O Estado de São Paulo, n. 44.670, 17/05/2016. Política, p. A5

PF apura eventual atuação de petista em venda de MPs

Novo inquérito da Zelotes apura se ex-presidente Lula, ex-ministros e outros agentes políticos participaram ou foram vítimas de esquema

Por: Fábio Fabrini / Andreza Matais

 

Em ofício enviado à Justiça, o delegado da Polícia Federal Marlon Cajado afirmou que um inquérito em curso na Operação Zelotes apura se o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e outros políticos e agentes públicos estão envolvidos em suposto esquema de “venda” de medidas provisórias no governo federal.  A lista apresentada pelo policial inclui também o secretário executivo do Ministério da Fazenda, Dyogo Oliveira, a ex-ministra da Casa Civil Erenice Guerra e o ex-chefe da gabinete de Lula Gilberto Carvalho.

O documento, antecipado pelo estadão.com.br, foi enviado na última terça-feira ao juiz Vallisney de Souza Oliveira, da 10ª Vara Federal em Brasília. Conforme Cajado, a investigação é necessária para atestar se outros servidores públicos e autoridades, além dos já denunciados à Justiça, foram corrompidos para facilitar a edição das MPs ou se apenas foram vítimas de tráfico de influência praticado por lobistas interessados nas normas.

O ofício de Cajado visa rebater críticas de advogados de defesa da Zelotes, que alegam haver um inquérito “paralelo” investigando os mesmos fatos já denunciados à Justiça. Eles pedem que o procedimento seja trancado. Na 10ª Vara, tramita ação penal que avalia a conduta de 14 réus.

O delegado argumentou que, embora dois ex-servidores públicos já estejam denunciados - a ex-assessora da Casa Civil Lytha Spíndola e o ex-diretor de Comunicação do Senado Fernando Mesquita -, “os demais documentos juntados aos autos apontavam para eventuais colaborações de outros servidores públicos para a consecução dos interesses da organização criminosa”.

“Buscando-se evitar conclusões precipitadas, fez-se necessária a instauração de novo procedimento policial (sic) tentar alcançar a verdade real sobre sobe os fatos apurados, isto é, se outros servidores públicos foram, de fato, corrompidos e estariam associados a essa organização criminosa ou se esta estaria ‘vendendo fumaça’, vitimando-os e praticando tráfico de influência com relação aos mesmos, a saber, Erenice Alves Guerra, Dyogo Henrique e Oliveira, Nelson Machado, Luiz Inácio Lula da Silva”, escreveu o delegado.

 

Improrrogável. Cajado alega que a denúncia contra parte dos investigados no caso das MPs, já aceita e convertida em ação penal, foi oferecida porque investigação a respeito era improrrogável por envolver pessoas presas.

Ele disse que o outro inquérito foi aberto para averiguar a possibilidade de “corrupção” dos outros servidores, pois ainda estava pendente a análise de várias provas, incluindo o material apreendido em computadores.

Lula depôs na Zelotes em janeiro. O Estado apurou que, na ocasião, o delegado já queria ouvi-lo como investigado, mas, temendo repercussão política, a defesa do ex-presidente fez um apelo para que ele falasse como informante.

Lula era presidente quando duas das medidas sob suspeita foram editadas, a MP 471/2009 e a MP 512/2010. O filho caçula do petista, Luís Cláudio Lula da Silva, recebeu R$ 2,5 milhões do lobista Mauro Marcondes Machado, um dos lobistas presos na Zelotes, acusado de atuar no suposto esquema de corrupção para viabilizar as normas, que prorrogaram incentivos fiscais de montadoras de veículos.

A PF suspeita de que os pagamentos possam estar relacionados à edição de uma terceira MP, a 627/2013, e também à compra de caças pelo governo brasileiro.

