Correio braziliense, n. 19300, 29/03/2016. Política, p. 3

Planalto tenta montar estratégia

Por: Naira Trindade e Julia Chaib

LEGENDA DA FOTO: Temer e Renan, dois dos caciques peemedebistas: vice já avisou a Lula que o desembarque do PMDB é inevitável

 

Naira Trindade

Julia Chaib

 

A saída do primeiro ministro do PMDB da base aliada às vésperas da reunião que selará o rompimento oficial do partido forçou o governo, com o apoio do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a traçar rapidamente a estratégia de combate à guerra política que se inicia. Para atrair o maior número possível de aliados e conquistar votos contrários ao processo de impeachment na Câmara, o governo abrirá as negociações sobre quem vai ficar com os ministérios entregues pelo ex-aliado.

A presidente Dilma Rousseff deixará a critério dos ministros peemedebistas a entrega ou não dos cargos no primeiro escalão. “Eles têm influência na Câmara, sobre os outros deputados, e poderão decidir se se licenciam do partido para apoiar o governo e ficar nas pastas”, esclareceu um interlocutor palaciano próximo a petista. A expectativa do Palácio do Planalto é que quem ficar nas pastas terá de trabalhar para angariar votos contrários ao processo no Congresso.

À frente das articulações que tentavam conter a legenda, o ex-presidente Lula chegou a dizer, em entrevista a jornais estrangeiros, ontem, em São Paulo, que trabalharia com “parte” do PMDB. “Pelo que eu estou sabendo, os ministros do PMDB não saíram do governo e nem a Dilma quer que eles saiam. O que eu acho que vai acontecer é o que aconteceu em 2003: o governo vai construir ainda uma base com parlamentares do PMDB no Senado e na Câmara e vamos ter uma espécie de uma coalizão sem a concordância da direção”, definiu Lula, pela manhã.

A saída do ministro do Turismo, Henrique Eduardo Alves, altera pouco o cenário de negociações. No Palácio do Planalto, a visão é de que se precisa trabalhar com quem apoia o governo e usar os cargos para cooptar novos aliados. Há, porém, uma divergência se Dilma deve esperar a entrega das pastas, uma vez que ela trabalha contra o tempo. Um acordo informal previa a disponibilidade das cadeiras do PMDB em 12 de abril, quando vencem os 30 dias definidos pela convenção.

A avaliação é que a iniciativa de esperar os ministros colocarem as cadeiras à disposição deixa de ser interessante ao governo, que terá pouco tempo para negociar cargos em troca de votos. Pelos cálculos da comissão especial, a votação deve acontecer até 17 de abril. Pelo menos dois ministros do PMDB devem se manter fiéis à presidente Dilma. Na linha para serem beneficiados estão PP, PSB, PRB, PTN. Também há a possibilidade de o PSB voltar à base do governo. No Palácio do Planalto, assessores acreditam que, “pelo menos agora, os inimigos do governo estão claramente definidos”.

 

“Certa tristeza”

Na tentativa de conter a rebeldia do PMDB, Lula tentava se reunir com o vice-presidente Michel Temer. Na última quinta, Temer ligou para Lula dizendo que só não havia conversado com o ex-presidente porque ele não teria lhe procurado. “Não me recuso a conversar com o senhor, mas o senhor não me procurou”, disse Temer, segundo interlocutores. Marcaram o encontro para domingo, em São Paulo, e o vice, enfim, contou a Lula que não teria condições de conter o partido após a nomeação à revelia do ministro da Secretaria da Aviação Civil, Mauro Lopes.

Em São Paulo, Lula frisou que viria a Brasília se reunir mais uma vez com Temer. “Vou saber direito qual é a razão; às vezes, é um problema local”, afirmou, acreditando que as eleições de outubro pudessem implicar na decisão. “Tem vários estados que as pessoas não querem apoiar o governo porque são inimigos no PT no estado e agem assim. Então, o que eu acho: eu lamento, eu lamento. Eu vejo com uma certa tristeza o PMDB abandonar o governo.”

 

Colaborou Paulo de Tarso Lyr