Indústria surpreende e cresce 0,6% em maio

03/07/2015

Por Arícia Martins e Robson Sales | De São Paulo e do Rio

A expansão de 0,6% da produção industrial entre abril e maio, feitos os ajustes sazonais, interrompeu uma sequência de três recuos nessa comparação e surpreendeu o mercado, mas não trouxe elementos que permitam concluir que a crise do setor se estabilizou. Segundo economistas, o volume ainda elevado de estoques no segmento de bens duráveis, a confiança do empresariado em queda livre e a redução no uso da capacidade instalada indicam que a produção voltou a encolher no mês passado e, diante das expectativas em nível deprimido, o cenário para o segundo semestre é pouco animador.

Apesar da expansão na passagem mensal, a Pesquisa Industrial Mensal - Produção Física (PIM-PF), divulgada ontem pelo IBGE, ainda teve predominância de resultados negativos, de acordo com avaliação do próprio órgão. Com o dado de maio, a produção encontra-se em nível 11,7% abaixo do pico registrado em junho de 2013. Sobre maio de 2014, o tombo na atividade industrial foi de 8,8%, 15ª retração consecutiva nessa ordem.

Mesmo na comparação com abril, a alta de 0,6% foi pouco disseminada: entre as quatro categorias de uso, apenas a de bens semi e não duráveis e bens de capital cresceram. Nos ramos de atividade, houve aumento em 14 dos 24 segmentos pesquisados. Boa parte do avanço mensal foi influenciada por bens semi e não duráveis, que representam 25% da indústria total e expandiram sua produção em 1,2%, depois de sete quedas seguidas.

As principais influências positivas partiram das atividades de outros equipamentos de transporte (8,9%); coque, produtos derivados do petróleo e biocombustíveis (1,1%); e perfumaria, sabões, detergentes e produtos de limpeza (1,9%). Dentro dos bens semi e não duráveis, bebidas, vestuário e perfumaria foram os segmentos que mais contribuíram.

Para André Macedo, gerente de coordenação da indústria do IBGE, os números positivos foram mais influenciados por um ajuste na produção e por efeitos estatísticos do que por uma real melhora da indústria. "Esses setores poderiam estar com estoques altos nos meses anteriores. A indústria vem num ritmo de produção mais lento porque a demanda é insuficiente", disse Macedo, para quem o avanço da produção no quinto mês do ano representa uma exceção.

A mesma análise é feita pelo economista Júlio Gomes de Almeida, professor da Unicamp e ex-secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda. Segundo Almeida, o crescimento da atividade de bens semi e não duráveis foi provocado por um movimento de recomposição de estoques nas fábricas. "Se foi isso, é um crescimento não sustentável, não ocorreu porque a demanda cresceu de forma sólida."

O professor aponta para os segmentos de bebidas e produtos farmacêuticos, que até o mês passado acumulavam perda de -6,7% e 18,5% no primeiro quadrimestre ante igual período de 2014, respectivamente. Ambos cresceram em maio, mas apenas reduziram as perdas dos meses anteriores, avalia Almeida. "Os empresários não têm bola de cristal, não conseguem antecipar qual vai ser o declínio. Eles reduziram tanto a produção, em alguns segmentos, que agora foram obrigados a recompor o estoque e isso levou a esse crescimento", afirmou.

Em análise sobre os resultados de maio, o Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi) apontou que o prosseguimento do comportamento positivo da produção de bens semi e não duráveis encontrará um "sério obstáculo" nos próximos meses: os ajustes para baixo que estão ocorrendo no mercado de trabalho brasileiro, "isto é, no nível de emprego e na massa de rendimento real, que são a base do consumo desses bens."

Flávio Castelo Branco, gerente-executivo de Políticas Econômicas da Confederação Nacional da Indústria (CNI), também viu com cautela o aumento da produção. A alta de maio, diz Castelo Branco, é um dado positivo, mas não representa uma garantia de retomada. "Esse dado precisa se confirmar nos próximos meses para que possamos falar em retomada", assim como seu palpite de que a combinação do câmbio mais desvalorizado com o mercado doméstico fraco possa estar surtindo efeito positivo sobre as exportações.