 

OPERAÇÃO ZELOTES

 

● Procuradoria denunciou 16 pessoas por envolvimento na suposta negociação ilícita para aprovação de medidas provisórias. A ação faz parte da operação, que apurava corrupção no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf). Depois, as investigações avançaram para o caso das MPs

 

Lula

Em ofício à Justiça Federal, o delegado da Polícia Federal Marlon Cajado afirmou que um inquérito em curso na Zelotes apura se mais agentes públicos e políticos estão envolvidos na suposta “compra” de medidas provisórias, entre eles o ex-presidente Lula

 

Linha de apuração

O objetivo, segundo o delegado da PF, é apurar se esses servidores e ex-servidores foram corrompidos ou foram vítimas de tráfico de influência exercido pelo grupo acusado de atuar no governo e no Congresso para viabilizar a edição das MPs

 

A MP 471

 

1 Análise da MP passou pelos seguintes ministérios:

Ciência e Tecnologia : (Sérgio Machado Rezende)

Desenvolvimento, Indústria e Comércio : (Miguel Jorge)

Fazenda: (Guido Mantega)

Casa Civil : (Dilma Rousseff)

 

Além da MP 471/2009, estão sob suspeita de “encomenda” as MPs 512/2010 e a 627/2013

 

2 Em 20 de novembro de 2009, então presidente Lula assina MP 471, esticando de 2011 a 2015 política de descontos sobre imposto de carros

 

A FRAUDE

● Em 11 e 19 de novembro de 2009, representantes da Mitsubishi e da Hyundai no Brasil firmam contratos com consultorias para pleitear prorrogação de benefícios fiscais

 

Em 24 de março de 2010, o Congresso aprova a Medida Provisória e a converte em lei

 

● Em 15 de outubro de 2010, e-mails revelam “acordo para aprovação da MP 471” e que um dos sócios das consultorias teria pactuado, mas não cumpriu, entrega de R$ 4 milhões a “pessoas do governo no PT”

Órgãos relacionados:

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Para advogado, inquérito é sobre ‘vitimização’

 

O advogado Cristiano Zanin Martins, que representa Luiz Inácio Lula da Silva, afirma que o ofício encaminhado pelo delegado da Polícia Federal não muda formalmente a situação do ex-presidente no inquérito.

“O delegado está investigando a possível ‘vitimização’ de outras pessoas, entre elas Lula.

Estão investigando se estavam ‘vendendo fumaça’, usando o nome do ex-presidente”, afirmou o advogado.

De acordo com Martins, não “faria sentido” o delegado mudar a condição de Lula de informante para investigado em menos de um mês.

“O ex-presidente foi ouvido no dia 7 de janeiro na condição de informante. Não faria sentido o delegado mudar essa condição em um prazo tão exíguo, sem que tenha surgido algum fato novo”, afirmou o advogado.

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Ministério Público desarquiva apuração sobre caças suecos

Por: Andreza Matais / Fábio Fabrini / Fausto Macedo

 

Novos indícios levantados pela Operação Zelotes levaram o Ministério Público Federal em Brasília a desarquivar inquérito civil instaurado no ano passado para apurar suspeitas de irregularidades na compra dos caças suecos Gripen pela Força Aérea Brasileira (FAB). Há suspeitas de corrupção e superfaturamento no negócio, iniciado no governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e fechado na gestão de Dilma Rousseff.

Conforme a Procuradoria da República no Distrito Federal, a medida se deve à descoberta, no âmbito da Zelotes, de novos indícios de que o contrato internacional firmado com a empresa sueca SAAB pode ter resultado de possível influência indevida do lobista Mauro Marcondes Machado e a mulher dele, Cristina Mautoni.

Uma das descobertas foi a de que Marcondes intermediou interesses da fabricante dos caças no governo brasileiro. A suspeita é de que houve possível suborno de agentes e ex-agentes públicos federais.

O casal está preso desde outubro de 2015 e atualmente responde a uma ação penal proposta pela força-tarefa da Zelotes por suspeita de pagar propina a agentes públicos em troca da edição de medias provisórias que beneficiaram o setor automotivo.

