O globo, n. 30051, 16/11/2015. Opinião, p. 12

Uma insanidade

 

 

A ideia segundo a qual o cidadão armado tem mais chances de se defender da violência é uma maldosa, por deliberada, deturpação do conceito de segurança — pública ou individual. Empurrar para a sociedade a fábula de que, com uma arma ao alcance, a vítima de um assalto, de uma tentativa de sequestro ou de outra modalidade de crime em que a reação ao ataque põe sua vida em risco a transformará em mocinho de filme decorre de duas visões.

Uma delas é consequência da extrema inocência daqueles que se deixam contaminar por versões fantasiosas de que revólveres à mão são anteparo certo contra bandidos. São os inocentes úteis que acabam fazendo o jogo da outra ponta da história do imaginado herói — aquela que tem interesses diversos (políticos, econômicos, ideológicos etc.) na flexibilização das leis que controlam a venda e circulação de armas no país.

A tese da autodefesa armada não resiste sequer a números extraídos da realidade dos Estados Unidos, o país que, por sua liberalíssima legislação sobre armamentos, tem servido de exemplo dos supostos “benefícios” de se armar o cidadão comum. Lá, um estudo do FBI informa que usar armas em legítima defesa funciona bem nas telas do cinema, mas apenas aí. Segundo a polícia federal americana, para cada caso de morte decorrente do uso defensivo de arma de fogo (legítima defesa), contabilizam-se 185 óbitos — de vítimas de algum tipo de violência criminal que acreditaram na possibilidade de adaptar roteiros de ficção à vida real, ou então por suicídio ou acidentes.

Guardar armas em casa é convite fácil a tragédias. Uma pesquisa do Datasus revela que, no Brasil, duas crianças entre zero e 14 anos são feridas por tiros acidentais todos os dias. Esse levantamento já tem dez anos, mas, pelos constantes episódios que resultam em ferimentos ou morte decorrentes de algum tipo de manejo de armas mantidas em residências, relatados na imprensa ou registrados em boletins de ocorrência nas delegacias, nada leva a crer que essa relação tenha se alterado. Armas de fogo são a causa mais comum de mortes de homens jovens no Brasil; elas matam mais que acidentes de trânsito ou doenças como aids e câncer.

A entrada em vigor do Estatuto do Desarmamento, em 2003, foi um avanço notável do país no sentido de reduzir os indicadores de óbitos por armas de fogo. O Mapa da Violência de 2015 estima que, entre 2004 e 2012, mais de 160 mil vidas foram poupadas no Brasil. A violência ainda é um problema crônico na maior parte dos estados brasileiros. A relação de mortes (27,5) por cem mil habitantes permanece alta e há muito por fazer no âmbito de políticas de segurança. Mas sem dúvida esse quadro seria mais grave sem o Estatuto.

O desmonte dessa lei orgânica, que se organiza no Congresso, é uma insanidade que precisa ser barrada pelos parlamentares efetivamente preocupados em encontrar caminhos para reduzir a violência, e não em municiá-la com medidas que ferem a razão.

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O globo, n. 30051, 16/11/2015. Opinião, p. 12

Perdeu, cidadão

“Todo poder político vem do cano de uma arma. O partido comunista precisa comandar todas as armas; desta maneira, nenhuma arma jamais poderá ser usada para comandar o partido.”

Qualquer semelhança da frase do ditador comunista Mao Tsé Tung — referência ideológica da esquerda brasileira — com a política de desarmamento de PT, PSOL e afins não é mera coincidência. Lula não esconde de ninguém que, para garantir a permanência de sua cleptocracia no poder, colocará o “exército do MST”, armado, nas ruas.

Os EUA, cujos cidadãos estão entre os mais armados do mundo, apresentam taxa de homicídios muito inferiores às do Brasil: 5,3 contra 27,4 por 100 mil habitantes. E o que dizer da Suíça, que disputa com os EUA o primeiro lugar como país com população mais armada, com índices ainda mais baixos (2,9 por 100 mil habitantes)?

Igual questionamento se aplica à Alemanha (0,5 por 100 mil habitantes), Inglaterra (0,1 por 100 mil habitantes) e outros países desenvolvidos. O que difere o Brasil de tal grupo? Simples: A impunidade! Enquanto na Suíça a taxa de elucidação de homicídios ultrapassa os 95%, na Alemanha e Inglaterra situa-se na casa de 85% e nos EUA fica em 65%, no Brasil não vai além de 5%! A conclusão não é óbvia? E não há mentira que a derrube, nem mesmo a dialética marxista!

Armas não matam pessoas, pessoas matam pessoas. Tanto é verdade que pessoas armadas salvam vidas, que muitos desarmamentistas se mantêm vivos por possuírem escolta armada, carros blindados e morar em condomínios com segurança. Mas, do alto de sua arrogância e hipocrisia, defendem que o resto da população não tenha os mesmos direitos.

Henrique Nogueira, no livro “O direito de ter e portar armas — Recuse ser uma vítima”, publica pesquisa com criminosos condenados, em que 74% afirmaram evitar entrar em residências onde possa haver alguém armado e 56% declararam que não abordariam vítimas que suspeitassem portar armas. No Brasil, alguém acredita que traficantes ou assaltantes tenham dificuldades de acesso a armas? Claro que não! As leis que proíbem o porte só desarmam quem não está disposto a cometer crimes.

As únicas vitórias efetivas do desarmamento foram dar mais tranquilidade ao marginal — já convicto da impunidade — para escolher suas vítimas sem a preocupação de ser baleado ou morto por um revide e, ainda, impedir que um cidadão que se sinta ameaçado possa se preparar para melhor se defender ou à sua família. Agrava o quadro a legislação penal branda, que permite ao condenado cumprir apenas fração de sua pena, e a complacência com crimes, mesmo os mais bárbaros, praticados por menores de idade.

“Sendo necessária à segurança de um Estado livre a existência de uma milícia bem organizada, o direito do povo de possuir e usar armas não poderá ser infringido.” (2ª Emenda à Constituição dos EUA). Eita povinho atrasado, né?