O globo, n. 30.163, 07/03/2016. País, p. 4

Nomeação para justiça corre risco no STF
Ministro diz que Constituição impede que membro do MP, caso de Wellington Lima e Silva, vá para Executivo.

Por: MARIA LIMA e EDUARDO BRESCIANI
 
- BRASÍLIA- Em meio ao tiroteio político com o avanço da Operação Lava- Jato, a presidente Dilma Rousseff deve sofrer um outro revés esta semana no Supremo Tribunal Federal ( STF) no julgamento da ação que discute a nomeação de Wellington Lima e Silva para o cargo de ministro da Justiça. Ministros da Corte ouvidos pelo GLOBO criticaram a falta de cuidado na observância da legislação constitucional e confirmaram que a jurisprudência existente indica que ele só poderá ser efetivado no cargo se pedir aposentadoria ou exoneração da carreira de promotor no Ministério Público. O relator da ação impetrada pelo PPS é o ministro Gilmar Mendes, e o julgamento está marcado para a quarta- feira.

Wellington já teve a nomeação suspensa na sexta- feira passada por uma liminar da Justiça Federal do Distrito Federal, concedida com base em questionamento levantado pelo DEM. Entre os precedentes que vêm sendo citados contra o ministro consta um voto de 2007 do atual presidente da Corte, Ricardo Lewandowski. Na ocasião, o ministro se posicionara contra a possibilidade de Luiz Fernando Delazari assumir a Secretaria de Segurança do Paraná por entender ser vedado aos membros do MP ocupar cargos no Executivo.

 

INDICAÇÃO DE JAQUES WAGNER

O ministro Marco Aurélio Mello diz que a Constituição tem uma cláusula explícita dizendo que integrantes do Ministério Público não podem exercer cargos no Executivo, ainda que colocados em disponibilidade. Diz que, embora Wellington seja um grande quadro, perante o texto constitucional, que deveria ter sido observado antes, ele não pode ser efetivado no cargo de ministro da Justiça:

— Isso tudo implica mais desgaste para o governo. A própria forma como saiu o ministro José Eduardo Cardozo não foi positiva. Estamos vivendo tempos estranhos, em que se exige temperança e serenidade, um momento crucial em que mais que nunca tem que se guardar os princípios e valores, agindo com punhos de aço, mas com luvas de pelica.

Para o ministro do Supremo, a decisão não será tomada com o intuito de criar dificuldades para o governo.

— Ninguém tem interesse em incendiar o país. O período é muito ruim. Mas, às vezes, é preciso piorar para melhorar — disse Marco Aurélio Mello.

A polêmica diz respeito a uma alínea do artigo 128 da Constituição. O texto afirma que é vedado aos membros do Ministério Público “exercer, ainda que em disponibilidade, qualquer outra função pública, salvo uma de magistério”. A interpretação que vinha sendo aplicada até agora é que tal proibição não se aplica a membros do MP que tenham assumido antes de 1988, como é o caso do ex- ministro José Eduardo Cardozo. O problema é que Wellington só entrou no MP da Bahia em 1991.

— A jurisprudência do Supremo não é favorável, diz que ele tem de sair. Ou ele se aposenta ou pede exoneração — afirmou outro ministro do STF.

A nomeação de Wellington foi marcada por polêmica desde o início. Ele foi escolhido para substituir José Eduardo Cardozo, que vinha sob fogo cerrado do PT, inconformado pela “falta de controle” sobre a Polícia Federal. O promotor baiano foi indicado pelo ministro da Casa Civil, Jaques Wagner. Wellington foi procuradorgeral da Bahia por quatro anos na gestão do hoje colega de ministério.

 

ATUAÇÃO CONTROVERSA NA BAHIA

A atuação do novo ministro na Bahia é controversa. Parlamentares da oposição a Wagner afirmam que ele atuou como aliado fiel do governador, engavetando ações que poderiam criar embaraços à administração. Uma das ações citadas aponta que o governador teria direcionado para outros fins recursos recebidos de financiamentos internacionais que deveriam ser carimbados para ações específicas. Wellington não deu qualquer andamento à denúncia, feita em 2013.

