Correio braziliense, n. 19098, 09/09/2015. Política, p. 2

Tesourada em uma das bandeiras de Dilma

 

Julia Chaib
 
Para cobrir o rombo no Orçamento de 2016, Planalto assume que o Minha Casa Minha Vida sofrerá cortes. Ministro, no entanto, garante que o Bolsa Família e outros programas de transferência de renda serão "preservados" .

O aperto orçamentário, evidenciado na proposta enviada ao Congresso na última semana, que prevê rombo de R$ 30,5 bilhões nas contas do governo, terá impacto na terceira fase do Minha Casa Minha Vida. Diferentemente do que havia sido dito pela presidente Dilma Rousseff, a nova etapa do programa não deve ser oficialmente lançada amanhã. Segundo um integrante do governo, é necessário que o Orçamento de 2016 seja aprovado, o que pode ocorrer até o fim do ano, para que se possa lançar a terceira fase. O governo, no entanto, assumiu ontem a possibilidade de cortes na iniciativa.

Apesar de o Palácio do Planalto não ter divulgado oficialmente a data para a apresentação do Minha Casa Minha Vida 3 nesta semana, Dilma disse em algumas ocasiões que seria no dia 10 de setembro, e anunciou, inclusive, em um tuíte, de 5 de agosto. “Boa notícia! Marcamos para 10 de setembro o lançamento do #MinhaCasaMinhaVida3”, disse a mensagem da presidente nas redes sociais. A assessoria do Ministério das Cidades informou ontem que trabalha com essa data para o lançamento. No lugar de uma solenidade com anúncio oficial, porém, Dilma deve se reunir com integrantes de movimentos sociais e da Cebic para apresentar o que o governo já tem desenhado para a terceira etapa do programa.

De acordo com o integrante do governo, há um desenho e um cronograma para a iniciativa, conforme enviado ao Congresso. No entanto, não é possível prever ao certo quanto deve ser aplicado no programa sem a aprovação do Orçamento. A possibilidade de cortes no programa foi publicamente levantada pela primeira vez ontem pela manhã, pelo ministro Ricardo Berzoini.

Após participar da reunião da coordenação política, o titular das Comunicações disse que a iniciativa teria de ser adaptada à nova “disponibilidade orçamentária do país”. Berzoini disse também que a entrega de casas da segunda etapa ainda não foi concluída, o que pode fazer com que a terceira fase do programa só entre em prática após a conclusão da anterior. “Só para vocês terem uma ideia, tem mais de 1,4 milhão de casas ainda para serem entregues da fase 2. É um programa de grande impacto social e orçamentário. E a fase 3, certamente, vai ser continuidade disso. Evidentemente, ajustada à disponibilidade orçamentária”, disse o ministro.

Ajustes
Embora tenha assumido possíveis cortes, Berzoini disse não acreditar que haverá adiamento do lançamento da terceira etapa da iniciativa. “Eu não creio que haja nenhum adiamento, mas há, simplesmente, essa fase final de alinhamento do programa com o orçamento da União”, afirmou. A fala do ministro ocorreu um dia depois de Dilma também assumir, no pronunciamento que fez na internet pelo Sete de Setembro, que poderia haver cortes no Orçamento.

“As dificuldades e os desafios resultam de um longo período em que o governo entendeu que deveria gastar o que fosse preciso para garantir o emprego e a renda do trabalhador, a continuidade dos investimentos e dos programas sociais. Agora, temos de reavaliar todas essas medidas e reduzir as que devem ser reduzidas”, disse a presidente, no discurso.

A previsão de rombo já teve impacto em diversos programas, como por exemplo, no Ciência sem Fronteiras e no Pronatec, uma das bandeiras do governo. Ontem, Berzoini ponderou que o Bolsa Família e outros com transferência de renda e previdência serão “absolutamente preservados”, mas admitiu que alguns devem passar por ajustes. “Os programas na área de investimentos físicos, que envolvem educação, que envolvem saúde, que envolvem habitação e que são programas que, evidentemente, não podem ser feitos sem o alinhamento total com a programação orçamentária”, disse. O ministro da Fazenda, Joaquim Levy, defendia o corte em programas, mas enfrentava resistência. O Minha Casa Minha Vida tem seis anos de existência. O investimento na iniciativa passa de R$ 269,8 bilhões. Pelo programa, houve a contratação de mais de 4 milhões de unidades habitacionais em 5.329 municípios.

