Dilma chama Temer para discutir adendo ao Orçamento

Andrea Jubé 

03/09/2015

A presidente Dilma Rousseff confirmou ontem que o governo encaminhará ao Congresso um adendo ao Orçamento da União de 2016, não descartou o envio de uma nova CPMF e fez um desagravo enfático ao ministro da Fazenda, Joaquim Levy. Ela disse que o governo não se furtará à responsabilidade sobre o Orçamento, rebatendo críticas de que transferiu o ônus do corte de gastos ao Legislativo. Mas alertou parlamentares ao dizer que não é hora de "inventar despesas". Para completar, entrou em uma polêmica sem a qual poderia ter passado: o Uber.

Dilma convocou uma reunião com o vice-presidente Michel Temer e ministros no domingo para discutir a emenda ao Orçamento. Após as declarações, Dilma almoçou com Temer no Palácio da Alvorada, de quem estava distanciada desde que ele devolveu a articulação política há uma semana. Com Temer longe da articulação, o governo quase sofreu uma derrota ontem na análise do veto ao reajuste dos servidores do Judiciário, e por pouco não conseguiu adiar a votação.

Na conversa, segundo relatos de interlocutores, o vice recusou voltar à função, mas prometeu ajudar nos "grandes temas" nacionais. Foi um diálogo duro, em que Temer ponderou que não foi chamado para o debate sobre o Orçamento, a nova CPMF e nem para a reunião com o líder do PMDB na Câmara dos Deputados, Leonardo Picciani (RJ).

O vice ainda observou que se tivesse enviado a CPMF, o governo sofreria fragorosa derrota no Congresso.

Na entrevista que concedeu após solenidade no Planalto com campeões do "WorldSkills", uma competição de educação profissional, Dilma deixou claro que é responsabilidade do Executivo definir cortes e receitas no Orçamento. "O governo vai, de fato, mandar [um adendo] e é responsabilidade dele, nós não queremos transferir essa responsabilidade para ninguém", afirmou. "O que nós queremos é construir juntos [uma solução para o déficit], queremos cumprir a meta que estipulamos", reforçou.

A presidente disse que o governo trabalhará para reduzir o déficit orçamentário, reafirmando o valor de R$ 30,5 bilhões anunciado pela equipe econômica e questionado pela oposição. "Estamos sendo transparentes, não fugiremos às nossas responsabilidades de propor a solução do problema".

Dilma não descartou o envio de uma nova CPMF ao Congresso e nem o apoio à taxação de grandes fortunas. "Não estou afastando nem acrescentando nada", afirmou, sobre o imposto sobre movimentações financeiras e outras fontes de receitas.

Ela ressalvou que não gosta da CPMF, porque "tem as suas complicações", mas deixou claro que tudo é possível: "Não estou afastando nenhuma fonte de receita, quero deixar isso claro, para depois se houver a hipótese da gente enviar essa fonte, nós enviaremos."

A presidente negou que o ministro Joaquim Levy esteja desgastado e fez um elogio geral à equipe econômica. "O ministro Levy participou conosco de todas as etapas da construção desse Orçamento, ele tem o respeito de todos nós", defendeu. "Está isolado de quem? De mim ele não está", afirmou. Dilma sublinhou que o governo tem o maior respeito por Levy e incluiu o ministro do Planejamento, Nelson Barbosa, com quem Levy trava quedas de braço sobre a política fiscal. "Nós temos o maior respeito pelo ministro. Aliás, por todos os ministros da área econômica: pelo Nelson Barbosa, pela equipe do ministro Nelson, pela equipe do ministro Levy". Ela atribuiu rumores sobre desgaste aos debates internos sobre os rumos da economia. "Nós debatemos, nós chegamos a uma posição e nós, a partir do momento que tomamos a posição, a posição é de todos nós".

Dilma ressaltou que nenhum déficit é bom, mas sustentou o discurso construído pelo Planalto de que seria pior uma maquiagem das contas públicas. Ela ressaltou, contudo, que se é ônus do governo a solução para o déficit, é responsabilidade de todos, inclusive do Legislativo, não elevar as despesas num momento de crise econômica. Foi uma referência velada ao Congresso, que aprovou reajustes salariais dentro da "pauta-bomba" e agora começa a analisar os vetos à elevação de gastos. "E fica claro também o seguinte: é responsabilidade de todo mundo. É impossível nessa situação que o país passa inventar despesa", alertou.

Dilma comparou a discussão do Orçamento do governo a uma dona de casa com problemas para fechar as contas domésticas. "Acredito que a dona de casa, que tem que equilibrar o orçamento doméstico, ela discute com a sua família como ela vai fazer e encontra boas sugestões". Ela disse que o Brasil é como uma grande família, que unida encontrará soluções para os problemas. "Vamos juntos, somos uma só Nação".

Ao final, a presidente defendeu a reforma administrativa para melhorar o modelo de gestão da máquina pública, e disse que o modelo do Uber poderá ser adotado na administração dos carros oficiais.

"Muito mais pelo lado da gestão, porque não produz um grande efeito de arrecadação de impostos, mas torna o governo mais ágil, facilita os investimentos, diminui a burocracia".

Ao anunciar que vai aplicar modelo semelhante ao Uber, ela defendeu os taxistas. "Eu acho que o Uber é complexo, porque ele tira o emprego de muitas pessoas", declarou.

Ao perceber que entrou em um tema delicado, ela ressalvou que não caberá ao governo federal regulamentar a questão. "Depende também da regulamentação de cada cidade, de cada estado, porque não é a União que decide isso. Ele tira os taxistas do seu emprego", sentenciou.

Valor econômico, v. 16 , n. 3834, 03/09/2015. Política, p. A9