Avanço da crise obriga Dilma a negociar reforma ministerial com PMDB e PT

 

Pressionada por partidos da base aliada e com a nova queda de popularidade detectada em pesquisas de opinião, a presidente Dilma Rousseff começou ontem negociações para uma reforma ministerial. Depois da derrota sofrida na madrugada, quando a Câmara desafiou novamente o Palácio do Planalto e aprovou a proposta de reajuste nos salários de advogados públicos e de outras carreiras, Dilma decidiu reforçar a articulação política do governo.

O formato da reforma ainda não havia sido definido até ontem à noite, mas ministros dão como certo que haverá rearranjos no PMDB do vice-presidente Michel Temer, hoje o articulador do Planalto com o Congresso. Além disso, PDT e PTB, que anunciaram independência em relação ao governo, devem entrar na dança das cadeiras da Esplanada.

O presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), se reuniu com Dilma na noite de ontem, no Planalto. Com as ameaças de impeachment no cenário político, Dilma ficou apreensiva ao saber que Renan participou de jantar com políticos do PMDB e do PSDB na casa do senador tucano Tasso Jereissati (CE), na terça-feira.

 

A presidente Dilma

A presidente Dilma

Desde que o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), rompeu com o governo, a vida da presidente virou um inferno. Agora, ela depende de Renan para barrar, no Senado, um possível processo pedindo o seu afastamento do cargo.

A expectativa de ministros é de que a ala do PMDB no Senado ganhe mais peso na equipe. A aliados, Renan diz que não basta uma reforma ministerial e prega uma “refundação” do governo para zerar o jogo. O discurso do presidente do Senado – que, a exemplo de Cunha, está sendo investigado na Operação Lava Jato – vai na linha de que Dilma precisa fazer um mea-culpa, cortar cargos, revisar contratos, anunciar medidas para aquecer economia e mudar o relacionamento com a base, se quiser se salvar.

Cargos. O PMDB tem hoje sete ministérios, mas uma fatia do partido diz que aceita abrir mão de cargos na reforma desde que o PT faça o mesmo. A Casa Civil está produzindo um estudo de reforma administrativa, para reduzir o número de ministérios – hoje são 39. Mas uma ala do governo acha difícil enxugar a máquina no turbilhão da crise, quando Dilma precisa agradar à base aliada, numa reedição do tradicional toma lá dá cá.

Dilma passou o dia em reuniões com ministros. Distribuiu broncas e mostrou preocupação com o agravamento da crise, vocalizada de forma contundente, na véspera, por Temer. Aos ministros mais próximos do PT, ela pediu ajuda e afirmou que todos “lavaram as mãos” depois que o vice assumiu a articulação política.

Mais cedo, Dilma conversou com Temer. Ela não gostou da entrevista do vice no dia anterior – ele afirmou que o Brasil precisa que alguém “tenha a capacidade de reunificar a todos”. Na manhã de ontem, o vice fez questão de destacar que Dilma promoveu “um trabalho excepcional”. Apesar do discurso otimista ao público externo, o governo avalia que a crise vai piorar, pois está convencido de que o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, oferecerá denúncia contra Cunha no Supremo.

 

Presidente cobra engajamento de ministros petistas

A presidente Dilma Rousseff convocou os ministros do PT mais próximos para cobrar envolvimento maior na articulação política do governo e para exigir que esses auxiliares “deem o exemplo”. O recado, de acordo com um dos presentes na reunião, foi claro: “Ou os ministros se envolvem ou ficará ainda mais difícil”.

A presidente relatou aos ministros petistas as reclamações de parlamentares de que eles não têm recebido para audiências “nem os parlamentares das suas bancadas”, o que acaba sobrecarregando o articulador político do Planalto, o vice-presidente Michel Temer.

Na avaliação do governo, as declarações em tom “visivelmente emocionado” de Temer na véspera refletiram sua “preocupação com o quadro” político brasileiro. Em entrevista na quarta-feira, após reunião com líderes de partidos aliados, Temer disse aos jornalistas que era preciso alguém que “unifique” o País, para evitar “uma crise desagradável”.

Dilma chamou seus auxiliares ao Palácio da Alvorada no início da tarde, pouco depois de reunir-se com Temer e com o ministro da Aviação Civil, Eliseu Padilha, braço direito do vice-presidente nas negociações políticas. Temer afirmou a Dilma que a sensação é de que seu papel tem sido em vão com o atual cenário. Segundo um interlocutor, “você conversa com os líderes, vira as costas e tudo que foi conversado se desfaz”.

