Fazenda busca 'amarrar' a receita de 2016

Leandra Peres e Ribamar Oliveira 

22/10/2015

O Ministério da Fazenda vai propor a criação de uma reserva especial no Orçamento de 2016 para compensar eventuais frustrações de receitas que ocorram no ano que vem. A ideia é constituir essa reserva com as receitas extraordinárias que estavam previstas para 2015, mas que não entraram no caixa. Desta forma, a ideia é garantir a "flexibilidade" que a presidente Dilma Rousseff busca para evitar que o governo tenha que votar no Congresso sucessivas mudanças nas metas de resultado primário, como ocorreu em 2014 e novamente esse ano. Ao mesmo tempo, a equipe econômica evita que a arrecadação com a venda da Caixa Seguridade e do IRB, por exemplo, sejam usadas para cobrir despesas correntes do ano que vem.

Não está claro se a parcela da União no projeto de repatriação de recursos que estão no exterior, assim como a receita de concessões faria parte da reserva proposta pela Fazenda. Este ano, a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) permitiu o abatimento de até R$ 26,4 bilhões da meta de superávit primário em função de receitas extraordinárias e de propostas legislativas que não ainda foram aprovadas.

Além de criar um amortecedor para perdas de receitas, a Fazenda também busca uma forma de evitar aumentos de gastos. Normalmente, as receitas extraordinárias são incorporadas às estimativas de arrecadação anual do governo e usadas como fontes de financiamento das despesas orçamentárias. Com a criação da reserva proposta pela Fazenda, os recursos dessas receitas extraordinárias específicas ficariam congelados. Também poderiam acabar reforçando a meta de superávit

Levy, tem defendido mudanças nas regras previdenciárias - como o estabelecimento da idade mínima para a aposentadoria e maior rigidez na concessão da aposentadoria rural.

primário de 2016 no improvável cenário em que as receitas estimadas para o ano que vem se confirmem.

De acordo com uma autoridade ouvida pelo Valor, a proposta tem como base a discussão do impulso fiscal. A meta fiscal de 2015 está sendo reduzida em função do péssimo desempenho da arrecadação de impostos e também porque o governo preferiu adiar a venda de ativos por causa das condições ruins de mercado. Desta forma, esses ganhos de receita devem ser tratados como parte da discussão fiscal de 2015. "Se não conseguirmos vender esse ano por uma questão de calendário, não é para gastar no ano que vem. Assim, a meta de 2016 seria 0,7% do PIB mais receitas extraordinárias", explicou uma autoridade.

A proposta é amarrar o uso das receitas extraordinárias a quedas que ocorram na arrecadação tributária. Para isso, seria necessário alterar a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) para não apenas criar a reserva, mas também para destinar os recursos a essa conta especial. A mudança só vai adiante se o governo conseguir apoio do relator da LDO, no sentido de incorporá-la ao seu parecer, ou se algum parlamentar da base apresentar uma emenda com a proposta.

Governo define meta fiscal até amanhã

Fábio Pupo e Edna Simão 

O ministro do Planejamento, Nelson Barbosa, afirmou que o governo vai chegar, até amanhã, à definição sobre eventual mudança da meta fiscal para o ano de 2015. Ele disse que há "perspectiva" de frustração de receitas, mas que a decisão final de alterar a meta ainda não está tomada. Segundo ele, o Executivo ainda considera a possibilidade de obter certas receitas até o fim do ano. "Há uma perspectiva de frustração de receitas, que pode gerar a necessidade de revisar o cenário vigente no último relatório [sobre receitas e despesas, atualizado bimestralmente]

", disse. Para ele, no entanto, o governo ainda vê possibilidade de arrecadar receitas extraordinárias, como as de concessões de infraestrutura.

Por isso, diz ele, ainda não está certo de que haverá corte na meta. "Isso não é decisão tomada. Ainda estão sendo feitas várias avaliações, porque tem receitas que podem se materializar no fim do ano, como de concessões e outras previstas no projeto de lei que enviamos ao Congresso Nacional. Esses cenários estão sendo revisados pela equipe do Planejamento e da Fazenda e vamos apresentar o resultado até o final da semana", disse.

Barbosa evitou antecipar números sobre o rombo nas contas: "A gente não tem nenhum número consolidado neste momento, porque depende de hipóteses sobre a receita. O que está sendo analisado agora é justamente isso. Qual cenário de receita temos até o fim do ano e se é muito diferente do que tínhamos previsto. A partir disso, vamos reavaliar ou não o cenário fiscal."

O ministro ainda disse que o cenário da meta fiscal vai depender do pagamento das chamadas "pedaladas" - prática tomada pelo governo nos últimos anos de postergar pagamentos a bancos públicos. O governo negocia com o Tribunal de Contas da União (TCU) um meio de regularizar esses ativos sem impactar demais a União. "Nosso foco está em 2015, nesse cenário de receita até o fim do ano e no encaminhamento a ser dado ao questionamento do TCU sobre o pagamento de equalização da taxa de juros. Depende de qual o encaminhamento que o TCU vai dar a essa questão", disse.

"Para 2016, a direção é a mesma, de o governo recuperar a capacidade de produzir resultados primários no nível suficiente para estabilizar a dívida pública federal. Só que, no atual contexto macroeconômico, essa recuperação é mais lenta do que o inicialmente esperado", disse.

Estima-se que o déficit de 2015 pode chegar, no pior cenário, a R$ 49 bilhões, próximo a 0,8% do PIB, sem incluir eventuais pagamentos das chamadas "pedaladas fiscais".

O governo vai retomar também nos próximos dias as discussões para fazer novas mudanças de regras na Previdência Social, segundo Barbosa, que se reuniu ontem com o ministro do Trabalho e Previdência Social, Miguel Rossetto, para debater o assunto. "Nós vamos retomar os trabalhos e apresentar novas propostas para melhorar a situação fiscal da Previdência", afirmou Barbosa.

Segundo ele, as discussões sobre a Previdência ocorrerão entre as pastas do Planejamento e do Trabalho. "É um trabalho conjunto que já vinha acontecendo neste ano e já resultou na medida provisória sobre pensão por morte e na da regra 85/95. E há outras propostas em discussão para melhorar a sustentação da Previdência", disse. Segundo a regra 85/95, para se aposentar, mulheres têm que ter idade e tempo de contribuição que, somados, resultem em 85 pontos. No caso dos homens, o piso é de 95 pontos. Segundo ele, o Planalto ainda avalia se vai ou não sancionar mudanças aprovadas pelo Congresso sobre a medida provisória que estabelece a regra.

A necessidade de nova reforma da Previdência tem ganhado força devido ao ambiente de ajuste fiscal. O ministro da Fazenda, Joaquim Levy, tem defendido mudanças nas regras previdenciárias - como o estabelecimento da idade mínima para a aposentadoria e maior rigidez na concessão da aposentadoria rural.

Valor econômico, v. 16 , n. 3867, 22/10/2015. Brasil, p. A3