Valor econômico, v. 16, n. 3782,  23/06/2015. Brasil, p. A2

 

Falta de acordo em tributação mina competitividade brasileira nos EUA

 

Por Daniel Rittner | De Brasília

As empresas brasileiras têm uma forte desvantagem competitiva, na comparação com os demais países dos Brics, para repatriar seus investimentos feitos no mercado americano. Todos os demais integrantes do bloco - China, Índia, Rússia e África do Sul - têm tratados para evitar a dupla cobrança de impostos com os Estados Unidos.

Na ausência de um acordo de bitributação, as multinacionais verde-amarelas com subsidiárias americanas pagam uma alíquota de 30% em qualquer remessa de dividendos, royalties, juros e serviços para o Brasil. Para os países com acordos, incidem alíquotas de zero a 25%, conforme o tipo de remessa.

 

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A Confederação Nacional da Indústria (CNI), o Conselho Empresarial Brasil-Estados Unidos e a Câmara America de Comércio (Amcham) enviaram uma carta conjunta ao Palácio do Planalto colocando a abertura de negociações de um acordo de bitributação como uma das três prioridades para a visita da presidente Dilma Rousseff, no dia 30, à Casa Branca. As outras duas prioridades sugeridas pelos empresários são discussões para um tratado de livre comércio e a isenção recíproca de vistos entre os dois países.

"Sabemos que dificilmente o acordo para evitar a dupla tributação entrará na declaração dos presidentes, mas gostaríamos imensamente de uma sinalização para a entrada do assunto na agenda bilateral", afirma o gerente-executivo de comércio exterior da CNI, Diego Bonomo.

Desde 2008, segundo ele, não há conversas entre os dois governos sobre a questão. Há dois anos, a CNI consultou 30 grandes multinacionais brasileiras sobre os países tidos como prioritários para a celebração de acordos de bitributação. Os Estados Unidos apareceram como maior prioridade para 13 empresas - Austrália e Colômbia, em segundo lugar, foram citadas quatro vezes.

"As empresas brasileiras mudaram e têm mais operações fora do país", diz a secretária-executiva do Conselho Empresarial Brasil-EUA, Silvia Menicucci. Ela reconhece a dificuldade de levar adiante esse tipo de negociação, inclusive por causa das dúvidas sobre o efeito nos impostos arrecadados, mas acredita que é possível sair da paralisia. "É essencial que haja acordos para evitar a bitributação. Precisamos verificar o que é intransponível. Tudo, quando há boa vontade, consegue-se superar", ressalta Sílvia.

O estoque de investimentos brasileiros nos Estados Unidos alcança US$ 14 bilhões. Do lado inverso, o estoque americano no Brasil chega a US$ 116 bilhões e lidera a lista de investidores estrangeiros no país. Um eventual acordo vale para a tributação dos dois lados. O governo brasileiro concede, unilateralmente, isenção para as remessas de dividendos às matrizes de empresas estrangeiras instaladas por aqui.

O esforço dos empresários tem sido convencer o governo de que não haverá perdas de receitas tributárias com um acordo. Para colocar números no argumento, a consultoria EY foi contratada pela CNI para fazer um estudo sobre o assunto.

Atualmente, o Brasil tem 32 acordos de bitributação - Japão, China, África do Sul, Argentina, Canadá e México estão entre os parceiros. "De todos os países com quem ainda não temos um acordo, possivelmente os mais importantes são Estados Unidos, Alemanha e Reino Unido", diz Bonomo.

Segundo o executivo, a legislação nacional permite "algum grau de compensação" pelos impostos pagos no exterior, mas de forma muito parcial. "O custo de transação é alto demais, por causa do excesso de documentos envolvidos, e não há nenhuma previsibilidade."

Para o avanço das negociações com os Estados Unidos, o setor privado brasileiro reconhece que existem sensibilidades. Uma delas envolve os preços de transferência. O Brasil não segue rigorosamente o modelo da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE) - considerado um padrão nos acordos para evitar a dupla tributação. Trata-se dos preços praticados, sobretudo, no comércio e nos empréstimos intrafirmas.

É preciso ter alguma referência de preços para evitar que remessas sejam enviadas irregularmente mediante a declaração de transações acima ou abaixo dos valores efetivamente praticados.

 

BC projeta melhora no fluxo de investimento no ano

 

Por Eduardo Campos e Edna Simão | De Brasília

O Banco Central trabalha com aumento médio de 50% no fluxo mensal de Investimento Direto no País (IDP) ao longo do segundo semestre. Só com um crescimento dessa ordem se concretiza a projeção de US$ 80 bilhões em afluxo para o ano, que representa 4,12% do Produto Interno Bruto (PIB).

De janeiro a maio, o IDP soma US$ 25,520 bilhões, o que representa média mensal de US$ 5,104 bilhões. Para atingir o projetado, a média no restante do ano tem de subir a R$ 7,78 bilhões. Para o mês de junho, a cifra já não deve ser atingida. O BC projeta ingresso de US$ 4 bilhões. De janeiro a maio de 2014 ingressaram US$ 39,332 bilhões.

