O globo, n. 30.061, 26/11/2015. País, p. 8

Governo considera indefensável situação de seu líder no Senado

Presidente pretende decidir, até semana que vem, o novo ocupante do cargo

-BRASÍLIA- O Palácio do Planalto manteve cautela sobre a situação do líder do governo no Senado, Delcídio Amaral (PT-MS), até a liberação da gravação que motivou sua prisão. A partir do momento em que ela se tornou pública, o governo passou a tratá-lo como “indefensável”, nas palavras de um auxiliar presidencial.

AILTON DE FREITAS/3-3-2015Defesa. Líder do PT diz que governo não está envolvido

O áudio foi considerado trágico por integrantes do governo. Oficialmente, porém, o Planalto anunciou apenas a decisão da presidente Dilma Rousseff de entregar até a próxima semana a liderança do governo na Casa aos quatro vice-líderes, até a escolha de um novo líder.

O dia foi de reuniões de emergência entre a presidente, ministros e assessores. O clima, segundo relatos ao GLOBO, era de incredulidade com as revelações. O entorno de Dilma optou por não se manifestar sobre o caso, com a intenção de isolar as ações de Delcídio da Presidência, tratando as articulações do petista para calar Nestor Cerveró como um ato de desespero do senador, desconhecido pelo governo.

Logo pela manhã, o líder do PT no Senado, Humberto Costa (PE), destacou que não havia nada que vincule o episódio ao Palácio do Planalto. Ele também destacou que é importante o Congresso não paralisar suas atividades.

— É importante registrar que não há, em nada que foi dito até agora, qualquer tipo de envolvimento ou participação do governo. É um momento difícil, até mesmo de falar a respeito. Não há nenhum fato patrocinado pelo governo. São questões que correm totalmente ao largo do governo — afirmou Costa.

Logo após ter sido informada pelo ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, sobre as prisões de seu líder e do banqueiro André Esteves, Dilma recebeu o chefe da Casa Civil, Jaques Wagner no Palácio da Alvorada, sua residência oficial. Antes de 9h, ele já se reunia com os ministros Ricardo Berzoini (Secretaria de Governo) e Edinho Silva (Comunicação Social) e com Giles Azevedo (assessor especial) para traçar um primeiro cenário sobre a crise.

Berzoini telefonou para senadores da base aliada para colher impressões sobre o caso e traçar o próximo passo: a substituição de Delcídio na liderança do governo.

Depois, Berzoini, Wagner, Edinho e Cardozo se reuniram com Dilma no Planalto, já com sugestões para o cargo. Dilma preferiu ganhar tempo para definir seu novo líder. Quer negociar com aliados e entender melhor a gravidade da situação de Delcídio. Na terceira reunião do dia, durante o almoço no Alvorada com esses mesmos auxiliares, Dilma decidiu que não optaria por ninguém neste momento e deixou os quatro vice-líderes — Hélio José (PSD-DF), Paulo Rocha (PT-PA), Wellington Fagundes (PRMT) e Telmário Mota (PDT-RR) — respondendo pelo cargo, pelo menos até semana que vem, quando deve escolher o substituto de Delcídio.

Entre idas e vindas de reuniões, Wagner revelou o espanto do governo com as revelações da trama armada por Delcídio para tentar calar o ex-diretor da Petrobras Nestor Cerveró. Dilma falou duas vezes por telefone com o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL).

— É uma situação inusitada. Tudo que vem lá das investigações é inesperado. É claro que ficamos surpresos — disse o ministro da Casa Civil. ÁREA ECONÔMICA TEME POR PROJETOS DO AJUSTE Ao longo do dia, além dos potenciais danos à imagem de Dilma, foram também contabilizados os danos políticos. Uma grande preocupação foi com a paralisia das matérias de interesse do governo no Congresso, especialmente na área econômica. O ministro do Planejamento, Nelson Barbosa, esteve três vezes com Wagner e foi até Dilma. Ele estava tenso porque, depois de muito negociar, finalmente seria votada ontem a mudança na meta fiscal deste ano, o que acabou adiado para a próxima semana.

O ministro da Fazenda, Joaquim Levy, ligou para líderes a fim de saber o que fazer em relação ao projeto da repatriação, que permite a legalização de recursos enviados ao exterior sem aviso à Receita Federal. O texto, relatado por Delcídio no Senado, é uma das esperanças do governo para reforçar a arrecadação de 2016. Nas conversas com o Congresso, chegou-se à conclusão de que a melhor saída seria designar um novo relator para a repatriação o mais rapidamente possível. (Colaboraram Chico de Gois e Cristiane Jungblut)