A própria chegada do novo ministro ao cargo de procurador- geral do estado foi marcada por polêmica. Ele foi apenas o terceiro colocado na eleição realizada para o cargo pela categoria em 2010. Wagner ignorou os dois primeiros, que seriam ligados ao grupo do prefeito de Salvador, ACM Neto ( DEM), e indicou Wellington. Dois anos depois, porém, o procurador- geral conseguiu ser o mais votado e foi reconduzido.

Os petistas apostavam que o fato de ele vir do Ministério Público seria um atenuante para as críticas pela saída de Cardozo, que acabou deslocado para a AdvocaciaGeral da União ( AGU). Esperavam que, por ter conhecimento sobre investigação, tivesse condições de verificar se existiam ilegalidades na condução da Lava- Jato. A principal cobrança que existia era sobre as supostas escutas ilegais que teriam sido instaladas na Superintendência da PF em Curitiba, alvo de sindicâncias do órgão. De lá para cá, porém, a Lava- Jato passou a ser questionada diretamente pelo partido, especialmente após a condução coercitiva do ex- presidente Lula. Caso o STF confirme a tendência de não autorizar a posse, caberá a Wellington decidir se desiste da carreira de promotor ou de ser ministro.

 

“O período é muito ruim. Mas, às vezes, é preciso piorar para melhorar ”
Marco Aurélio Mello

Ministro do STF

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PT ameaça com expulsão quem fizer caixa 2

Candidatos terão que se comprometer a não aceitar doação de empresas

Por: Fernanda Krakovics

 

Quem quiser disputar as eleições municipais deste ano pelo PT terá que assinar documento se comprometendo a não fazer caixa dois. Assolado pelos escândalos da Operação Lava- Jato e do mensalão e com dois ex- tesoureiros presos, o partido ressalta, no “Compromisso Partidário do Candidato e da Candidata Petista”, que o financiamento empresarial está vedado pelo Supremo Tribunal Federal ( STF) e que o PT “proíbe a prática de caixa dois”. Segundo o documento, quem não seguir essa orientação estará sujeito à expulsão.

“O recebimento de qualquer doação de pessoa jurídica em determinada campanha será individualizado na pessoa do ( a) candidato ( a) beneficiado ( a), será considerado falta gravíssima, passível de punição disciplinar, e será de responsabilidade exclusiva do ( a) candidato ( a) beneficiado ( a), uma vez que o PT proíbe a prática de caixa dois e as doações de pessoas jurídicas”, determina o documento a ser assinado por postulantes a prefeito ou vereador.

O presidente do PT, Rui Falcão, disse que se quer responsabilizar cada candidato e suas campanhas, preservando o PT:

— Não se trata de suspeita com relação a ninguém, mas atitude cautelar.

O PT trata o mensalão, que resultou na prisão da cúpula do partido, como arrecadação de recursos “não contabilizados” para campanhas, e não como compra de votos no Congresso. Com exceção do então tesoureiro Delúbio Soares, que foi expulso — e depois aceito de volta —, ninguém foi punido pelo partido.

Agora, em delação premiada, dirigentes da Andrade Gutierrez disseram que a empresa pagou dívida de campanha da presidente Dilma Rousseff, em 2010. O pagamento não foi registrado na Justiça Eleitoral. Os executivos contaram ao Ministério Público que firmaram contrato fictício com a Pepper Comunicação para repassar R$ 6 milhões à campanha presidencial.

 

REELEGER HADDAD É PRIORIDADE

Desde o ano passado, o PT adotou como bandeira ética o fim do financiamento empresarial. O partido se antecipou ao STF e decidiu, em abril, que não aceitaria doação de empresas. A prática de caixa dois é enquadrada como crime de falsidade ideológica no Código Eleitoral. A pena é de até cinco anos de prisão e multa.

