Juiz condena Cerveró e lobista ligado ao PMDB

 

A Justiça Federal do Paraná condenou nesta segunda-feira, 17, o ex-diretor Internacional da Petrobrás Nestor Cerveró, os lobistas Fernando Baiano Soares, ligado ao PMDB, e Julio Camargo, delator que acusou o presidente da Câmara, deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) de pressioná-lo por uma propina de US$ 5 milhões, em 2011. Cunha não é réu na ação. Ele detém foro privilegiado perante o Supremo Tribunal Federal (STF) e está sob investigação da Procuradoria-Geral da República.

Moro comunicou sua decisão condenatória ao ministro Teori Zavascki, relator da Lava Jato no Supremo. O juiz tomou essa medida para rechaçar a investida das defesas de Cerveró e Baiano, que tentaram puxar o processo para a Corte máxima, sob alegação de que no processo sob a sua guarda houve a citação ao parlamentar.

O contrato teria sido obtido mediante o oferecimento de propina de US$ 15 milhões à diretoria da Área Internacional da Petrobrás, ocupada na época por Nestor Cerveró, com a intermediação de Fernando Baiano.

Baiano, apontado como braço do PMDB no esquema de corrupção que se instalou na Petrobrás entre 2004 e 2014, pegou 16 anos, um mês e dez dias de reclusão.

Alberto Youssef presta depoimento na CPI da Petrobrás. Foto: Félix R./Futura Press

Alberto Youssef foi absolvido no processo. Foto: Félix R./Futura Press

Julio Camargo, o delator, foi condenado a 14 anos de reclusão, mas beneficiado pela colaboração prestada à Lava Jato, teve sua pena reduzida para cindo anos em regime aberto. Terá de cumprir as seguintes condições: “prestação mensal de trinta horas de serviços comunitários a entidade pública ou assistencial; apresentação bimestral de relatórios de atividades; comunicação e justificação ao Juízo de qualquer viagem internacional nesse período.”

Alberto Youssef, um dos delatores da Lava Jato, foi absolvido do crime de lavagem de dinheiro “por falta de prova suficiente de que as operações de lavagem a ele imputadas na denúncia dizem respeito à propina dos contratos de fornecimento dos navios-sondas, enquanto as por ele confessadas não estão descritas na denúncia”.

Na decisão, o juiz Sérgio Moro afirmou que ficou comprovado o pagamento de R$ 54.517.205,85 em propina sobre contrato de dois navios-sonda da Petrobrás a Cerveró e a Baiano. Ambos estão presos preventivamente em Curitiba, base da Lava Jato.

COM A PALAVRA, EDSON RIBEIRO, ADVOGADO DE NESTOR CERVERÓ

“Vindo do juiz que é já era esperado. Vou recorrer e vou até o fim. O que não falta, não só nesta ação, como na anterior, são várias nulidades. A outra já recorri e estou apresentado as razões de apelação. Enquanto eu for advogado de Nestor Cerveró, não haverá delação premiada. Não tenho nada contra, mas eu sou contra a utilização de prisões preventivas para a obtenção de delação. É um método antidemocrático.”

COM A PALAVRA, O CRIMINALISTA NÉLIO MACHADO, DEFENSOR DE FERNANDO BAIANO

O criminalista Nélio Machado, que defende Fernando Baiano Soares, disse que seu cliente recebeu uma pena ‘absolutamente demasiada, despropositada diante das tradições do Direito penal brasileiro’.

Fernando Baiano, suposto braço do PMDB na Petrobrás, pegou 16 anos, um mês e dez dias de reclusão em ação movida pelo Ministério Público Federal que lhe atribui corrupção e lavagem de dinheiro.

A sentença é do juiz Sérgio Moro, que carrega a Operação Lava Jato.

