O globo, n. 30.165, 09/03/2016. País, p. 3

Governo tenta esfriar ânimos

Preocupado com violência, Planalto pede a apoiadores para não irem às ruas no dia 13

Por: EDUARDO BARRETTO/ EVANDRO ÉBOLI

 

BRASÍLIA- A reação de petistas e da militância antiimpeachment aos protestos do próximo domingo preocupa o Palácio do Planalto e dirigentes do PT, que temem a ocorrência de confrontos violentos entre manifestantes pró e contra o governo Dilma Rousseff. Ontem, esse assunto dominou algumas reuniões, e ministros pediram a líderes do PT e da base aliada que parem de insuflar os militantes a irem às ruas no domingo, mesmo dia do ato contra o governo. Há um grande receio de que o próprio governo seja criminalizado pela eventual radicalização entre os manifestantes.

O ministro da Secretaria de Governo, Ricardo Berzoini, fez o pedido a líderes do governo, em reunião no Planalto. Na véspera do encontro, o presidente do PT, Rui Falcão, já tratara do tema com ministros, e Berzoini começara a telefonar a alguns parlamentares para que não estimulassem militantes a um enfrentamento direto com opositores na rua e escolhessem outro dia para manifestarem- se.

Segundo os líderes aliados, Berzoini disse achar um erro manifestações opostas no próximo dia 13. O ministro disse que o PT não está convocando militantes para atos a favor do governo, e a própria presidente Dilma está ligando para petistas nos estados, sugerindo que façam manifestação em outro dia.

— O ministro disse que está ligando para os estados, e que o governo não quer passar a ideia de que está dividindo o país — contou o deputado Domingos Neto ( PROS- CE).

 

TEMOR DE CRIMINALIZAÇÃO

No Planalto, a avaliação é que, se houver protestos em defesa de Lula também no domingo, o ato pró- impeachment pode ficar ainda mais atrativo para quem reprova o governo. Além disso, há o receio de que, com ânimos exaltados dos dois lados, os confrontos ideológicos transformemse em violência física. Isso criminalizaria o protesto do PT e desgastaria o governo.

— Imagine se tiver confusão, se alguém sair ferido. É uma possibilidade muito real com tudo o que está aí — afirmou um auxiliar de Dilma.

O risco de algum manifestante, seja do lado que for, sofrer algo mais sério, e até mesmo morrer, é a principal preocupação. A expressão “cadáver para jogar no colo do PT” foi ouvida ontem entre auxiliares de Dilma. A frase faz menção à declaração do teólogo Leonardo Boff, que publicou uma mensagem em seu Twitter na segundafeira, republicada por Rui Falcão. “Nas manifestações de apoio a Lula e Dilma deve se evitar o confronto violento. Os golpistas buscam um cadáver para chamar as Forças Armadas”, escreveu Boff.

— Quanto mais estabilidade, melhor para o governo. Estamos desmobilizando para que as manifestações aconteçam em outro dia. É assim em uma democracia — disse um assessor do palácio.

Dilma Rousseff, em solenidade do Dia Internacional da Mulher, afirmou que os governos precisam de “paz”, principalmente para enfrentar crises.

— Ter um quadro de paz é fundamental. Os governos precisam de paz para que nós tenhamos condições de enfrentar a crise e retomar o crescimento — afirmou a presidente, que fez um apelo pelo diálogo e unidade do Brasil.

O governo alerta ainda que há uma outra preocupação que pode acirrar mais os ânimos: as decisões que o juiz Sérgio Moro possa vir a tomar até a data da manifestação.

— Nesse ritmo, o Moro pode colocar mais gente nas ruas. Decidir por condenações, vai insuflar os que são contrários ao governo. Por outro lado, pode também estimular os que defendem o governo. Acho que o melhor seria o juiz Moro aguardar esse dia 13 passar e depois anunciar suas decisões — disse um parlamentar ligado ao governo, que pediu para não ser identificado.

Pela oposição, o líder do DEM no Senado, Ronaldo Caiado ( GO), solicitou ao Ministério da Justiça proteção policial aos manifestantes próimpeachment.

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Alckmin diz que só manifestação contra Dilma será na Avenida Paulista

Ato pelo Dia Internacional da Mulher em São Paulo apoia presidente e provoca confusão

Por: LUIZA SOUTO, STELLA BORGES E RENAN XAVIER

 

-SÃO PAULO E BRASÍLIA- No próximo domingo, a Avenida Paulista será palco, a partir das 15 horas, de um protesto pró- impeachment, organizado na internet por movimentos contra a presidente Dilma. Desde o início desta semana há especulações de que o local também receberia um ato de apoiadores da presidente. Ontem, o governador Geraldo Alckmin ( PSDB) descartou a realização de dois protestos no mesmo dia na Paulista. Ele afirmou que permitirá que no local seja realizado apenas o ato contra Dilma.

— Havia uma solicitação para uma outra manifestação no sentido contrário e nós dissemos que no mesmo local e horário não pode. Esse pleito a favor do impeachment e contra a corrupção já estava agendado há mais de um mês, nem tinha nada a ver com a operação que ocorreu na sexta- feira passada — disse Alckmin, em entrevista a rádio Jovem Pan, referindo- se a 24 ª fase da Operação Lava- Jato, que levou o ex- presidente Lula a depor coercitivamente.

À noite, em Brasília, Alckmin declarou que o esquema de segurança foi montado e que os manifestantes poderão circular em segurança.