Durante as comemorações dos 36 anos do PT, semana passada, o partido reservou meio parágrafo, em seis páginas, para autocrítica. O documento “Em Defesa da Democracia” diz que os petistas estão “conscientes de que algumas práticas condenáveis da vida política brasileira terminaram impregnando segmentos do partido e resultaram em erros, equívocos e irregularidades”.

O PT pretende usar as eleições municipais para defender o partido, o ex- presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o mandato de Dilma. A prioridade é reeleger o prefeito de São Paulo, Fernando Haddad.

    Órgãos relacionados:

    • Congresso Nacional

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    Advogados de Lula protestam contra nota de procuradores

    Para defesa do ex- presidente, Ministério Público Federal antecipou juízo de valor
     

    - SÃO PAULO- Os advogados do expresidente Luiz Inácio Lula da Silva acusaram ontem os procuradores da força- tarefa da Lava- Jato de terem antecipado juízo de valor na nota divulgada anteontem, na qual reafirmaram a necessidade da condução coercitiva do petista.

    “A tentativa de vincular Lula a esquema de formação de cartel e corrupção da Petrobras apenas atende anseio pessoal das autoridades envolvidas na operação, além de configurar infração de dever funcional, na medida em que a nota emitida pelo MPF — tal qual a entrevista coletiva concedida pelo órgão — antecipou juízo de valor, o que é vedado pelo artigo 8 º da Resolução 23/ 2007, do Conselho Nacional do Ministério Público ( CNMP)”, diz a nota dos advogados Roberto Teixeira e Cristiano Zanin Martins.

    Os advogados afirmam que Lula jamais foi beneficiado ou participou de qualquer ato ilegal e que a condução coercitiva não tinha base legal. No sábado, os procuradores reagiram, por meio de nota, às reclamações geradas pela condução coercitiva de Lula para depor.

    O ex- presidente foi levado da casa dele, em São Bernardo do Campo, para o aeroporto de Congonhas, onde a Polícia Federal tem um posto. No texto, a força- tarefa diz que, nas 24 fases da Operação Lava- Jato foram expedidos 117 mandados de prisão e que em 116 “não houve tal clamor”, referindo- se ao caso de Lula. A defesa do expresidente respondeu:

    “O fato de a Operação LavaJato já ter emitido 117 mandados de condução coercitiva não tem o condão de legitimar a ilegalidade agora praticada contra o ex- presidente Lula, mas, ao contrário, serve de alerta para tantas outras arbitrariedades que poderão já ter sido praticadas nessa operação”.

     

    FORÇA- TAREFA DEFENDE MEDIDA

    Na nota, os procuradores dizem que, apesar de todo respeito que Lula merece, “esse respeito é- lhe devido na exata medida do respeito que se deve a qualquer outro cidadão brasileiro". A forçatarefa argumentou que o próprio Lula, ao apresentar habeas corpus para não depor ao Ministério Público de São Paulo, onde também é investigado, alegou que “o agendamento da oitiva do ex- presidente poderia gerar um grande risco de manifestações e confrontos”. As explicações sobre o tríplex no Guarujá e o sítio de Atibaia foram apresentadas por escrito.

    Por isso, segundo os procuradores, foi pedido o mandado contra Lula, justificado como medida de segurança pública. Os procuradores disseram ainda que era necessário que os depoimentos fossem prestados simultaneamente para evitar a coordenação de versões. Onze pessoas ligadas a Lula e a OAS foram levadas a depor coercitivamente, entre elas Fábio Luís, um dos filhos do ex- presidente.

    Os advogados de Lula manifestaram repúdio às declarações dos procuradores, alegando que a Justiça de São Paulo havia afastado a possibilidade de Lula e Marisa Letícia serem levados a depor coercitivamente e que o Ministério Público de São Paulo reconhecera a ausência de amparo legal para a medida.

    "Lula já prestou três depoimentos, dois à Polícia Federal e um ao Ministério Público Federal. Em nenhum destes houve qualquer confronto ou risco à ordem pública, porque marcados e realizados de forma adequada pelas autoridades envolvidas”, disse a defesa de Lula.