(Wilson Dias/Agência Brasil - 2/1/15)

"Temos de reavaliar todas essas medidas e reduzir as que devem ser reduzidas”
Ricardo Berzoíni, ministro das Comunicações

R$ 269,8 bilhões
Valor investido até agora no Programa Minha Casa Minha Vida. Já foram contratadas 4 milhões de unidades habitacionais em 5.329 municípios

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Críticas no Congresso

PAULO DE TARSO LYRA

A possibilidade concreta de cortes no Minha Casa Minha Vida, atrelando o anúncio da terceira etapa do programa à aprovação do Orçamento de 2016 pelo Congresso, não foi bem-vista pelos parlamentares. “Isso me parece chantagem, passar a impressão que o Minha Casa Minha Vida não vai sair porque não aprovamos o Orçamento. Não adianta a presidente Dilma nos chamar para essa dança. A valsa é exclusivamente dela”, criticou o deputado Lúcio Vieira Lima (PMDB-BA).

Um dos maiores defensores do desembarque imediato do governo, Vieira Lima afirma que não há como fugir da realidade cruel dos números. “Ou se tem dinheiro ou não se tem dinheiro para lançar o Minha Casa Minha Vida. Não dá para pedir que nós arrumemos recursos para isso”, prosseguiu o peemedebista baiano.

Candidato a vice-presidente na chapa de Aécio Neves no ano passado, o senador Aloysio Nunes Ferreira (PSDB-SP) considerou prudente a decisão do governo de esperar a aprovação do Orçamento para anunciar novos programas. “Até porque a segunda etapa do Minha Casa Minha Vida está parada. Tem muitas empresas que quebraram por não terem recebido os recursos das partes já executadas”, provocou o senador tucano. Questionado se não seria estelionato eleitoral, já que o Minha Casa Minha Vida é uma das vitrines da gestão Dilma, Aloysio foi sarcástico. “Mais um, menos um, que diferença faz a essa altura?”

Um integrante da bancada do PSD admitiu que a situação é complicada. A legenda comanda o Ministério das Cidades, pasta responsável pela construção das moradias populares. O deputado ressaltou que o ministro Gilberto Kassab tem viajado bastante ao lado da presidente Dilma Rousseff para entregar unidades habitacionais. “O que está sendo entregue são as casas antigas, já construídas. Os novos empreendimentos estão muito lentos”, reconheceu.

Para o senador Reguffe (PDT-DF), o brasileiro não pode ser penalizado com cortes em programas sociais se o governo não faz o dever de casa. “Temos uma máquina ultrainchada, com 39 ministérios e 23,1 mil cargos comissionados”, criticou. Vice-líder do governo, o deputado Silvio Costa (PSC-PE) preferiu evitar a palavra corte. “Não haverá corte. A liberação será mais lenta, mas acontecerá”, esquivou-se ele.

“Isso me parece chantagem, passar a impressão que o Minha Casa Minha Vida não vai sair porque não aprovamos o Orçamento. Não adianta a presidente Dilma nos chamar para essa dança. A valsa é exclusivamente dela”
Lúcio Vieira Lima (PMDB-BA), deputado federal

Senado conclui a reforma política
Os senadores votaram ontem a redação final da reforma política. Assim o texto do PLC nº 75/2015 vai ser reexaminado pelos deputados. O relator da Comissão da Reforma Política, senador Romero Jucá (PMDB-RR), explicou que, para as regras novas valerem para as eleições de prefeitos e vereadores do ano que vem, a proposta deve ser sancionada até 2 de outubro. O destaque da reforma política aprovada pelos senadores é a proibição de doações de empresas e outras pessoas jurídicas a partidos políticos e a candidatos. As legendas apenas poderão receber dinheiro de pessoas físicas, mas a doação não pode ser superior ao que o cidadão recebeu no ano anterior à eleição. Além disso, as doações devem ser por meio de cheques cruzados e nominais, de transferência eletrônica ou de depósitos em espécie devidamente identificados. A identificação do doador é obrigatória, bem como a emissão de recibos.