Correio braziliense, n. 19.194, 14/12/2015. Política, p. 2-3

PROTESTOS ENCOLHEM EM TODO O PAÍS

CRISE NA BASE » Para organizadores das manifestações, mais de 400 mil pessoas foram às ruas. As polícias militares, no entanto, calculam que 80 mil pessoas participaram. Números são menores que em atos anteriores
Por: PAULO DE TARSO LYRA E MARCELLLA FERNANDES

PAULO DE TARSO LYRA

MARCELLLA FERNANDES

 

Na primeira grande manifestação favorável ao impeachment após a abertura do processo na Câmara, o número de manifestantes nas ruas de todo o país frustrou a expectativas dos organizadores e foi bem inferior aos protestos nacionais anteriores, realizados em março, abril e maio.

Os atos, convocados pelos grupos Vem Pra Rua, Movimento Brasil Livre e Revoltados online ocorreram em 26 estados e no Distrito Federal, em aproximadamente 100 cidades. De acordo com os organizadores, as passeatas reuniram 407 mil pessoas. Já para as polícias militares, foram 83 mil. Em março, por exemplo, esses números oscilaram entre 900 mil e 1,7 milhão de pessoas.

Na maior cidade do país, São Paulo, a Polícia Militar disse que 30 mil pessoas foram à Avenida Paulista. Para os organizadores, eram 80 mil. Pelo Datafolha, eram 40 mil. Em março, o mesmo instituto calculou em 250 mil o número de manifestantes na principal avenida financeira do país. No Rio, a caminhada aconteceu na praia de Copacabana e reuniu, na avaliação dos organizadores, entre 60 e 100 mil pessoas. A PM fluminense não fez o cálculo dos presentes.

Os movimentos de rua são essenciais, tanto na opinião do governo quanto da oposição, para medir a intensidade da adesão popular ao afastamento da presidente da República.

Vestidos de verde e amarelo em todo o país, os manifestantes pediram ontem a saída de Dilma Rousseff e o fim da corrupção. O juiz Sergio Moro, responsável pela condução da Operação Lava-Jato, foi homenageado em diversas cidades.

Em São Paulo, sete carros de som ocuparam a Avenida Paulista. Os manifestantes levaram os bonecos infláveis de Dilma e do ex-presidente Lula, apelidado de “Pixuleco”, e alguns fizeram um panelaço. Um dos autores do pedido de impeachment em tramitação na Câmara dos Deputados, o ex-petista Hélio Bicudo subiu no carro do Vem pra Rua e leu um discurso. “Exigimos o impeachment da doutora Dilma. Nesta avenida, nas ruas e praças de todo o Brasil, nossos corações transbordam uma só palavra: impeachment”, disse.

Vice na chapa do PSDB na disputa presidencial do ano passado, o senador Aloysio Nunes (PSDB-SP) também marcou presença na capital paulista. “Vai ter impeachment para tirar a presidente Dilma. É isso que nós queremos. Nós queremos por fim a um governo que não deveria ter começado, porque ela mentiu durante a campanha. A campanha foi financiada com dinheiro sujo. Ela prometeu trazer o diabo para ganhar eleição e quem paga as penas do inferno, da inflação, do desemprego, é o povo brasileiro”, afirmou, em referência a uma frase dita pela petista durante a disputa eleitoral em 2014. O senador José Serra (PSDB-SP) e o presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), Paulo Skaf, também compareceram.

Candidato do PSDB em 2014 e presidente nacional da legenda, o senador Aécio Neves (MG), reforçou, nas redes sociais, a importância das manifestações de ontem. “Mesmo com poucos dias para mobilização, elas mostraram que permanece vivo em grande parte da sociedade o sentimento de indignação e rejeição a esse governo. Repetindo o que disse hoje o senador Aloysio Nunes, não vai ter golpe, vai ter é impeachment”, destacou.

 

Motivação

Na avaliação do cientista político da Universidade de Brasília (UnB) João Paulo Peixoto, a redução na adesão aos protestos é resultado de falta de motivação para as pessoas irem às ruas e de dificuldades de logística, pelo fato dos protestos terem sido marcados para dezembro, a pouco mais de uma semana do Natal. Ele aposta que atos durante o período de férias terão o mesmo resultado. “Pelo que vimos, a não ser que haja uma mudança muito grande e fatos novos apareçam, a tendência vai ser essa”, afirma o especialista. O grupo Vem Pra Rua anunciou que a próxima grande manifestação será marcada em março.

