Indecisão de Dilma adia envio de meta fiscal

 

MARTHA BECK E GERALDA DOCA

O globo, n. 30031, 27//10/2015. Economia, p. 23

 

A pouco mais de dois meses do fim do ano, a presidente Dilma ainda não decidiu qual a melhor estratégia para fixar a meta fiscal de 2015, que poderá ou não incluir o acerto das “pedaladas” e prever rombo de até R$ 70 bi. Com isso, o envio da nova meta ao Congresso deve ser adiado. -BRASÍLIA- Por uma indefinição da presidente Dilma Rousseff, a equipe econômica ainda não conseguiu fechar a proposta de alteração da meta fiscal de 2015, o que deve adiar o envio da mudança ao Congresso. No fim de semana, o relator do projeto que altera a meta, deputado Hugo Leal (PROSRJ), após discussões com a equipe econômica, informou ao GLOBO que a proposta seria encaminhada até hoje sem a regularização das chamadas “pedaladas fiscais” (atrasos nos repasses de recursos do Tesouro para bancos públicos) no Orçamento deste ano, e o déficit ficaria entre R$ 45 bilhões e R$ 50 bilhões.

ANDRÉ COELHO/7-5-2012Sintonia com realidade. Hugo Leal não vê problema em adiar relatório sobre meta fiscal para equalizar o tema

Leal afirmou ontem que, se o governo precisar de mais tempo para fechar as contas, ele pode adiar a votação de seu relatório, que estava prevista para esta semana, mas alertou que isso vai atrasar a votação do Orçamento de 2016.

— A prioridade do relatório é estar em sintonia com a realidade. Existem muitos conceitos se misturando nesse momento. Se for necessário adiar para poder equalizar o tema, não vejo problema — disse ele.

A ESCOLHA DE DILMA

Segundo integrantes do governo, a presidente Dilma ainda tem dúvidas sobre a melhor estratégia. As equipes dos ministérios da Fazenda e do Planejamento já apresentaram diferentes cenários ao Palácio do Planalto. Dependendo do cenário, o tamanho do rombo pode variar de R$ 50 bilhões a R$ 70 bilhões.

É consenso no governo que as pedaladas — condenadas pelo Tribunal de Contas da União (TCU) e estimadas em R$ 40 bilhões — precisam ser resolvidas o mais rápido possível. No entanto, há uma preocupação em relação ao impacto de um déficit muito elevado em 2015 sobre o mercado financeiro, caso a fatura fosse paga de uma vez. Por outro lado, essa seria uma forma de encerrar o assunto e concentrar esforços na realização da meta fiscal de 2016. Esse é o dilema de Dilma.

Diante dessa incerteza, ganhou força no governo a ideia de encaminhar a proposta sem contabilizar as pedaladas. A ideia seria propor uma revisão da meta fiscal de 2015, de um superávit de R$ 8,7 bilhões para um déficit de R$ 50 bilhões. E a conta de R$ 40 bilhões das pedaladas ficaria para ser equacionada futuramente.

O TCU ainda não se posicionou oficialmente sobre como o governo precisa contabilizar essas manobras. O assunto ainda está em análise e, segundo o relator, ministro Vital do Rego, a decisão do TCU não deve ocorrer esta semana. Ele já disse a pessoas próximas que o texto ainda está passando por análise técnica e que é impossível concluí-la até quarta-feira, dia da sessão da Corte.

De qualquer maneira, a equipe econômica já negocia com Leal a inclusão na proposta de uma cláusula que permita acomodar, futuramente, o pagamento das pedaladas. Segundo um técnico da equipe econômica, o governo sabe que terá de liquidar as pedaladas em algum momento (à vista ou em três ou quatro parcelas) e que não será possível alterar a meta novamente. Assim, é preciso que haja algum mecanismo de flexibilidade para incorporar esse passivo nas contas.

— Independentemente de qual seja decisão do tribunal, o governo vai ter que pagar e não tem mais como alterar a meta de 2015 . A ideia é incluir alguma regra no projeto que permita uma flexibilização, ainda que não seja explícita — disse.

Já o relator do Orçamento de 2015, senador Romero Jucá (PMDB-RR), diz que o governo errará se não assumir as pedaladas de uma vez.

— O governo, ao escolher um déficit menor, está exportando as pedaladas para outro ano. Defendo um déficit completo para 2015 e, para 2016, trabalhar no déficit zero. O governo tem de mostrar um horizonte de quatro anos. Mas só consegue falar no desastre de hoje. O déficit das pedaladas já está precificado. Ao não assumi-lo com medo do rebaixamento, é pior a leitura do mercado. Sou sempre defensor da verdade — afirmou Jucá.

 

Dívida pública sobe 1,8% e vai a R$ 2,734 trilhões

 

A dívida pública federal voltou a subir em setembro e fechou o mês em R$ 2,734 trilhões. A alta em relação a agosto foi de 1,8% ou R$ 48,34 bilhões. Segundo o Tesouro Nacional, o crescimento do estoque se deveu aos juros que corrigem o endividamento e somaram R$ 34,89 bilhões no período e também à emissão líquida de títulos públicos no valor de R$ 13,45 bilhões.

Os títulos prefixados e corrigidos por índices de preços reduziram sua participação no montante da dívida. A fatia dos prefixados caiu 41,59% em agosto para 41,37% em setembro. Já no caso dos papéis indexados à inflação, a redução foi de 31,99% para 31,69%. Já os títulos corrigidos pela Selic aumentaram seu peso na dívida de 21,28% para 21,42%.

O coordenador-geral de Operações da Dívida Pública, José Franco, observou que setembro foi um mês de volatilidade no mercado. Isso obrigou o Tesouro a fazer leilões extraordinários de compra e venda de títulos para evitar uma alta excessiva nas taxas de juros cobradas pelos investidores.

— O Tesouro tomou a decisão de reduzir a volatilidade — disse Franco.

Segundo ele, os investidores têm demonstrado interesse por títulos de longo prazo corrigidos por índices de preços. Isso, no entanto, tem custos mais altos para o Tesouro. Assim, a estratégia tem sido aumentar a oferta desses papéis com prazos mais curtos. Mas com isso, a equipe econômica pode não conseguir cumprir os indicadores do Plano Anual de Financiamento (PAF) da dívida pública. Ele prevê que a parcela da dívida indexada a índices de preços termine o ano entre 33% e 37%. Até setembro, está em 31,69%.

Ele assegurou, porém , que a previsão do Plano para o estoque da dívida, de R$ 2,650 trilhões a R$ 2,8 trilhões, será cumprida.