“Curiosamente, essa sentença sai diante de um habeas corpus por nós impetrado que, tudo leva a crer, poderá ser julgado amanhã (terça, 18) pelo Supremo Tribunal Federal”, disse o advogado. “Parece que existe uma escolha de dia específico para, de algum modo, abalar a espontaneidade do julgamento na mais alta Corte. Estou falando do Supremo. Não acredito que o Supremo irá se impressionar com uma sentença que poderia ter saído na semana passada.”

Nélio Machado avalia que a sentença ‘não tem base em prova nenhuma’. Ele ataca o que chama de ‘indústria’ da delação premiada no âmbito da Lava Jato. “Um dia vamos ter que rever esse critério de delação premiada. Há alguma coisa anômala. A quantidade de pessoas que fez delação neste caso premiada é incomum. O devido processo legal está acabando no Brasil.”

O criminalista destaca que, durante a instrução da ação penal que culminou na condenação de Fernando Baiano, também do ex-diretor da Petrobrás Nestor Cerveró (Internacional) e do delator Julio Camargo, tentou que fossem ouvidas testemunhas no exterior que reputa importantes para a defesa – executivos de duas multinacionais -, mas não obteve êxito.

“O juiz (Sérgio Moro) disse que o objetivo da defesa era procrastinar a ação. Eu queria ouvir essas testemunhas lá fora.”

Machado afirma que o delator Julio Camargo ‘não fala em propina em nenhum momento’.

“O juiz vai no caminho da presunção”, diz o advogado. “A defesa está cerceada, o juiz não tem nenhuma isenção para julgar meu cliente que está numa situação de desespero, sob forte pressão. Minha atuação é radicalmente contra a delação premiada. O Fernando anda fustigado (para fazer delação), a família em desespero. Mas eu digo uma coisa: se meu cliente fizer delação eu estou fora deste processo. Enquanto tiver forças e oxigênio para respirar vou continuar acreditando que existe Constituição nessa República.”

“O juiz interpreta a Constituição de uma maneira desgarantidora. O princípio posto no artigo 5.º da Constituição é em favor da defesa, não em desfavor.”

Nélio Machado diz que ‘sua luta’ pela liberdade de Fernando Baiano vem pelo menos de dezembro do ano passado. “O julgamento no Supremo está tramitando há quase nove meses e o juiz de Curitiba sentencia a causa em menos de seis meses? Isso não é uma prestação jurisdicional, é uma espécie de devassa. A sentença é aligeirada. No fundo o próprio juiz usa uma espécie de carimbo ao dizer que a condenação não está vinculada ao acordo de delação. Ora, não precisa nem de julgamento. Faz o acordo e carimba. Para que perder tempo na Justiça? O juiz entende que o exercício do direito de defesa é uma afronta, ele presume a culpa, não presume a inocência.”

Nélio Machado insiste na versão de que a Lava Jato prende para forçar delações premiadas. “Essa metodologia da prisão como forma de alcançar delação premiada é um absurdo. Quem faz delação sai (da prisão), quem não faz não sai. Essa é a verdade. Se a advocacia se transformar nisso de aceitar a delação como uma rotina vou repensar minha profissão. É um retrocesso. Alguém já disse que o herói deveria ser o Joaquim Silvério dos Reis, não o Tiradentes. As regras do devido processo legal, até mesmo em casos de estupro, têm que ser observadas.”

O criminalista buscou na Revolução Francesa inspiração para sua tese. “Malhesherbe, advogado de defesa de Luís XVI (executado em 1793), disse: ‘Me reservem a guilhotina depois, mas não vou abdicar do direito de defesa’.”

 

Depoimento vincula outro ex-tesoureiro do PT a propina

 

O ex-tesoureiro do PT Paulo Ferreira disse que a rotina dos secretários de Finanças de todos os partidos é buscar doações nas empresas “que tradicionalmente doam”. “Você abre uma conta e deposita o recurso que vai ser utilizado no gasto de campanha”, disse Ferreira, que teve seu nome citado no depoimento do empreiteiro Gérson de Mello Almada à Justiça Federal na terça feira, 17.

