Ações da Petrobras caem até 6%, e Bolsa de SP recua 1,42%

O cenário político continua a pesar sobre os negócios nos mercados financeiros no Brasil, com a tensão entre Executivo e Legislativo e a Operação Lava-Jato derrubando as cotações das ações de empresas estatais e, consequentemente, da Bolsa de Valores de São Paulo ( Bovespa). O índice de referência Ibovespa fechou ontem em queda de 1,42%, aos 51.600 pontos, menor patamar desde o fim de março. Já a moeda americana encerrou cotada a R$ 3,204, com leve alta de 0,25% ante o real — mas chegou a registrar a máxima de R$ 3,225.

As ações da Petrobras tiveram forte queda. Os papéis preferenciais ( PN, sem direito a voto) da estatal registraram recuo de 5,35%, cotados a R$ 10,79. Os ordinários ( ON, sem voto) caíram 6,02%, a R$ 11,86. A queda se acentuou após a Polícia Federal indiciar o presidente da Odebrecht, Marcelo Odebrecht, pelos crimes de fraude em licitação e corrupção passiva com base nas investigações da Lava- Jato. Outras sete pessoas também foram indiciadas. Já a Justiça Federal do Paraná condenou três ex- dirigentes da Camargo Corrêa investigados na operação da PF.

— O ambiente não está bom. Além da questão política e da situação da Grécia, as expectativas econômicas continuam ruins, como mostrou o boletim Focus — disse Ari Santos, gerente de renda variável da corretora H. Commcor.

TEMOR DE AÇÃO CONTRA A ELETROBRAS

Apesar da máxima de R$ 3,225, a moeda americana basicamente oscilou entre R$ 3,10 e R$ 3,20. Segundo analistas, é forte a preocupação de que a queda de braço entre o governo e o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha ( PMDB- RJ), dificulte ainda mais a aprovação das medidas de ajuste fiscal. “O pacote de retaliações ao governo deve se estender à CPI da Petrobras, sob controle de um deputado da tropa de choque de Cunha. Nesse cenário de extrema gravidade, não há como pretender calmaria nos mercados locais para os próximos dias e semanas. A pressão sobre o dólar deverá ter continuidade em detrimento do mercado acionário”, afirmou, em relatório, o analista Ricardo Gomes da Silva, da Correparti Corretora de Câmbio.

O ambiente político e a Lava- Jato também contribuíram para a queda de outras ações de estatais. Reportagem do jornal “Valor” mostra que o escritório de advocacia americano Rosen Law Firm prepara uma ação contra a Eletrobras. As ações PN da empresa registraram queda de 1,62%, e as ON, de 2,40%. Já os papéis da Braskem, que tem como sócios controladores a Petrobras e a Odebrecht, recuaram 5,18%.

— O mercado está olhando mais questões internas. Os indicadores estão muito fracos, e ainda há a perspectiva de rebaixamento da nota de crédito ( do país) pela Moody’s — disse Ricardo Zeno, sócio da AZ Investimentos, justificando a maior pressão sobre as empresas estatais.

Os bancos, que têm o maior peso na composição do Ibovespa, também operaram em queda. As ações de Itaú e Bradesco registraram recuo de, respectivamente, 0,60% e 1,81%. Já os papéis do Banco do Brasil perderam 2,52%.

Nos mercados externos, os principais índices fecharam em terreno positivo. Em Nova York, Dow Jones e S& P 500 tiveram a mesma leve alta: 0,08%. O DAX, de Frankfurt, subiu 0,53%, e o CAC 40, de Paris, teve valorização de 0,35%. Em Londres, o FTSE 100 fechou em alta de 0,20%.

— A agenda lá fora está relativamente esvaziada. Adicionalmente, a Grécia volta a viver um período de normalidade bancária, e a China vem com o terceiro pregão de alta diante das ações do governo para conter o pânico no mercado — disse Marco Aurélio Barbosa, estrategista da CM Capital Markets.

 

Crise dificulta reajustes salariais acima da inflação no 2 º semestre

 O agravamento da crise econômica, com a inflação beirando os dois dígitos e desemprego crescente, mudou o discurso das categorias que têm database no segundo semestre deste ano, como metalúrgicos, petroleiros e bancários. A reivindicação de reajustes reais ( acima da inflação), prioridade dos últimos dez anos, poderá ser trocada pela manutenção do emprego, no caso de impasse nas negociações. Sindicalistas também já declaram que a ampliação de cláusulas sociais, que regulam benefícios como vale- refeição e tempo da licença- maternidade, pode virar moeda para fechar acordos.

MICHEL FILHOCautela. O operador de máquinas José Ailton já evita novas prestações

— O movimento sindical terá que ter um cuidado maior com a manutenção do emprego — afirma o diretor- técnico do Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socieconômicos ( Dieese), Clemente Ganz Lúcio.

Para ele, o momento de ajuste econômico fará com que as negociações mudem de estratégia.

— Este ano será igual a 2003, quando as negociações foram afetadas pela economia ruim.

