Governo retira ‘pedaladas’

 

GERALDA DOCA

O globo, n. 30030, 26//10/2015. Economia, p. 17

 

Equipe econômica e Comissão de Orçamento vão aguardar posicionamento do TCU para decidir como pagar dívida de manobra contábil

O governo enviará ao Congresso Nacional até amanhã a mensagem propondo mudanças na meta fiscal para 2015. O documento projeta um déficit entre R$ 45 bilhões e R$ 50 bilhões e exclui as chamadas “pedaladas fiscais”, atrasos no repasse de recursos aos bancos públicos para melhorar artificialmente o saldo das contas públicas. O governo aguardará o posicionamento oficial do Tribunal de Contas da União (TCU) para regularizar essa dívida, e se poderá ser paga à vista ou em parcelas. -BRASÍLIA- O governo encaminhará ao Congresso Nacional até amanhã mensagem propondo mudança na meta fiscal para 2015, com projeção de déficit entre R$ 45 bilhões e R$ 50 bilhões. A regularização das chamadas “pedaladas fiscais” (atrasos no repasse de recursos devidos pelo Tesouro aos bancos públicos) ficará de fora do cálculo do déficit até a decisão final do Tribunal de Contas da União (TCU) sobre o tema, com a publicação do acórdão. O governo espera que o Tribunal indique se a dívida precisa ser paga à vista ou pode ser parcelada.

Ministros da área econômica e parlamentares da Comissão Mista de Orçamento passaram o fim de semana fazendo cálculos para fechar as contas. Segundo o deputado Hugo Leal (PROSRJ), relator da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2015, a nova meta vai considerar apenas a frustração de receitas do Orçamento. Ele informou que o objetivo é votar o relatório com as alterações na meta juntamente com o projeto da LDO, nesta quarta-feira.

— Essa é a linha que vou trabalhar. Com a frustração e a queda das receitas, o déficit ficará em torno de R$ 50 bilhões, mais para baixo do que para cima — disse o parlamentar ao GLOBO.

Segundo Leal, as conversas entre as áreas do governo (Fazenda, Planejamento e Casa Civil) e a Comissão do Orçamento caminharam para um consenso de que é melhor tratar a dívida do Tesouro com os bancos públicos separadamente. O governo avalia que o mais prudente é aguardar a decisão final do Tribunal para contabilizar e regularizar essas dívidas. Só vai ser considerada nas contas de 2015, por enquanto, a parcela das “pedaladas” que já foi paga ao longo do ano, cerca de R$ 7,5 bilhões. Segundo cálculos do TCU, o total desse passivo chega a R$ 40 bilhões.

— O mais importante é que o governo já entendeu o recado do TCU e vem pagando a dívida. Neste ano, pagou cerca de R$ 7,5 bilhões, referentes a 2010 e 2011 — disse o deputado.

Ele explicou que há ainda divergências sobre a forma de contabilizar os débitos. Segundo fontes do governo, na mensagem ao Congresso será explicada a forma que o governo pretende regularizar as pedaladas. Se esses débitos fossem contabilizados integralmente nas contas de 2015, o rombo deste ano poderia superar R$ 80 bilhões.

Na sexta-feira, o TCU divulgou nota informando que ainda não há decisão sobre as “pedaladas fiscais”. O recurso da União, que questiona parte desses débitos, ainda está em fase de análise pela secretaria responsável, e o relatório do ministro Vital do Rêgo sobre o tema terá que ser votado pelo plenário do Tribunal.

RECEITAS EXTRAS DE R$ 11 BILHÕES

Segundo o deputado Hugo Leal, o governo ainda espera receber este ano receitas extraordinárias de R$ 11 bilhões, referentes à outorga nas concessões de usinas hidrelétricas, cujos contratos não foram renovados. Esta é a única receita extra que deve entrar no caixa este ano:

— O que vai acontecer em 2015 é aquilo que a gente já esperava, diante da frustração de receitas (extraordinárias) e da vertiginosa queda na arrecadação, principalmente de agosto para cá.

A proposta que o governo encaminhará ao Congresso vai alterar mais uma vez a meta fiscal de 2015. A última alteração, enviada em julho mas ainda não apreciada pelos parlamentares, previa superávit de R$ 8,7 bilhões (0,15% do PIB). Confirmado o déficit de R$ 50 bilhões nas contas, será equivalente a 0,89 % do PIB.

