Correio braziliense, n. 19287, 16/03/2016. Política, p. 6

NOMEAÇÃO DE LULA EM BANHO-MARIA

CRISE NA REPÚBLICA » Lula e Dilma se reuniram ontem à noite no Palácio da Alvorada durante quatro horas e meia. O encontro terminou sem anúncio oficial
Por: NAIRA TRINDADE E PAULO DE TARSO LYRA

NAIRA TRINDADE

PAULO DE TARSO LYRA

 

A bombástica delação premiada do Senado Delcídio do Amaral, homologada ontem pelo Supremo Tribunal Federal (STF), deixou em banho-maria a efetivação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) no governo da presidente Dilma Rousseff (PT). O ex-petista, que deixou o partido oficialmente ontem, diz que Lula tentou comprar o silêncio do ex-executivo da Petrobras Nestor Cerveró, preso na Operação Lava-Jato. O encontro terminou às 23h25, após quatro horas e meia, sem nenhum anúncio. Existe a expectativa de que a decisão seja oficializada hoje pela manhã. Nos bastidores, circula a informação de que a presidente também pode anunciar uma minireforma ministerial.

Caso aceite assumir a Secretaria de Governo, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva terá como primeiro desafio rearranjar as cadeiras do tripé econômico para conseguir dar uma resposta ao mercado financeiro. Uma das condições para o petista bater o martelo da definição se aceitará mesmo o cargo dentro do Palácio do Planalto está na liberdade que a presidente Dilma Rousseff o dará para trocar os ministros da área econômica. Além de cuidar da articulação política, Lula deve assumir a liderança do chamado Conselhão, Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social.

Minutos antes de ir ao encontro com Dilma, a maior estrela petista recebeu o senador Lindberg Farias (PT-RJ) no hotel Royal Tulip e garantiu que ainda estava indeciso. Queria primeiro conversar com Dilma e depois com oPresidente do SenadoRenan Calheiros (PMDB-AL), antes de anunciar qualquer medida. O senador, porém, fez um apelo para que o colega petista “ajude o país a vencer este momento de crise”.

“Ele aumenta muito capacidade de articulação política do governo. O presidente Lula é respeitado por muita gente do PMDB. Ele tem uma característica de saber escutar, então aumenta muito a chance de vencer a batalha do impeachment. A gente sabe das dificuldades. Então, com a entrada do presidente Lula, o governo sai fortalecido na batalha do impeachment”, afirmou. A oposição alega que a possível nomeação do petista é uma manobra para ele se revestir de foro privilegiado e evitar ser julgado pelo juiz Sérgio Moro, responsável pelos processos relativos à Operação Lava-Jato. Ontem, o ministro do STF Marco Aurélio Mello refutou as suposições de que a Corte seria benévola com o ex-presidente. O magistrado lembrou que o Supremo já condenou políticos no mensalão.

Previamente apelidado de superministro, o ex-presidente deverá acumular funções no governo da presidente Dilma. Olhará atentamente para a economia, fará a ponte entre governo e o legislativo, recebendo deputados e senadores e ainda ouvirá a sociedade no recentemente reativado Conselhão. O conselho é um projeto do ex-presidente, criado em 2003, para ouvir as demandas de representantes do governo, trabalhadores e empresários. Muito usado pelo petista, que era considerado um “bom ouvinte”, o Conselhão foi escanteado no governo Dilma e ressurgiu das cinzas no auge da crise política para tentar salvar o governo.

Ao longo do dia, antes da reunião entre Lula e Dilma, no Planalto, assessores ligados a presidente calculavam estarem 99% definido a inclinação do petista em aceitar o ministério. “Ele é a última cartada do governo”. Na segunda-feira, inclusive, já tendendo a assumir a pasta, Lula teria procurado o vice-presidente, Michel Temer, para chancelar a manutenção do apoio do partido ao governo. Lula precisa evitar uma debandada do partido aliado, que se esquiva de tratar do assunto a fim de respeitar o prazo de 30 dias estipulado sábado na convenção nacional da legenda. Isso só voltará ao debate em reunião do diretório.

Antes de embarcar para Brasília, ontem, o ex-presidente ouviu apelos da cúpula do PT e também do presidente nacional do partido, Rui Falcão, para que se sensibilizasse pela importância de assumir o ministério e ajudar a presidente a dar um novo rumo ao país.