No despacho, o procurador da República Anselmo Henrique Cordeiro Lopes diz que a decisão de reabrir a investigação levou em consideração“ a superveniência de novos indícios que colocam em dúvida a idoneidade da contratação da empresa SAAB”.

Além disso, o procurador determinou que tanto o Ministério da Defesa quando a SAAB sejam oficiadas para que forneçam informações atualizadas sobre o caso. Outra providência foi a solicitação de todos os dados obtidos na Zelotes que possam interessar na instrução do inquérito civil, medida que já recebeu o aval dos integrantes da força-tarefa.

O caso será investigado pelo Núcleo de Combate à Corrupção do MPF em Brasília. Se confirmadas irregularidades, a apuração pode resultar tanto numa ação civil contra eventuais envolvidos quanto numa denúncia criminal. O Estado publicou em novembro e - mails revelando que o casal atuou no lobby dos caças e tentou acionar o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva para tratar do assunto.

Em depoimento à Polícia Federal, em janeiro, no âmbito da Zelotes, Lula foi questionado se pagamentos feitos pela Marcondes & Mautoni à LFT Marketing Esportivo tinham relação com os caças. Lula considerou a hipótese um “absurdo”. A LFT pertence a Luís Claudio Lula da Silva, filho mais novo do petista, e recebeu R$ 2,5 milhões da Marcondes entre 2014 e 2015. Ele alega que prestou serviços de consultoria em sua área de atuação, o esporte. O arquivamento do inquérito ocorreu em agosto, diante da falta de “elementos que justificassem a continuidade da investigação”. / A.M., F.F. e FAUSTO MACEDO

 

Negócio

A empresa sueca SAAB foi contratada pelo governo brasileiro em outubro de 2014 após longa negociação. O montante total do negócio chega a R$ 4,748 bilhões (valores de janeiro de 2015).

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Dilma diz que vetou emendas de medida

Por: Fábio Fabrini

 

Em ofício ao juiz Vallisney de Souza Oliveira, da 10.ª Vara da Justiça Federal, em Brasília, a presidente Dilma Rousseff afirmou desconhecer fatos relacionados ao suposto esquema de “compra” de medidas provisórias para favorecer montadoras de veículos com incentivos fiscais. No documento, ela ainda argumentou ter vetado emendas a uma das normas, de interesse de investigados na Operação Zelotes.

Dilma era chefe da Casa Civil e, mais tarde, presidente quando as normas sob suspeita foram editadas pelo Planalto e aprovadas pelo Congresso. “Esclareço a Vossa Excelência que não detenho qualquer informação ou declaração a prestar acerca dos fatos narrados na denúncia ofertada nos autos da ação penal em curso nesse juízo ou sobre as pessoas indicadas na referida denúncia”, escreveu a presidente.

A pedido dela, a Subchefia de Assuntos Jurídicos da Casa Civil requereu que o juiz não autorize mais nenhum depoimento de Dilma sobe o caso. Argumentou que o requerimento já apresentado para que ela seja ouvida, da defesa do réu Eduardo Valadão, não traz “qualquer elemento” que indique a participação dela nos fatos narrados.

A Casa Civil ressalta que não há, no pedido para a presidente ser ouvida, menção a fato que, ainda que indiretamente, poderia ser de conhecimento dela. A pasta diz que a denúncia cita apenas episódio em que Lytha Spíndola, ex-assessora da Casa Civil e ré da Zelotes, teria atuado para impedir veto de Dilma a emendas à MP 512/2010, de interesse de montadoras de veículos. “Todavia, importa destacar que a presidenta vetou as emendas. Logo, não há mais nada a esclarecer para além dos termos da anexa declaração”, afirmou o subchefe para Assuntos Jurídicos da Casa Civil, Jorge Rodrigo Araújo Messias. / F.F.

Órgãos relacionados:

  • Congresso Nacional