Os dados já disponíveis para junho reforçam a avaliação de que a alta da indústria no mês anterior não se sustenta. Ignacio Rey, da Guide Investimentos, estima de forma preliminar que a produção diminuiu cerca de 1% no mês passado, com base principalmente na retração do nível de utilização da capacidade instalada da indústria, que, segundo a FGV, caiu 0,8 ponto percentual entre maio e junho, para 78,2%, menor patamar desde abril de 2009 (78%).

"Isso se soma a uma série de notícias negativas concentradas nas montadoras e nas empresas de varejo. Os últimos dados têm nos surpreendido negativamente, e a produção de maio foi uma exceção", comentou. Passado o primeiro semestre, a tendência é que a indústria siga em trajetória negativa no restante de 2015, avalia Rey, devido à retração adicional dos índices de confiança e, também, ao ciclo de aperto monetário ainda em curso, que foi além do esperado.

Para a equipe econômica do Bradesco, a indústria ainda tem desafios relevantes a enfrentar, devidos a estoques elevados e pressões de custos. "Tanto a contração de 1,7% da economia brasileira quanto a de 4% para a produção industrial, esperadas para 2015, já podem ser consideradas ligeiramente otimistas", diz, em relatório, o time de economistas chefiado por Octavio de Barros. (Colaborou Daniel Buarque, de São Paulo)

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Nível de emprego do setor deve cair 4,1% este ano, prevê CNI

Por Fábio Pupo e Lucas Marchesini | De Brasília

A indústria brasileira registrou em maio o segundo mês de queda significativa no nível de emprego. Mantido o ritmo anual, o ano deve fechar com diminuição de 4,1% nos postos de trabalho em relação a 2014, segundo a Confederação Nacional da Indústria (CNI). Em maio, o nível de emprego do setor recuou 0,9% ante abril, quando caiu 1,2%, de acordo com a pesquisa Indicadores Industriais. Em fevereiro e março também houve recuo, embora menos expressivo - 0,5% e 0,6%, respectivamente.

Para a CNI, as sucessivas quedas na atividade industrial atingiram em cheio o mercado de trabalho. "A economia está claramente em recessão e os empregos estão sendo afetados", resume Flavio Castelo Branco, gerente-executivo de politica econômica do CNI.

"Vimos quedas bastante significativas nos últimos dois meses, o que levou a um resultado no acumulado de 2015 bastante negativo. Para que não terminar o ano com mais demissões que contratações, seria necessária uma grande inflexão no gráfico [de emprego], o que a conjuntura atual sugere como algo de baixa probabilidade", afirma Fábio Guerra, economista da CNI.

As horas trabalhadas seguiram a mesma trajetória que o emprego. A redução foi de 0,5% em maio ante abril e de 10,2% na comparação com o mesmo mês de 2014. No ano, a retração acumulada é de 9,3%. "O atual nível das horas trabalhadas já é inferior ao de 2008 e de 2009", diz Guerra.

Os indicadores de renda também caíram em maio, com um decréscimo de 1,2% na massa salarial real e de 0,3% no rendimento médio real. Em ambos os casos, a comparação é de maio frente a abril e são corrigidos pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC).

A única boa notícia da divulgação foi o crescimento de 1,6% no faturamento real da indústria em maio frente a abril. Mas apesar da alta, ela não foi suficiente para compensar o desempenho nos cinco primeiros meses, que é negativo em 7,3%. "A alta do mês de maio no faturamento não é forte o suficiente para caracterizar recuperação. Não compensa nem a queda de abril, por isso nível do faturamento segue bastante baixo", avalia Guerra.

Castelo Branco vê na questão fiscal um fator que pode promover um melhor ambiente para a recuperação da economia, mas chama atenção para ações recentes do Legislativo. Ele considera "preocupante que medidas discutidas no Congresso sinalizem mais gastos, seja com a aprovação de aumentos de servidores públicos, ou com a vinculação de benefícios previdenciários ao salário mínimo".

Segundo o economista, "esse quadro não favorece a atividade econômica e sinaliza para um período bastante difícil no segundo semestre de 2015. Se arrumarmos bem as contas e sinalizarmos que serão mais favoráveis no futuro, creio que haverá recuperação".