O Estado de São Paulo, n. 44732, 07/04/2016. Política, p. A4

RELATOR VÊ INDÍCIO DE CRIME E RECOMENDA CONTINUIDADE DE IMPEACHMENT DE DILMA

Crise. Jovair Arantes (PTB-GO) aponta irregularidades em decretos assinados pela presidente sem autorização do Congresso, mas afirma que cabe ao Senado a decisão de mérito sobre as acusações contra a petista; sessão foi marcada por bate-boca entre deputados
Por: Daniel Carvalho /Daiene Cardoso/ Victor Martins

 

Daniel Carvalho

Daiene Cardoso

Victor Martins / BRASÍLIA

 

Relator do processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff, o deputado Jovair Arantes (PTB-GO) concluiu em seu parecer apresentado ontem haver indícios de que a petista cometeu crimes de responsabilidade e, por isso, deve ter seu impedimento julgado pelo Congresso Nacional. Levantamento realizado pelo Estado mostra que a Comissão Especial tem ao menos 32 votos favoráveis ao impeachment. São necessários 33 para que o parecer do relator seja aceito (mais informações nesta página). O deputado citou a abertura de créditos suplementares por decreto presidencial sem autorização do Legislativo e a contratação ilegal de operações de crédito, as chamadas pedaladas fiscais. Jovair repassou ao Senado a responsabilidade de decidir sobre a análise das denúncias decorrentes da Operação Lava Jato, inclusive as denúncias da delação premiada do ex-líder do governo no Senado Delcídio Amaral (sem partido-MS). Na prática, isso deixa em aberto a possibilidade de que as denúncias da delação sejam incluídas no processo pelos senadores. O texto de 128 páginas será discutido na comissão e deve ser votado na segunda-feira. Até o início da noite, já havia mais de 110 inscritos para a discussão, que pode entrar pelo fim de semana. O calendário gerou discussão. Governistas temem manobrada oposição para tentar votar o relatório antes de segunda-feira, com quórum reduzido. “A magnitude e o alcance das violações praticadas pela presidente da República, em grave desvio dos seus deveres funcionais e em quebra da grande confiança que lhe foi depositada, justificam a abertura do excepcional mecanismo presidencialista do impeachment”, pontuou Jovair em mais de três horas de leitura. Em seu voto, o relator rejeitou a legações da defesa, inclusive a que apontou que a deflagração do processo de impeachment foi motivada por vingança do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ). “Verifica-se haver indícios mínimos de que a presidente da República, senhora Dilma Vana Rousseff, praticou atos que podem ser enquadrados nos seguintes crimes de responsabilidades”, disse ele, para então listar os pontos da denúncia que acatou. Segundo Jovair, a denúncia apresentada pelos juristas Hélio Bicudo, Miguel Reale Júnior e Janaina Paschoal “preenche todas as condições relativas à sua admissibilidade”. Deputados aliados do Palácio do Planalto pretendem apresentar voto em separado para se contrapor ao parecer do relator. Ao comentar a edição dos decretos, Jovair afirmou que eles mostram “sérios indícios de inconstitucionalidade, ilegalidade e irresponsabilidade fiscal” e que, se confirmados “representam condutas gravíssimas e conscientes de desrespeito a um Poder da República, em uma de suas missões mais nobres e relevantes para a função de representação popular, e, portanto, consistem, à primeira vista, em um atentado à Constituição”. Para o relator, Dilma “tinha conhecimento do caráter proibitivo e da ilicitude da conduta”. Ao mencionar as pedaladas fiscais, o relator afirmou que “a possibilidade da existência de volumosos débitos em atraso do Tesouro junto a instituição financeira controlada afrontaria os princípios da transparência, do planejamento e do próprio equilíbrio fiscal”. “O comportamento do Executivo Federal, ao afrouxar, por conta própria, os procedimentos de gestão fiscal, permite postergar a conscientização da sociedade sobre a real situação das finanças públicas, e adia a discussão política de medidas estruturantes urgentes e necessárias ao País”, conclui o relator no parecer. Além de rejeitar os desdobramentos da Lava Jato, ele aponta “inviabilidade de eventual processo de responsabilização da presidente da República pelo não registro de valores no rol de passivos da dívida líquida do setor público”.

 

Protesto. Manifestantes fizeram protesto do lado de fora do plenário. No início da sessão, deputados governistas e de oposição bateram boca.

 

‘Desvio de deveres’

“A magnitude e o alcance das violações praticadas pela presidente da República constituíram grave desvio dos seus deveres funcionais, com prejuízos para os interesses da Nação e com a quebra da confiança que lhe foi depositada. Tais atos justificam a abertura do excepcional mecanismo do impeachment”

 

“Verifica-se haver indícios de que a presidente praticou atos que podem ser enquadrados nos crimes de responsabilidades (...) Os atos revelam indícios de graves e sistemáticos atentados a princípios da Constituição – a separação dos Poderes, o controle das finanças públicas, a boa gestão dos dinheiros públicos e o respeito às leis orçamentárias”

PARECER DO RELATOR JOVAIR ARANTES (PTB-GO)

 

PRINCIPAIS PONTOS DO RELATÓRIO

 

Pedaladas

O relatório é fundamentado principalmente nos decretos presidenciais para abertura de créditos suplementares sem autorização do Congresso e na contratação ilegal de operações de crédito, as pedaladas fiscais.

 

LRF

O relator indica que o governo descumpriu a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) e a Lei Orçamentária Anual (LOA) quando editou decretos de crédito suplementares sem adotar meios para atingir a meta fiscal.

 

TCU

Defendeu que a apuração de crime de responsabilidade pelo Poder Legislativo independe de avaliações do Tribunal de Contas da União (TCU), que rejeitou as contas da presidente Dilma Rousseff de 2014. O Congresso ainda precisa avalizar essa decisão.

 

Lava Jato

Descartou denúncias decorrentes da Operação Lava Jato, facultando ao Senado analisá-las. l Crise Cita as crises econômica, financeira e política e diz que "o governo perdeu a credibilidade aos olhos da nossa sociedade".

 

Golpe

Diz que o processo de impeachment não é golpe de Estado, pois visa a preservar valores éticos, jurídicos e administrativos.

 

Cunha

O fato de Eduardo Cunha divergir do governo não é causa suficiente para invalidar o processo.