Governo quer suspensão do recesso 

Thiago Resende, Raphael Di Cunto e Bruno Peres 

04/12/2015

O governo passou ontem a defender abertamente o cancelamento do recesso parlamentar, para que o processo de impeachment contra a presidente Dilma Rousseff não seja paralisado. O anúncio fez a oposição repensar sua estratégia e, agora, passou a apoiar a pausa em janeiro para que o rito seja retomado apenas em fevereiro, à espera de maior apoio popular.

Para a oposição, as férias escolares de começo de ano e período pré-Carnaval vão desestimular os movimentos pró-impeachment.

Em reunião com ministros do governo e líderes aliados, Dilma defendeu que o processo seja conduzido com celeridade, o que significa suspender o recesso parlamentar com essa finalidade. O ministro-chefe da Casa Civil, Jaques Wagner, afirmou que a presidente "pode convocar o Congresso, mas prefere que eles [parlamentares] decidam". "Não parece razoável que o Parlamento se desligue com um processo desses em curso", completou.

Com isso, depende dos presidentes da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), e do Senado (PMDB-AL), entrarem num acordo para suspender o recesso. Assim, os deputados continuariam trabalhando no fim do ano e no começo de 2016 para concluir o trâmite do processo de impeachment na Casa. Ontem, Cunha, que deu início ao rito, disse que isso "não será decidido logo".

Primeiro a tornar pública a indicação do Palácio do Planalto, o líder do PT na Câmara, Sibá Machado (AC), pediu atenção permanente de toda a bancada e disse que, se o processo contra Dilma não for derrubado no Judiciário, o melhor é votar logo porque o Brasil tem que "continuar andando". "Não vai ter descanso, não vai ter folga, não haverá Natal, não haverá Ano Novo até o encerramento dessa situação", declarou.

A decisão de Cunha e Renan de suspender o recesso parlamentar depende de aprovação por maioria absoluta das duas Casas. Líderes da oposição - PSDB, PPS, DEM e SD - inicialmente queriam aproveitar o embalo da decisão do presidente da Câmara de aceitar o impeachment, mas reavaliaram o cenário.

"O governo passou a apoiar o cancelamento do recesso parlamentar para aproveitar a falta de visibilidade do período. Isso nos fez refletir e agora tomou corpo a ideia de que seria melhor que os trabalhos voltassem em fevereiro", disse o líder da oposição na Casa, Bruno Araújo (PSDB-PE).

Segundo ele, janeiro é mês de quórum mais baixo no Congresso e pouca mobilização da sociedade, o que reduziria a pressão pelo impeachment e poderia tender o julgamento para o lado pró-Dilma. A ideia ganhou corpo após defesa do líder do DEM, Mendonça Filho (PE): "O processo precisa ir ganhando corpo até chegar no auge em fevereiro para votarmos em plenário."

Para o líder do PSDB na Câmara, Carlos Sampaio (SP), a estratégia do governo de tentar suspender o recesso parlamentar tem como objetivo diminuir a pressão popular e inviabilizar o impeachment. "Quer aproveitar o período do Natal e do Ano Novo para tentar dificultar a mobilização dos movimentos sociais e, com isso, diminuir a pressão sobre os deputados", ressaltou.

Cunha adia prazo para definir comissão

Em acordo com os líderes partidários, o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), adiou para segunda-feira o prazo final para que as siglas indiquem os deputados que integrarão a Comissão Especial que vai analisar o pedido de impeachment da presidente Dilma Rousseff.

Ontem, Eduardo Cunha leu, no plenário da Casa, a decisão que deflagra o rito do processo de impeachment da petista. Requisito para oficializar o início da tramitação, o ato foi acompanhado por um baixo quórum de deputados - comum de quintas-feiras à tarde.

Pouco depois do fim da sessão, a presidente Dilma foi notificada de que Cunha acatou o pedido de impeachment protocolado por Janaina Conceição Paschoal, Miguel Reale Júnior e Hélio Bicudo, um dos fundadores do PT.

A denúncia, com mais de 3,5 mil folhas, incluindo os anexos, foi encaminhada ao Palácio do Planalto junto com a decisão do pemedebista. O PT nem qualquer outro partido poderá recorrer do ato do presidente da Câmara. Só é possível apresentar recurso ao plenário da Casa quando a decisão é pelo arquivamento do pedido de impeachment - como planejavam fazer partidos de oposição se Cunha tivesse negado todas as solicitações para a saída da presidente.

Mas nem todas as movimentações ontem foram formais. Os líderes partidários já começaram a negociar as indicações para a Comissão Especial do impeachment. A composição desse colegiado será votada no plenário da Câmara já na segunda-feira à noite. Será nos moldes "chapa única". Deve ocorrer, portanto, apenas uma confirmação dos membros.

A primeira grande disputa política será travada na terça-feira, quando está prevista a instalação do colegiado. A escolha será por voto secreto e vai depender de acordo político a ser costurado nos próximos dias.

Terça-feira também começará a contar o prazo de dez sessões do plenário da Câmara para que a presidente Dilma se manifeste contra as acusações da denúncia acatada por Cunha.

Deputados dizem que ela não poderá se defender por meio da Advocacia-Geral da União (AGU), pois estaria usando a máquina pública em benefício próprio. Mas não há regra clara na Câmara e isso pode gerar discussão ao longo do trâmite.

Depois dessa defesa, a Comissão Especial terá que concluir um parecer em até cinco sessões. O relatório do colegiado poderá ser pela procedência ou improcedência, ou seja, pela abertura ou arquivamento do processo de impeachment de Dilma. Essa decisão é por maioria simples. Independente da conclusão, o caso vai ao plenário da Câmara 48 horas depois de publicado.

Nessa etapa, o processo de impeachment só será aberto se houver, pelo menos 342 votos dos deputados. Ou seja, dois terço do plenário. Cunha presidirá a sessão e não poderá votar. Se o governo não conseguir barrar a abertura do processo de impeachment pela Câmara, a presidente Dilma tem que se afastar para que o Senado dê a palavra final.

Segundo a Secretaria-Geral da Mesa da Câmara, todo o rito foi traçado para que não haja necessidade de recursos na Casa. No entanto, nada impede que sejam feitos questionamentos no Judiciário.

Valor econômico, v. 16 , n. 3897, 04/12/2015. Política, p. A5