 

A presidente Dilma Rousseff (PT)

A presidente Dilma Rousseff (PT)

Estiveram presentes na reunião com a presidente os ministros José Eduardo Cardozo (Justiça), Aloizio Mercadante (Casa Civil), Jaques Wagner (Defesa), Edinho Silva (Comunicação Social) e Ricardo Berzoini (Comunicações). A avaliação foi de que, em função das dificuldades econômicas e das investigações da Operação Lava Jato sobre vários políticos, a única saída para melhorar a situação é o envolvimento desse núcleo duro nas negociações com o Congresso.

Na conversa, Dilma cobrou essa participação ativa dos petistas e disse que Temer está “sobrecarregado” na tarefa de dialogar com os parlamentares. A presidente elogiou a atuação de Temer e de Padilha na articulação política do governo, segundo um ministro presente ao encontro.

PEC. Para o governo, a derrota sofrida na madrugada de ontem na Câmara dos Deputados, durante a votação do reajuste dos advogados públicos, reflete um cenário de “descontentamento generalizado” entre os parlamentares. A Casa aprovou ontem, em primeiro turno, uma proposta de emenda constitucional (PEC) que vincula o salário de delegados de polícia e de advogados públicos a um porcentual do salário de ministros do Supremo Tribunal Federal, teto do funcionalismo público. A votação, de 415 votos favoráveis e 16 contrários, foi vista como dura derrota do governo, que enfrenta um momento de ajuste fiscal.

 

Tucanos pedem novas eleições e Alckmin homenageia Temer

 

Lideranças do PSDB no Congresso próximas ao presidente do partido, senador Aécio Neves (MG), afirmaram nesta quinta-feira, 6, que a melhor saída para a crise política é a realização de novas eleições, e não apenas o impeachment da presidente Dilma Rousseff. A posição, porém, não é consensual na sigla porque envolve interesses de outros presidenciáveis. Os grupos do governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, e do senador José Serra (SP) são contrários a essa tese.

“Precisamos, sim, de alguém que una a Nação, e esse alguém só surgirá legitimado pelas urnas”, defendeu o líder do PSDB no Senado, Cássio Cunha Lima (PB). As declarações foram dadas após a revelação de que tucanos e peemedebistas discutiram, durante um jantar, os prós e os contras de um eventual processo para afastar Dilma.

 

Jantar oferecido pela bancada do PSDB de Santa Catarina aos demais senadores do partido, na terça feira, dia 4, em Brasília

Jantar oferecido pela bancada do PSDB de Santa Catarina aos demais senadores do partido, na terça feira, dia 4, em Brasília

A tese das novas eleições é defendida pelos líderes do partido no Congresso e atende aos interesses do senador Aécio Neves, segundo colocado na disputa ao Planalto do ano passado. Uma nova eleição ainda neste ano beneficiaria Aécio, primeiro colocado neste momento em pesquisas de intenção de voto.

O PSDB pressiona o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) a impugnar a chapa eleitoral da presidente Dilma Rousseff e de seu vice, Michel Temer. Se isso ocorrer, ambos ficariam impedidos de assumir a Presidência.

“Concordamos com Michel Temer sobre a necessidade de encontrar alguém capaz de unir o País para sair da crise e ao mesmo tempo também tenho o convencimento da necessidade de que isso só se constrói através de eleições diretas”, afirmou Cássio Cunha Lima. 

Tanto Cunha Lima quanto o líder tucano na Câmara, Carlos Sampaio (SP), refutaram a tese de aliados do governo de que pedir uma nova eleição era um movimento golpista da oposição. Disseram que estavam na “expectativa” da decisão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), que investiga irregularidades nas contas da campanha petista que podem resultar até mesmo na cassação do mandato de Dilma. A previsão é que o caso seja julgado até outubro.

Paulistas. Os grupos em torno de Geraldo Alckmin e de José Serra, no entanto, não têm mostrado entusiasmo em abraçar a causa das novas eleições. “Cada um tem uma ideia na cabeça, mas não há nada decidido no partido em termos coletivos. Não é o momento de tomar essa decisão”, disse o ex-governador Alberto Goldman.

Temer foi homenageado ontem à tarde por Alckmin em um evento no Palácio dos Bandeirantes que celebrou os 30 anos da Delegacia da Mulher. “Michel Temer tem a grandeza dos grandes homens, que defendem o interesse público e o bem comum”, disse o governador. Temer retribuiu dizendo que Alckmin “tem uma educação cívica extraordinária” e uma “capacidade agregadora que esta acima dos acontecimentos”.