Peixoto acredita que as indefinições no rito do impeachment, com a expectativa da resposta do Supremo Tribunal Federal (SFT) na quarta-feira e com entendimentos opostos da Câmara dos Deputados e do Senado criaram um clima de confusão que reduz a mobilização popular. “O processo está todo ainda embolado. Não tem uma definição de nada, então geralmente as pessoas ficam confusas”, disse.

O Palácio do Planalto preferiu adotar a cautela. O ministro da Secretaria de Comunicação, Edinho Silva, afirmou que as manifestações são “fruto da democracia”. Vice-líder do PT na Câmara, o deputado Paulo Teixeira (SP) acredita que a tendência é que, daqui por diante, as pessoas que defendem a democracia se afastem das manifestações. “Elas vão perceber que esse processo açodado é ruim para o Brasil”, disse o petista.

Senadores relacionados:

Órgãos relacionados:

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Confrontos no Rio e em Belém

Apesar do clima em geral pacífico nos atos pró-impeachment de ontem, algumas cidades registram confrontos. No Rio de Janeiro, houve um momento de tensão quando um policial militar apontou a arma para um grupo de skatistas em Copacabana. Eles participavam de encontro na Avenida Atlântica e foram confundidos com petistas pelos organizadores do protesto, porque usavam capacetes vermelhos. A PM atuou para dispersar o grupo.

Os manifestantes levaram uma grande bandeira verde e amarela com a palavra “impeachment”. A PM não fez estimativa de público, mas os organizadores calcularam entre 60 mil e 100 mil pessoas.

Em Belém (PA), integrantes da Central Única dos Trabalhadores (CUT) entraram em confronto com manifestantes que pediam a saída da petista. Defensores do impeachment vaiaram integrantes da entidade que discursavam em um carro de som. Para que o protesto pudesse continuar, policiais militares interviram e solicitaram que os membros da CUT se retirassem. Ninguém chegou a ser detido. A CUT, junto com outros movimentos ligados ao PT, marcou manifestações de defesa do governo Dilma para a próxima quarta-feira. De acordo com a polícia militar, 1,2 mil pessoas participaram do ato na capital paraense. O deputado Eder Mauro (PSD-PA), delegado de polícia licenciado, chamou a atenção ao simular a prisão do ex-presidente Lula, algemando-o, durante o protesto. Um grupo de 80 manifestantes ligados ao PT e a partidos de esquerda gritou palavras de ordem contra o deputado, chamando-o de “fascista”, em frente ao Teatro da Paz, na Praça da República.

 

Belo Horizonte

Em Belo Horizonte (MG), o alvo de confusão foi um boneco inflado do ex-presidente Lula. Um homem de aproximadamente 30 anos foi detido por tentar furá-lo. Houve tumulto na Praça da Liberdade no momento em que o homem era levado para um veículo da Polícia Militar, que lançou gás lacrimogêneo para conter as pessoas. De acordo com a PM, cerca de 3 mil pessoas se concentraram na Praça da Liberdade e na Praça Sete. Em João Pessoa (PB), durante caminhada, que reuniu 300 manifestantes, houve um princípio de confronto com moradores da região que não concordavam com o protesto. Eles trocaram empurrões e a Polícia Militar separou os grupos para evitar que o clima se agravasse.

Em várias cidades, manifestantes cobraram políticos pelo seu posicionamento sobre o impeachment. Um dos principais líderes do movimento de defesa de Dilma, o governador do Maranhão, Flávio Dino (PCdoB), foi alvo do protesto em São Luis. Durante a caminhada pela avenida dos Holandeses, os manifestantes gritavam “Fora, Dilma! Fora, PT! Fora, Flávio Dino! Fora, PCdoB!”. O deputado Rubens Junior (PCdoB-Ma), autor de ação no Supremo Tribunal Federal (STF), também foi criticado.