Esta será a terceira vez que o governo altera a meta fiscal de 2015. Originalmente, ela era de superávit de R$ 143,2 bilhões, ou 2,5% do PIB. Quando a equipe econômica do segundo mandato assumiu, ainda em dezembro, ela foi alterada para superávit de R$ 66,3 bilhões, ou 1,2% do PIB. Com a arrecadação em queda livre e despesas engessadas, o governo foi obrigado, em julho, a propor mais uma mudança da meta e agora é forçado a fazer isso de novo, dessa vez para déficit.

A arrecadação de tributos e contribuições federais teve em setembro o pior resultado para o mês em cinco anos, desde 2010. Segundo a Receita Federal, entraram nos cofres públicos R$ 95,239 bilhões, queda real de 4,12% em relação a 2014. No acumulado do ano até setembro, o governo arrecadou R$ 901,053 bilhões, 3,72% menos do que no mesmo período de 2014.

 

Patos nas areias de Copacabana

 

GUILHERME RAMALHO

 

Depois de passar pela Avenida Paulista, pelos gramados do Congresso Nacional e por cidades do interior paulista, o pato inflável amarelo de 12 metros de altura da campanha “Não vou pagar o pato” chegou ontem às areias de Copacabana. A iniciativa, lançada no dia 21 de setembro pela Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), busca conscientizar a sociedade sobre a alta carga tributária do país e pretende evitar que a proposta de retorno da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF) seja aprovada no Congresso.

GUITO MORETOProtesto. Cerca de dois mil patinhos foram distribuídos na Praia de Copacabana, no Rio, em manifestação contra a volta a CPMF, na campanha “Não vou pagar o pato”

No Rio, o lançamento da campanha foi em parceria com a Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (Firjan). Até o momento, cerca de 850 mil assinaturas foram recolhidas pela internet e nas ações em Brasília, São Paulo e Rio. A meta é conseguir mais de um milhão de assinaturas para que o manifesto seja encaminhado ao Congresso Nacional até o fim do ano.

Além do pato inflável, dois mil patinhos foram distribuídos aos cerca de 300 participantes. Segundo o presidente da Fiesp, Paulo Skaf, a volta da CPMF é apenas um dos pontos da campanha.

— O governo precisa cortar suas despesas, seus gastos, seus desperdícios e ter eficiência. Então, é uma campanha que vai além da CPMF. O problema não é criar mais imposto, é ter vergonha na cara. Não existe mais imposto bom. Chega de gastança! — afirmou Skaf, acrescentando que a próxima cidade a receber a campanha será Salvador.

Criada para financiar investimentos em saúde, a CPMF foi cobrada até 2007, recolhendo 0,38% de cada movimentação financeira. No Rio, o governador Luiz Fernando Pezão e o prefeito Eduardo Paes já defenderam a volta da contribuição. O presidente da Firjan, Eduardo Eugenio Gouvêa Vieira, diz que as famílias não podem arcar com mais esse imposto.

— Governadores e prefeitos querem arrecadar mais. Quando eles falam, é por falta de recursos dos impostos advindos do desenvolvimento econômico, que não vêm por uma questão nacional. O problema não está no Rio nem nos estados. O problema é que o Brasil parou e não podemos achar que isso é normal — comentou.

DEFESA DE PRIVATIZAÇÕES

Para Gouvêa Vieira, a volta da CPMF seria um desastre, assim como qualquer aumento de imposto, principalmente nesse momento em que a população e as empresas já enfrentam graves dificuldades.

Ele ressaltou que a carga tributária brasileira “já ultrapassou o limite do razoável”, chegando a quase 40% do PIB, e que a solução para o problema das contas públicas não passa por aumento de tributação, e sim pela redução de gastos. A Firjan também defende um forte programa de privatizações que, segundo estudos da federação, tem potencial de gerar recursos que somam 4% do PIB.

Moradora do Leme, a administradora Karine Brandão, de 43 anos, apoiou o movimento.

— Acho fundamental a mobilização das pessoas em torno de movimentos como este. Isso é que vai fazer a diferença para que a gente consiga demonstrar nossa força e o poder do povo contra essa aberração que é a volta da CPMF — afirmou.