Paulo Ferreira. Foto: TSE

Paulo Ferreira. Foto: TSE

Almada, preso na Operação Lava Jato – histórica investigação sobre desvios e fraudes na Petrobrás – apontou o nome de Ferreira no trecho de seu relato em que abordou o pagamento de propinas ao PT em forma de doação eleitoral. Ele disse que ‘ajustava as doações’ com João Vaccari Neto, atual tesoureiro do partido. “E antes com Paulo Pereira”, declarou o empresário, referindo-se a Paulo Ferreira.

O depoimento de Gérson Almada, gravado em vídeo, está inserido nos autos da Lava Jato. Desde 2003 na Executiva nacional do partido, Paulo Ferreira assumiu a tesouraria do PT em 2005, substituindo Delúbio Soares, condenado no processo do Mensalão por corrupção e quadrilha. Ferreira permaneceu no posto de secretário de Finanças até 2010, quando chegou João Vaccari Neto, agora denunciado pela força tarefa da Lava Jato por corrupção e lavagem de dinheiro.

Em entrevista à reportagem do Estadão, Paulo Ferreira disse que “como a campanha é cara, as pessoas buscam contribuição de pessoa jurídica”. “Não é nada de atípico”, afirma o ex-tesoureiro do PT.

ESTADÃO: Como era sua atividade de tesoureiro do PT?

PAULO FERREIRA: Como todos os secretários de finanças de todos os partidos. Como você acha que entram recursos nos caixas dos partidos? Os secretários vão às empresas que tradicionalmente doam, isso é histórico o Brasil. Você pega aí as eleições desde a década de 90, tem a contribuição formal de pessoa jurídica. Como a campanha é cara, as pessoas buscam aquilo que está na lei: contribuição de pessoa jurídica. Não é nada de atípico, nada de anormal. Acontece em campanha de vereador, em campanha de deputado, em campanha de prefeito, em campanha de senador, de presidente da República. Você abre uma conta e deposita o recurso que vai ser utilizado no gasto de campanha. Cada vez estão mais caros. É isso que houve.

ESTADÃO: O sr. conhece o empresário Gérson Almada, da Engevix? Ele declarou à Justiça Federal que entregava dinheiro para João Vaccari e antes para o sr. O sr. nega isso?

PAULO FERREIRA: (Conheci) Na função de secretario de finanças. como conheci dezenas de outros. Tem que ir lá, marcar com a secretária. Entra no prédio, registra e faz a conversa.

ESTADÃO: Como o sr. acompanha a situação de João Vaccari?

PAULO FERREIRA: Ele tem se defendido e tem tido um comportamento absolutamente correto. As contribuições que o PT recebeu são contribuições formais, estipuladas pela legislação brasileira. O PT recebeu, o PSDB recebeu, o PMDB recebeu, o PSB recebeu, todos os partidos que participam do processo eleitoral receberam. Se essa é a tese, todos eles (partidos) estão criminalizados, que é a tese de parte dos procuradores.

ESTADÃO: O sr. recebeu propinas de empreiteiras em nome do PT?

PAULO FERREIRA: A pergunta está errada. O que passou no vídeo (do depoimento de Gérson Almada)? Ele disse o seguinte: ele pagava propina, pedágio na Petrobrás, e as doações ao PT, ao ser inquirido pelo promotor que estava ali (em audiência na Justiça Federal), não tinha vinculação com obras. Essa é a fala dele. Eu sugeri, inclusive, que a fala dele seja incorporada numa futura defesa do PT. O resto é ilação ou má-fé. Não tem vinculação de doação ao partido. Lá, quando eu era secretário de finanças e, posteriormente, quando entrou João Vaccari. Essa é a frase e essa que vai para os autos. Se alguém quiser colocar no processo, ela está ali para todo mundo ver e olhar.

ESTADÃO: O juiz Sérgio Moro perguntou ao empreiteiro com quem ele ajustava ‘doações’ ao PT. Ele respondeu:’João Vaccari e antes o Paulo Pereira’.