Por conta da alta da inflação e da recessão, Layr Cruz Del Corço, de 47 anos, funcionário do Banco do Brasil, mudou seus hábitos. Ele, que gostava de tomar o café da manhã na padaria, passou a se alimentar em casa.

— Gastava cerca de R$ 10 por dia com o café da manhã. Com a perspectiva de não termos reajuste real, estou economizando nas mínimas coisas — disse.

O presidente da Federação dos Metalúrgicos da CUT ( FEM/ CUT, que só em São Paulo representa cerca de 100 mil trabalhadores), Luiz Carlos da Silva Dias, diz que o objetivo inicial da campanha ( a data- base é em 1 º de setembro) é a busca pela reposição da inflação e aumento real, mas reconhece que o momento exige cautela. Segundo ele, o índice que será, ou não, pedido de aumento real só será definido “no clima das negociações”.

— As cláusulas sociais podem fazer a diferença para os trabalhadores de empresas mais fragilizadas, porque não teriam impacto tão grande — afirmou.

TRABALHADOR EVITA PRESTAÇÕES

A FEM/ CUT elegeu para este ano como bandeira o slogan “Nenhum direito a menos e mais avanços sociais”, apontando para a prioridade na manutenção e ampliação dos empregos e benefícios dos trabalhadores.

Ricardo Patah, presidente da União Geral dos Trabalhadores ( UGT), admite que categorias menos organizadas podem ter melhores resultados se trocarem a reivindicação de aumento real por ganhos sociais. Para os 500 mil comerciários de São Paulo, representados pela UGT, ele espera recuperação do varejo nos próximos. Em 2014, a categoria teve 1,5% de ganho real.

Com 440 sindicatos no país e 3,2 milhões de trabalhadores, a Força Sindical se prepara para negociações “bem difíceis”, diz Miguel Torres, presidente da Central. Mas diz que aumentos acima da inflação serão o mote da campanha salarial.

— Nosso papel é tentar conseguir algo mais além da inflação e dos benefícios sociais — afirma.

É o que espera José Ailton Matos Santana, operador de máquinas de uma multinacional do setor petroquímico, em São Paulo. Casado e pai de dois filhos, Santana já está evitando gastos supérfluos e novas prestações:

— Estou me preparando para enfrentar essa crise e, talvez até o desemprego. Não tenho muita expectativa que essa situação ( da economia) vá melhorar.

 

Analistas apostam em queda de 1,7% do PIB

Depois da divulgação de dados ruins sobre a atividade econômica na semana passada, os analistas do mercado financeiro revisaram suas projeções e já esperam uma retração econômica ainda maior neste ano. A previsão de queda do Produto Interno Bruto ( PIB, conjunto de bens e serviços produzidos pelo país) saltou de 1,5% para 1,7%. E no quadro desenhado pelos especialistas há, ainda, mais inflação em 2015 — embora para o ano que vem as projeções sejam de um recuo dos índices.

Segundo o boletim Focus do Banco Central, apurado semanalmente com os economistas das principais instituições financeiras do país, em 2015 deve ocorrer um reajuste nas tarifas de serviços públicos ainda mais pesado que o previsto anteriormente. A projeção para a alta dos chamados preços administrados chegou a 15%. Até a semana passada, essa estimativa era de 14,9%.

E o aumento tem impacto direto no Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo ( IPCA). A expectativa dos economistas para a inflação oficial deste ano passou de 9,12% para 9,15% — a 14 ª alta consecutiva nas previsões dos analistas, o que coloca a taxa cada vez mais distante do teto da meta de inflação, fixado pelo governo em 6,5%.

Como a inflação não cede, praticamente a totalidade do mercado financeiro espera mais duas altas na taxa básica de juros ( Selic), hoje em 13,75% ao ano. Com isso, os juros chegariam a 14,5% ao ano em dezembro. Na semana que vem, o Comitê de Política Monetária ( Copom) do Banco Central se reúne para decidir os próximos passos da condução da política contra a inflação.

Mas a elevação dos juros está conseguindo reduzir as projeções de inflação para 2016, que caíram de 5,44% para 5,40%. Esse remédio contra a alta de preços, porém, tem um custo alto: a retomada do crescimento econômico deve ser bem mais lenta. Há um mês, a aposta era de um crescimento de 0,7% em 2016. Na semana passada, estava em 0,5%. Agora, é de apenas 0,3%.

MAIS INVESTIMENTO ESTRANGEIRO

Nas projeções dos analistas, porém, alguns números melhoraram. Um exemplo são os investimentos estrangeiros, que entram no país para aumentar a capacidade de produção das fábricas — a estimativa para este ano subiu de US$ 66 bilhões para US$ 66,25 bilhões.

Já a expectativa para a balança comercial também melhorou na esteira da cotação maior da moeda americana: subiu de US$ 5,5 bilhões para US$ 6,4 bilhões em 2015, na quinta alta consecutiva.

Tudo isso ajuda, ainda, a diminuir o rombo das contas externas. A projeção para o déficit nas chamadas transações correntes — resultado de todas as trocas de serviço e do comércio do Brasil com o resto do mundo — caiu de US$ 80,5 bilhões para US$ 80 bilhões.