Segundo chefe do Departamento Econômico do BC, Tulio Maciel, o fluxo de IDP deve ser mais intenso no segundo semestre do ano em comparação com o primeiro, por isso foi mantida a projeção em US$ 80 bilhões. Em 12 meses até junho, o IDP está acima desse patamar, somando US$ 83 bilhões.

Segundo Maciel, "eventos não econômicos" estavam mais presentes nos primeiros meses de 2015, como o risco hídrico, operação Lava-Jato e ausência do balanço da Petrobras. "À medida que isso está sendo deixado para trás, tende a influenciar favoravelmente os ingressos no segundo semestre do ano, que é tradicionalmente de ingressos maiores", disse. De junho a dezembro do ano passado a entrada média mensal foi de US$ 8,2 bilhões.

Olhando a composição do IDP, chama atenção a queda de 52%, das operações intercompanhia, que somam US$ 7,9 bilhões de janeiro a maio contra US$ 16,654 bilhões em igual período de 2014. A redução capta tanto o menor ritmo de atividade quanto as condições internacionais de liquidez, que pioraram recentemente em função das preocupações com a Grécia.

O evento que deve mudar as condições de liquidez é a esperada elevação do juro americano. Em 2014, os empréstimos intercompanhia responderam por 40% do IDP de US$ 96,851 bilhões. O restante é o IDP propriamente dito, composto pela participação no capital, de R$ 57,874 bilhões em 2014. Em 2015, a participação no capital está em US$ 17,602 bilhões, contra US$ 22,678 bilhões de janeiro a maio de 2014.

O BC também atualizou a projeção para o déficit em conta corrente, de US$ 84 bilhões para US$ 81 bilhões. Em relação ao PIB o déficit deve fechar o ano em 4,17%, contra 4,42% projetados anteriormente e 4,47% no encerramento de 2014.

De acordo com Maciel, a redução do déficit capta o comportamento do câmbio e o menor crescimento. Variáveis que levaram o BC a reduzir a estimativa de remessas de lucros e dividendos, que caíram de US$ 22,5 bilhões para US$ 21 bilhões. O gasto com viagens internacionais também perde ímpeto, caindo de US$ 16 bilhões para US$ 14,5 bilhões.

O BC manteve a estimativa de balança comercial superavitária em US$ 3 bilhões, mas houve importante mudança na composição, com queda nas importações e exportações projetadas. As vendas externas recuaram de US$ 210 bilhões para US$ 200 bilhões e as importações cederam de US$ 207 bilhões para US$ 197 bilhões.

As novas projeções mostram um quadro de redução do déficit externo em 2015, mas ainda em patamar elevado, de 4,17%, anteriormente associado a crises do balanço de pagamentos. Com a redução do déficit esperado e manutenção do IDP em US$ 80 bilhões ou 4,12% do PIB, a necessidade de financiamento externo projetada para o ano cai de 0,21% do PIB para 0,05% do PIB. Em 2014 a necessidade de financiamento foi de 0,34% do PIB.

Olhando para os dados de maio, o déficit em conta corrente ficou em US$ 3,366 bilhões, abaixo da projeção do BC de US$ 5,4 bilhões. Já o IDP surpreendeu positivamente ao somar US$ 6,608 bilhões, contra projeção de US$ 4 bilhões. Um ingresso de quase US$ 2,5 bilhões no segmento de telecomunicações explica a surpresa positiva.

Dessa forma, pela primeira vez desde agosto do ano passado, o IDP financiou de forma integral o déficit em conta corrente. Esse quadro pode se repetir em junho, caso as projeções do BC de déficit de US$ 3,5 bilhões e IDP de US$ 4 bilhões se concretizem.

O mês contou com US$ 1,946 bilhão em remessa de lucro e dividendos, contra US$ 3,3 bilhões vistos um ano antes. A parcial até dia 18 mostra remessas de US$ 945 milhões. Queda também nos ingressos em carteira que somaram US$ 3,111 bilhões, contra US$ 6,459 bilhões em maio de 2014.. O investimento em ações ficou em US$ 794 milhões e a renda fixa recebeu US$ 1,069 bilhão. Para o ano, o BC espera US$ 15 bilhões para o mercado de ações - a estimativa anterior era de US$ 13 bilhões.

Já a renda fixa deve receber aporte de US$ 26,5 bilhões projeção que foi mantida. Agora em junho até o dia 18, as ações têm entrada líquida de US$ 945 milhões e saída líquida de US$ 62 milhões da renda fixa.

De acordo com Maciel, 70% dos vencimentos previstos de empréstimos e títulos públicos previstos para este ano já foram rolados no período de janeiro a maio deste ano. Segundo ele, a previsão de vencimentos para o ano é de US$ 38 bilhões, sendo que foram rolados US$ 27 bilhões.

No período de janeiro a maio, a taxa de rolagem total ficou em 98%. A projeção é de 100% de rolagem para o ano. Em maio, a taxa foi de 68%, mostrando que as novas contratações não foram suficientes para cobrir todos os pagamentos. Nas parciais de junho, até o dia 18, a taxa total de rolagem é de 91%, sendo que a dos papéis é de 61% e dos empréstimos de 126%.