TSE: maioria vota por manter ação contra eleição de Dilma

 

Em uma sessão com discussões tensas, a maioria dos ministros do Tribunal Superior Eleitoral ( TSE) votou ontem pela reabertura de uma das quatro ações que pedem a cassação do mandato da presidente Dilma Rousseff e de seu vice, Michel Temer. A ação havia sido arquivada em março por decisão da relatora, Maria Thereza de Assis Moura. Diante da análise de um recurso do PSDB, o processo deve ser desarquivado, se os ministros mantiverem suas posições. O julgamento foi suspenso pelo pedido de vista da ministra Luciana Lóssio, e não há previsão de quando será retomado.

O assunto começou a ser debatido semana passada, com os votos dos ministros João Otávio de Noronha e Gilmar Mendes a favor do desarquivamento da ação. O ministro Luiz Fux pediu vista e devolveu o caso ao plenário ontem. Ele também votou pela continuidade das investigações contra a campanha de Dilma, assim como Henrique Neves. Além de Luciana Lóssio, o presidente do tribunal, Dias Toffoli, ainda vai votar. O voto de Maria Thereza pelo arquivamento do processo está mantido.

FUX FAZ PROPOSTA POLÊMICA

O voto de Fux levantou polêmica. Ele sugeriu que as 4 ações que tramitam no tribunal pedindo a cassação dos mandatos de Dilma e Temer sejam unificadas, para evitar que o TSE tome decisões diferentes sobre um mesmo assunto. Para Fux, todos os processos deveriam ser anexados à ação que está sob a relatoria da ministra Maria Thereza. Fux explicou que esse é o único tipo de ação prevista na Constituição com poderes para retirar o mandato de um governante eleito nas urnas:

— A multiplicidade de ações eleitorais por fatos idênticos desafia a racionalidade da sistemática processual. Traz risco de decisões conflitantes.

Noronha, que é corregedor eleitoral, não gostou da sugestão. Ele é relator de duas ações contra Dilma e perderia o posto para Maria Thereza. Segundo Noronha, a manobra poderia beneficiar governantes que quisessem escapar da relatoria do corregedor.

— Muito simples: o ministro João Otávio não é de agrado do governo, da presidente Dilma, do vice-presidente. Faz como? Vamos tirar a competência dele — protestou Noronha.

Fux negou que tenha intenção de tirar poderes do corregedor para beneficiar a presidente. Na avaliação do Planalto, Noronha teria mais simpatia pelo PSDB, o autor da ação contra Dilma. Maria Thereza explicou que votou pelo arquivamento da ação por achar que o PSDB deveria ter apresentado fatos concretos contra a presidente no momento em que ajuizou o processo. Ela rebateu os argumentos de Gilmar Mendes de que há indícios de irregularidade no pagamento, por parte da campanha, a empresas supostamente fantasmas. A ministra lembrou que essas suspeitas foram levantadas depois que o processo já estava no TSE.

O PSDB, autor da ação, argumentou que houve abuso de poder político e poder econômico na campanha de 2014, com uso indevido da cadeia nacional de rádio e TV, manipulação de pesquisas e uso de dinheiro desviado da Petrobras para abastecer o caixa da campanha. Se a ação for mesmo reaberta, Dilma e Temer serão intimados a apresentar defesa e haverá a fase de produção de provas. O ministro Gilmar Mendes pediu para o Ministério Público de São Paulo investigar indícios de irregularidades no pagamento de R$ 1,6 milhão pela campanha de Dilma a uma empresa que foi aberta apenas dois meses antes das eleições de 2014. A suspeita é de que a empresa não tenha prestado os serviços para os quais foi contratada.

Segundo dados da Secretaria de Fazenda de São Paulo ao TSE, a empresa Angela Maria do Nascimento Sorocaba-ME foi aberta em agosto de 2014 e, em um mês, emitiu notas fiscais no valor de R$ 3,7 milhões, sem o pagamento de impostos. Desse total, R$ 1,6 milhão foram emitidos em nome da campanha de Dilma.

De acordo com a investigação, Angela informou ter sido orientada a abrir uma empresa que funcionaria apenas no período eleitoral. Todo o material usado na campanha saiu da fornecedora de material plástico Embalac Indústria e Comércio.

O contador da empresa de Angela, Carlos Carmelo Antunes, é funcionário da Embalac e informou ao órgão que registrou a nova empresa a pedido dos donos da fornecedora de material plástico. O objetivo seria manter o limite de faturamento de R$ 3,6 milhões permitido às empresas que optam pelo sistema Simples Nacional (caso da Embalac). Por isso, as vendas para a campanha foram divididas pelas firmas. Foram emitidas 29 notas para a campanha, pela confecção de placas e faixas.

