Aroldo Cedraz pediu vista em processo de interesse da UTC

 

Um pedido de vista conecta o presidente do Tribunal de Contas da União ( TCU), Aroldo Cedraz, ao processo que tratou dos interesses da construtora UTC num contrato de R$ 2 bilhões para obras na usina nuclear Angra 3, em Angra dos Reis ( RJ). Cedraz, em 14 de novembro de 2012, adiou por duas semanas uma decisão a respeito da licitação para as obras. Em delação premiada, o dono da UTC, Ricardo Pessoa, afirmou ter repassado R$ 1 milhão ao filho do ministro, o advogado Tiago Cedraz, para ver atendidos os interesses da construtora no processo envolvendo Angra 3. Além disso, o empreiteiro disse ter feito pagamentos mensais de R$ 50 mil a Tiago para garantir informações privilegiadas do TCU. Duas semanas depois do pedido de vista, em 28 de novembro, o processo retornou à pauta e o resultado foi favorável à UTC.

AILTON DE FREITAS/ 21- 01- 2015Defesa. Cedraz, que preside o TCU: “Prerrogativa de ministro pedir vista de qualquer processo da pauta de votação”

O relator do processo foi o ministro Raimundo Carreiro. Ele discordou da área técnica, que havia sugerido a anulação da fase de pré- seleção das empresas, e manteve a licitação. Naquele momento, dois consórcios já estavam habilitados para a disputa, sendo um deles o UNA 3, formado por Andrade Gutierrez, Odebrecht, Camargo Corrêa e UTC. “Todas as suas empresas integrantes comprovaram capacidade técnica para cinco ou mais itens de cada pacote, exceto a UTC que, no pacote um, limitou- se aos quatro atestados exigidos no edital”, escreveu Carreiro em seu voto. Os ministros seguiram o relator e aprovaram dar continuidade à fase de préqualificação das empresas. Depois de pedir vista duas semanas antes, Aroldo Cedraz apareceu no acórdão como “ministro revisor”. Mas ele se declarou impedido e não votou.

Na última terça- feira, a Polícia Federal cumpriu mandado de busca e apreensão, autorizado pelo Supremo, no apartamento e no escritório de Tiago. Ele é investigado por conta das suspeitas levantadas pelo dono da construtora UTC. Se ficar comprovada a participação de um ministro do TCU nos episódios apurados, um inquérito tramitará no âmbito do STF, por conta do foro privilegiado. Tiago nega ter atuado para a UTC no tribunal, mas admite a prestação de serviços para a construtora.

UTC VENCEU A DISPUTA

O processo em que o pai de Tiago pediu vista, e que ficou sob o poder do ministro por duas semanas, analisou um recurso da Eletrobras Eletronuclear contra medida cautelar que havia suspendido a pré- seleção para o contrato de R$ 2 bilhões em Angra 3. O consórcio integrado pela UTC entrou como parte interessada no processo. A interpretação inicial nos autos foi de que a pré- qualificação das empresas restringiu a competitividade na licitação, o que acabou alterado no curso do processo. O consórcio da UTC, diante da revogação da medida cautelar em 28 de novembro de 2012, venceu a disputa para executar serviços de montagem eletromecânica e fornecimento de equipamentos em Angra 3.

O GLOBO revelou a evolução da clientela, dos negócios, do patrimônio e da atuação político- partidária de Tiago Cedraz desde a chegada do pai ao cargo de ministro do TCU, em 2007 — Aroldo Cedraz assumiu a presidência do órgão somente neste ano. Tiago comprou já em 2009 um lote no Lago Sul por R$ 750 mil — mais de R$ 1 milhão, atualizado o valor — onde ergueu a casa que serve de sede a seu escritório, avaliada em pelo menos R$ 3 milhões. Na Asa Sul, outra área nobre de Brasília, ele comprou dois apartamentos de 247 metros quadrados cada. O primeiro em 2013, por R$ 2,95 milhões. O segundo em 2014, por R$ 2,725 milhões, por meio de empresa administradora de bens registrada em seu nome e no nome da mãe, mulher de Aroldo Cedraz. A empresa tem capital de R$ 20 milhões.

Por meio da assessoria do TCU, o ministro citou o artigo 112 do regimento interno e disse ser “prerrogativa de ministro pedir vista de qualquer processo da pauta de votação, para melhor avaliar os elementos que entender necessário”. Tiago nega as suspeitas na atuação para a UTC, diz não atuar pessoalmente junto ao TCU e defende que o patrimônio está “devidamente declarado e compatível com a atuação destacada do advogado”, segundo a assessoria de imprensa do escritório de advocacia.