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Menos gente em Brasília

CRISE NA BASE » Vestindo verde amarelo, seis mil pessoas foram à Esplanada, segundo a PM. Para os organizadores, havia 20 mil
Por: Marcella Fernandes e Bernardo Bittar

Marcella Fernandes

Bernardo Bittar

 

Publicação: 14/12/2015 No primeiro ato após o início da tramitação do processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff no Congresso Nacional, manifestantes foram à Esplanada dos Ministérios ontem pressionar pela saída da petista e protestar contra a corrupção. A estimativa da Polícia Militar é de que 6 mil pessoas tenham ido ao local, enquanto os organizadores sustentam que foram 20 mil. Considerado um termômetro para medir a pressão que as ruas podem exercer sobre os deputados, os números são inferiores aos das outras manifestações anteriores. Em março, foram 50 mil. Já em abril e em agosto, 25 mil, de acordo com a PM.

Na manhã de ontem, a movimentação começou às 10h, em frente ao Museu da República, e acabou por volta das 12h30, antes do horário previsto pelos organizadores. Manifestantes conduziram um caixão com uma caricatura de Dilma, alvo de xingamentos, e uma bandeira do PT, no gramado em frente ao Congresso Nacional. Os manifestantes disseram que era o “enterro do PT”. O caixão foi queimado ao final do ato. A previsão era de que a encenação acontecesse às 13h, mas, como o protesto estava disperso e havia risco de chuva, o fim foi antecipado.

Com o caixão levantado nos braços, manifestantes ameaçaram ultrapassar a barreira feita pela Polícia Legislativa para evitar a invasão do Congresso. A Polícia Militar negociou e o impasse foi resolvido. Não foram registrados incidentes. Alguns manifestantes entraram no espelho d’água. Entre eles, uma mulher fantasiada de Dilma. A maioria dos participantes usava roupas com as cores verde e amarelo, assim como nos outros protestos. Desta vez, o boneco gigante do ex-presidente Lula, apelidado de “Pixuleco”, não estava presente, mas sim uma boneca da presidente com o nariz semelhante ao do Pinóquio, produzida pelo Movimento Brasil Livre (MBL).

 

Hino

Antes do enterro, foi cantado o Hino Nacional, após a leitura de um manifesto que pedia coragem aos parlamentares. “Queremos uma nova fase de esperança e mudança, queremos voltar a bater no peito e sentir orgulho do nosso Brasil”, dizia o texto no panfleto distribuído aos manifestantes. O juiz Sérgio Moro, responsável pela coordenação das investigações da Operação Lava-Jato, foi homenageado com máscaras e bonecos. “O povo está mostrando de que lado está. Vamos dar um basta a esse governo do PT. Impeachment faz parte da democracia!”, disse o deputado Izalci (PSDB-DF).

Durante o ato, os organizadores estimulavam os manifestantes a mobilizarem conhecidos para irem às ruas. “Infelizmente, faltou corpo aqui. As pessoas querem mudanças, mas evitam lutar. O país afundou, estamos descendo em um elevador. Lamento”, afirmou o policial civil Alexandre Azambuja, 49 anos. Em vez de fazer caminhada ou passear no Eixão, atividades semanais da família, ele foi para a Esplanada com a esposa, a servidora pública Ana, de 44 anos, e os filhos, Carol, 23 anos, e Marcelo, 20 anos, ambos universitários. “É a primeira vez que eles presenciam isso. Trata-se de democracia, e é com ela que faremos um país melhor”, disse Ana.

A consultora imobiliária Michela Domingues, 40, ficou zanzando em frente ao Congresso, enrolada na bandeira nacional. “Amo meu país e não quero que ele continue sendo atacado e roubado como ocorre hoje”, reclamou. O adereço, comprado na época da Copa do Mundo, chamou a atenção dos presentes e serviu como chamariz para os conectados à internet. “Queremos mostrar, nas redes sociais, que fizemos nossa parte”, explicou o técnico em informática Luciano Moreira, 31 anos.

 

Frase

“Infelizmente, faltou corpo aqui. As pessoas querem mudanças, mas evitam lutar. O país afundou, estamos descendo em um elevador. Lamento”

Alexandre Azambuja, manifestante

Órgãos relacionados:

  • Congresso Nacional