Localizado pelo GLOBO, Carmelo disse que Angela é ex-empregada doméstica da família dos donos da Embalac e repetiu as explicações dadas aos técnicos da Fazenda. Segundo ele, não houve pagamento de impostos porque os donos da Embalac aguardavam o resultado de um pedido de inclusão da empresa em nome de Angela no Simples Nacional. O pedido foi recusado e, segundo Carmelo, a firma espera ser notificada para pagar os impostos devidos.

Ao GLOBO, a dona da Embalac, Juliana Dini Morello, reconheceu o relacionamento pessoal com Angela e disse ter trabalhado “em parceria” com ela durante a campanha de 2014.

— Todos os serviços foram prestados e todo o material, entregue.

O coordenador jurídico da campanha de Dilma, Flávio Caetano, divulgou uma nota: “A elaboração do material contratado foi auditada pela campanha, e a documentação que comprova a elaboração e entrega do material, auditada pelo TSE. Após rigorosa sindicância, o TSE aprovou as contas por unanimidade”. 

 

‘O sistema político fracassou’, diz FH

 

Ao dizer que os partidos se preocupam mais com verbas do que ideias, o ex-presidente afirmou: “O sistema político fracassou. E fomos todos responsáveis.” -SÃO PAULO E BRASÍLIA- O ex-presidente da República Fernando Henrique Cardoso disse ontem para empresários que a crise enfrentada pelo país é resultado não apenas de decisões tomadas pelo governo federal, mas de um fracasso do sistema político brasileiro. A avaliação foi feita durante sua participação no 18º Fórum de Varejo da América Latina, em São Paulo, segundo o site do “Valor Econômico”:

— Hoje, os partidos estão mais preocupados em repartir verbas e brigar por poder do que em defender ideias. O sistema político brasileiro fracassou, e fomos todos responsáveis. Precisamos mudar esse sistema, já que ele não teve condições de se regenerar.

Segundo o ex-presidente, o governo terá de negociar um pacto com a sociedade para que haja uma retomada de confiança no país.

— Só existem duas saídas para o governo equilibrar as contas: cortar gastos ou gerar crescimento econômico. Neste momento, é necessário cortar gastos — disse FH, acrescentando que o fim da crise depende de uma reforma política.

O ex-presidente também afirmou que o cenário político terá mais dificuldades que a área econômica nos próximos meses:

— A economia tem seu próprio ciclo. Ela passa por ajustes de produtividade agora, mas tem seu ciclo de saída e recuperação. A política é diferente, não existirá um novo ciclo se ele não for criado. Nos próximos meses, vamos assistir a uma grande instabilidade política.

Uma falta de consenso interno levou o PSDB a decidir que não vai liderar um movimento próimpeachment da presidente Dilma. A posição foi comunicada pelo senador Aloysio Nunes Ferreira a deputados da sigla em São Paulo, durante reunião realizada anteontem na Assembleia Legislativa do estado. Aloysio explicou que, se um processo para afastar Dilma for aberto no Congresso, o PSDB irá apoiá-lo. Mas, não partirá do PSDB um pedido de impeachment da presidente.

No encontro, Aloysio explicou que o PSDB precisa agir com cautela para evitar que tenha sua imagem arranhada em um momento político tão delicado. Tucanos avaliam que um rótulo de articulador da derrubada de Dilma prejudicaria os planos do partido de retornar ao Planalto.

DISCURSO UNIFICADO

Aloysio tomou como exemplo a inexistência de um consenso na bancada de São Paulo para explicar que a situação é semelhante a nível nacional. Ele destacou que, diante da falta de unidade, não há condições internas para que o PSDB dê início a um processo para tentar tirar Dilma do poder.

A cautela pregada por Aloysio é mais um resultado da reunião realizada na semana passada entre Fernando Henrique, o senador Aécio Neves e o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, cujo objetivo foi unificar o discurso único no PSDB em tempos de crise política. Um dia após o encontro, Alckmin e Aécio foram a público defender a tese de que é preciso esperar as investigações contra a presidente Dilma nos tribunais Superior Eleitoral e de Contas da União para o partido se posicionar em relação a um eventual impeachment. Até então, lideranças tucanas estavam se manifestando isoladamente.

Presidente do PSDB, Aécio admitiu ontem que há divergências sobre o melhor caminho a seguir, e que conversas com setores do PMDB e outros partidos só deverão evoluir depois de desdobramentos da Lava-Jato:

— Acreditamos que haverá desdobramentos graves na LavaJato que podem impactar nessa posição. O TSE está retomando o julgamento das contas (da campanha eleitoral de Dilma), tem o o ministro Teori Zavaski (do Supremo) decidindo se libera o conteúdo da delação premiada do empresário Ricardo Pessoa para ser anexado na ação que pede a impugnação da chapa... Por enquanto, estamos conversando.

O PSDB e partidos aliados argumentam que a formulação de um pedido de impeachment depende de condições jurídicas e políticas. Eles dizem que, na ponta do lápis, não chega a 200 o número de deputados que votariam pelo afastamento de Dilma.