— A polícia está preparada e nós vamos trabalhar para que as manifestações ocorram em horários ou locais diferentes.

Na internet, desde anteontem, um movimento intitulado “Sem medo de ser feliz” está convocando simpatizantes para se contrapor ao ato que defenderá o impeachment de Dilma na Paulista. Este evento, porém, está marcado para outro local e horário: 11 horas, na Praça Roosevelt. Outras manifestações estão previstas em mais seis capitais — Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Brasília, Recife, Porto Alegre e São Luís.

O governador do Rio de Janeiro, Luiz Fernando Pezão ( PMD), afirmou que não recebeu nenhuma recomendação por parte do governo federal em relação à segurança das manifestações: — Vai ser tranquilo, como sempre. Ontem, a UNE informou que o ato pró- Dilma se trata de um evento organizado por produtores culturais. O anúncio do evento em uma rede social diz: “No próximo domingo, dia 13 de março, vamos gritar contra a crescente onda de ódio e intolerância que tomou conta do país nos últimos tempos. Vamos celebrar juntas e juntos a Democracia, repudiando os movimentos conservadores que avançam no Brasil”.

O presidente do PT, Rui Falcão, tem dito que o partido não está organizando nenhum protesto para domingo. “Vamos participar, organizadamente, das manifestações do dia 8 de Março, Dia Internacional da Mulher, e das datas convocadas pela Frente Brasil Popular: 18 e 31 de março”, escreveu ele anteontem.

Um ato realizado ontem em São Paulo por movimentos sociais pelo Dia Internacional da Mulher virou palco para uma defesa pública de Dilma. Além de pedir igualdade de direitos, legalização do aborto e equiparação de salários, o evento teve faixas e palavras de ordem em apoio à presidente. Uma faixa à frente da marcha dizia: “Somos todas Dilma”. Adesivos colados nas roupas de parte das manifestantes pregavam: “Não vai ter golpe”. O ex- presidente Lula, investigado pela Lava- Jato, também recebeu solidariedade. Uma grande bandeira vermelha tinha a imagem do ex- presidente e a frase “Lula, eu respeito; Lula, eu defendo”. A Polícia Militar estimou que cerca de 2 mil pessoas participaram do ato. Um trecho da Avenida Paulista foi fechado para a passagem do grupo no fim da tarde.

 

GRITOS DE “NÃO VAI TER GOLPE”

Apesar da maioria pró- Dilma, uma confusão foi registrada no início do ato entre manifestantes favoráveis e contra a presidente. De cima de um carro de som, uma mulher gritou: “Fora, Dilma”. Logo depois, uma das organizadoras do evento anunciou que a pauta da manifestação seria sobre questões ligadas à mulher e não à política. O discurso, porém, foi abafado com gritos de “não vai ter golpe” e vaias. Outra manifestante endureceu o discurso. — Viva às mulheres, mas viva também aos trabalhadores. Precisamos ficar em vigília e tomar cuidado com a direita golpista. Não vai ter golpe — bradou, em defesa à manutenção de Dilma no poder.

Um grupo pediu calma e respeito às diferentes opiniões. A farmacêutica Josefa Alves da Silva, de 63 anos, participava pela primeira vez do tradicional ato no Dia Internacional das Mulheres, mas se disse decepcionada com o governo Dilma.(* Estagiário sob supervisão de Maria Lima).

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Ministro do STF: ‘ receio um cadáver’

Por: Cristiane Jungblut

 

BRASÍLIA- O ministro do Supremo Tribunal Federal Marco Aurélio Mello disse ontem que teme conflitos nas ruas, durante as manifestações marcadas para o próximo dia 13, e alertou inclusive para o risco do “surgimento de um cadáver”. Marco Aurélio ressaltou que as manifestações são democráticas, mas devem ser realizadas em dias diferentes.

— Que cada segmento saia em um determinado dia. Vamos evitar o pior. Sim, receio um conflito. Receio, inclusive, o surgimento de um cadáver. E a História revela o que leva a esse surgimento — disse o ministro do Supremo.

Perguntado se um dos lados estava “provocando” o conflito, Marco Aurélio respondeu:

— Não, são forças antagônicas. As manifestações devem ocorrer porque estamos num estado democrático de direito. Mas que cada um tenha o seu dia. Não interessa ao povo brasileiro o conflito

O senador Renan Calheiros ( PMDB- AL), por sua vez, disse que, como presidente do Congresso, tem que manter o bom senso no momento em que a sociedade está sendo “bombardeada” por informações e boatos.

— Não é papel do presidente do Congresso colocar fogo na crise. O papel do presidente do Congresso é, mais do que nunca, pela serenidade, pelo bom senso, pelo equilíbrio. Tivemos aqui em 64, um presidente do Senado que passou do limite, do equilíbrio e fraturou a democracia — disse Renan.

A referência de Renan foi a Auro de Moura Andrade, que, na passagem de 1 º de abril para 2 de abril de 1964, declarou vaga a Presidência da República, embora o então presidente João Goulart estivesse em território nacional. A decisão abriu caminho para a instalação da ditadura militar.

Em novembro de 2013, o Congresso aprovou projeto de resolução que anulou aquela sessão ( Cristiane Jungblut)

Senadores relacionados:

  • Renan Calheiros

Órgãos relacionados:

  • Congresso Nacional
  • Senado Federal