PAULO FERREIRA: Sou eu. Como faz tanto tempo, acho que ele errou. Isso foi em 2008, 2009. São os dois anos que estão sendo investigados. Nesses dois anos, eu falei com o Gérson e pedi contribuição ao PT, que é isso que todo secretário de finanças faz. Para quê? Para ajudar a financiar as atividades partidárias ou para pagar dívida, etc.

ESTADÃO: Por que o sr. deixou a função?

PAULO FERREIRA: O estatuto do PT não permite a permanência por mais de 3 mandatos de uma mesma pessoa em um mesmo cargo.

ESTADÃO: Quanto o sr. conseguiu arrecadar para seu partido?

PAULO FERREIRA: Eu poderia ver para ti. Eu tenho aqui uma informação de quanto a Engevix doou em 2008 e 2009. Em 2008, ela doou fantásticos R$ 100 mil. Em 2009, fantásticos R$ 200 mil. Esse é o resultado do meu trabalho com a Engevix e o Gérson Almada.

ESTADÃO: O sr. mantinha contatos com que tipo de doador?

PAULO FERREIRA: Hoje quem sustenta as campanhas dos candidatos do Acre ao Rio Grande do Sul é a pessoa jurídica, é o banqueiro, o incorporador, é o dono de serviços. São esses que tradicionalmente financiam. Não ha anormalidade alguma em qualquer campanha eleitoral, as doações são absolutamente proporcionais ao tamanho dos partidos. PT, PMDB, PSDB, PSB, PR, todos os partidos recorrem as contribuições de pessoas jurídicas. É assim que a lei manda fazer. Você tem que pagar avião, você tem que pagar papel, equipe, pesquisa, televisão, tem que pagar tudo. E é caro. Todo secretario de Finanças faz abordagens para sustentar e financiar sua campanha.

ESTADÃO: Com quais empreiteiras o sr. conversou?

PAULO FERREIRA: Praticamente com todas as empresas que tradicionalmente doam a todos os partidos.

ESTADÃO: Quais são?

PAULO FERREIRA: Todas elas. Pega ai Andrade Gutierrez, Odebrecht, OAS, Camargo Corrêa, Mendes Junior, Galvão. Todas as empresas grandes do País no setor de infraestrutura tradicionalmente doam. Como o setor financeiro doa para todo mundo. Itaú, Bradesco, Santander, todo mundo doa para todo mundo. Como a área de serviços, todos doam. Isso aí está tudo registrado no Tribunal Superior Eleitoral. Não tem atipicidade, anormalidade, está tudo dentro da legalidade. É isso que manda a lei e é isso que os partidos fazem.

ESTADÃO: Como o tesoureiro negocia doações?

PAULO FERREIRA: A campanha sai cara, eu tenho que pagar avião, equipe, pesquisa, papel. Se eu quiser colocar um anúncio no Estado de São Paulo, eu tenho que pagar o anúncio. As empresas não colocam de graça. Quanto a sua empresa destinou ao ano para contribuição eleitoral? Nos anos eleitorais, isso ja é tradicional, elas fixam lá, por lei eu tenho 2% do faturamento que eu posso destinar às campanhas eleitorais. As empresas colocam lá, apresentam aos conselhos em janeiro, fevereiro. olha, vou doar R$ 5 milhões, R$ 10 milhões, R$ 100 milhões. E os partidos acessam isso de acordo com a agenda de cada um.

ESTADÃO: O sr. recebeu propinas de empreiteiras em nome do PT?

PAULO FERREIRA: Essa pergunta é ofensiva demais e descaracterizada da sua função. A mesma coisa que eu perguntasse se você recebeu propina para colocar matéria em alguma matéria sua. Tu recebeu para fazer matéria contra alguém? Nesse assunto da Lava Jato os partidos entram secundariamente. Esse assunto de corrupção envolve gestores da Petrobrás e alguns empresários, vide as devoluções que os diretores e ex-diretores da Petrobrás que disseram que receberam propina estão fazendo.