Outra interpretação é que, se a denúncia se comprovar, haveria corrupção, pelo fato de o empresário ser obrigado a doar para obter contratos, e ainda lavagem de dinheiro, porque recursos da estatal poderiam ter sido drenados para doações de políticos do governo.

Apesar da apreensão em torno dos desdobramentos dos depoimentos de Pessoa, o Palácio do Planalto reforçará a estratégia de tentar desqualificar a delação com o argumento de que as cifras apontadas pelo empresário em relação à campanha de Dilma e de outros políticos, como o ministro Aloizio Mercadante (Casa Civil), eram declaradas como doações legais. A presidente Dilma Rousseff aprovou, de Nova York, o tom ofensivo usado pelos ministros Mercadante, Edinho Silva (Comunicação Social) e José Eduardo Cardozo (Justiça) em entrevista no sábado com a tese de que todas as doações foram legais e menções a políticos do PSDB que também receberam doações da UTC. A própria Dilma acertou a tática de colocar Cardozo no centro das explicações, para dar uma “resposta de governo” às acusações que envolvem a campanha da reeleição. Mas, interlocutores do governo avaliavam ontem que é “arriscado” botar o ministro da Justiça no processo, já que ele começa a ser pressionado pelo PT por causa da atuação da Polícia Federal nas investigações da Operação Lava-Jato, lembrando que ela é subordinada ao Ministério da Justiça. Nos bastidores, Cardozo retruca, dizendo que a autonomia da PF foi uma conquista do próprio PT.

‘A ORIGEM SUJA DAS DOAÇÕES’

Tesoureiro da campanha de reeleição de Dilma, Edinho Silva disse que os R$ 7,5 milhões doados por Pessoa estavam declarados. O mesmo fez Mercadante sobre os R$ 500 mil doados à sua campanha ao governo de São Paulo, em 2010. As duas doações — de R$ 250 mil cada — constam da prestação de contas da Constram, de 29 de julho de 2010, com o recibo 13001092017; e da UTC, de 27 de agosto, com recibo 13001092079. O empreiteiro é dono das duas empresas, e teria dito que Mercadante recebeu R$ 250 mil de forma legal e R$ 250 mil por fora. O ministro fez questão de mostrar os recibos.

Pessoa falou, também, em pagamentos ilegais a parlamentares. Seriam recursos, chamados de “pixulecos”, para conseguir obter decisões favoráveis no Tribunal de Contas da União (TCU) e enfraquecer a CPI da Petrobras. Essa parte do esquema lembra mais o escândalo do mensalão, em que havia vários tipos de pagamentos não contabilizados a parlamentares, especialmente com recursos de caixa dois.

O líder do DEM no Senado, Ronaldo Caiado (GO), disse que o discurso da doação legal feita pelo Palácio do Planalto não se sustentará. Hoje, os presidentes dos partidos de oposição devem se reunir para discutir o caso:

— Essa tese de caixa um, de caixa legal, não tem como prosperar, porque o delator tem tudo documentado, mostrando o achaque dos emissários do PT, que as doações são oriundas de propina. Nenhum político tem como saber a origem da doação. Mas isso não vale para quem está na cena do crime, flagrado nas negociatas com contratos na Petrobras. O TSE agora sabe a origem suja dessas doações.