Apelação rejeitada

15/04/2016

Em sessão convocada de emergência, o Supremo Tribunal Federal (STF) rejeitou, por 8 votos a 2, recurso movido pela Advocacia-Geral da União para tentar anular o processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff na Câmara dos Deputados. Com a decisão, está mantida para este domingo a votação no plenário da Câmara, na qual os parlamentares decidirão se aprovam ou não o relatório da comissão especial que acusa Dilma de cometer crime de responsabilidade. Se aprovado, o documento será enviado para o Senado, que decidirá se abre processo contra a presidente, o que resultará em seu afastamento por 180 dias.

A Advocacia-Geral da União alegou que a comissão cerceou o direito de defesa de Dilma ao discutir questões que não constavam do pedido original de impeachment, como a delação premiada do ex-senador Delcídio Amaral.

Para a maioria dos ministros do STF, porém, não houve cerceamento de defesa, como o governo alegou. O entendimento é o de que cabe à Câmara apenas decidir sobre a aceitação ou não da denúncia contra a presidente, cabendo ao Senado julgar as acusações.

Os ministros observaram que, no domingo, os deputados analisarão apenas as denúncias originalmente aceitas no processo, ou seja, uma “pedalada” fiscal envolvendo o Banco do Brasil e a edição de decretos de créditos suplementares sem o aval do Congresso Nacional.

A sessão do STF foi convocada em caráter extraordinário para ontem às 17h30, diante da urgência da definição das regras para a votação de domingo. Dos onze integrantes do tribunal, só Dias Toffoli estava ausente, por conta de viagem a trabalho ao exterior.

— Situações excepcionais exigem medidas excepcionais — comentou Lewandowski no início da tarde.

Em outra derrota para o governo, o Supremo Tribunal Federal (STF) confirmou o critério adotado pelo presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, para votação em plenário do processo de impeachment, estabelecendo que os deputados serão chamados por bancadas de estados alternadamente, em sequência Norte/Sul/Sul/Norte. Assim, a bancada de Roraima, o estado mais ao Norte do país, será a primeira votar. Em seguida, votarão os deputados do Rio Grande do Sul e assim por diante, até se chegar ao centro geográfico do país.

Os aliados do governo alegam que a regra adotada por Cunha visa a deixar por último os estados da Região Nordeste, onde o apoio ao impeachment é, em tese, menor.

A manutenção das regras de votação foi tomada no julgamento de dois mandados de segurança propostos pelos deputados Weverton Rocha (PDT-MA) e Rubens Pereira Júnior (PCdoBMA) e de uma ação direta de inconstitucionalidade (ADI) movida pelo PCdoB.

O relator da ação movida pelo PCdoB, ministro Marco Aurélio Mello, defendeu a ordem alfabética para a votação, critério usado no procesCunha

Palavra final. Os ministros Fachin, Teori e Fux, na sessão de ontem, convocada de emergência para julgar ações contra o processo de impeachment da presidente Dilma so de impeachment do ex-presidente Fernando Collor, em 1992. Depois dessa votação, o regimento da Câmara mudou, mas Marco Aurélio considerou que a regra anterior era mais democrática. Segundo o ministro, outras regras poderiam mudar o comportamento dos deputados. Eles poderiam ficar tímidos na hora de votar com a própria convicção, diante de um eventual placar já formado. Ninguém concordou.

O voto que completou a maioria foi o de Gilmar, que criticou o governo e suas tentativas de mudar a regra de votação do impeachment.

— A titular do cargo não tem mais condições de ser presidente. É curioso. Poderíamos caminhar para o deferimento da liminar no sentido de mudar a forma de votação. No momento seguinte se verificará: ah, mas não era o que queríamos. Não queríamos essa concentração, agora estados do Sul estão despejando votos contrários. Para jogador ruim, até as pernas atrapalham — afirmou Gilmar.

No caso dos mandados de segurança, a votação acabou empatada, com cinco ministros concordando com a regra estabelecida por Cunha e outros cinco sugerindo mudanças. A solução foi aplicar a regra segundo a qual, em julgamento de mandado de segurança, o empate significa a manutenção do ato atacado — no caso, a regra de votação estabelecida por Cunha.

Alguns ministros chegaram a ponderar que deveria ter obedecido a critérios geográficos de latitude para determinar a ordem dos estados, mas a maioria do STF decidiu que caberia apenas à Câmara interpretar esse detalhe.

Um dos ministros que concordaram com os deputados foi Ricardo Lewandowski, presidente do STF. Ele também queria que o critério da latitude fosse utilizado, mas acabou derrotado pelos colegas. Em tom de desabafo, ele afirmou que o tribunal tem legitimidade para rever atos do Legislativo, sem que isso seja uma interferência indevida do Judiciário no Legislativo.

— É o ato mais grave previsto na Constituição praticado pelo Congresso Nacional. É a mais grave sanção prevista, o afastamento da presidente. É o ato mais grave previsto na Constituição. Isso, se o presidente praticar crime de responsabilidade. É um ato político, sim. E quem é que disse que um ato político não é sindicável por parte do Judiciário? Não tenho nenhum problema. Como juiz da Suprema Corte do país, eu tenho legitimidade para rever os atos do Poder Legislativo — declarou Lewandowski.

O advogado-geral da União, José Eduardo Cardozo, que propôs uma ação pedindo a nulidade do da decisão tomada pela comissão especial da Câmara dos Deputados, alega que houve cerceamento de defesa.

Para Cardozo, houve irregularidades no relatório do deputado Jovair Arantes (PTB-GO). Arantes, segundo a AGU, incluiu novas acusações, como a delação de Delcídio, o que não seria permitido nessa fase da tramitação.

Outras ações ainda podem ser propostas, mas Cardozo não antecipou quais. Ele negou que a debandada de partidos da base, que decidiram apoiar o impeachment, tenha influenciado a decisão de acionar o STF.

— O momento para impetração era este. Até a aprovação do relatório, não sabíamos se as liminares seriam acolhidas ou não. A debandada dos partidos não influenciou em nada. Sempre disse que iria à Justiça no momento oportuno. Não é uma avaliação política que nos leva a esse mandado — disse.

Cardozo explicou que não discute o mérito do impeachment no mandado de segurança da Advocacia-Geral da União:

— Parlamentares julgariam fatos que não estão na acusação. Não sei quais fatos da Lava-Jato incriminam a presidente. A antecipação fere de morte o processo, a defesa da presidente. Não sei qual é a imputação de Lava-Jato. A presidente não tem nenhum inquérito contra si.

 

O globo, n. 30202, 15/04/2016. País, p. 3