Valor econômico, v. 16, n. 3987, 19/04/2016. Brasil, p. A8

Renan resiste a pressão e diz que respeitará prazos

Vandson Lima

Leandra Peres

Fabio Murakawa

 

Presidente do Congresso Nacional, o senador Renan Calheiros (PMDB-AL) mostrou-se irredutível em sua intenção de não acelerar prazos no trâmite do processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff.

Mesmo diante das pressões explícitas do PMDB, da oposição e até de Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que foi ao Senado pessoalmente entregar a decisão da Câmara dos Deputados, Renan apontou que seguirá estritamente o rito, cujas projeções agora indicam que o afastamento de Dilma pode até mesmo ocorrer só na terceira semana de maio, por volta do dia 17, e a possível cassação definitiva, em fins de setembro, no dia 27, na semana anterior à realização das eleições municipais, dia 2 de outubro.

Renan: "Vamos garantir o contraditório e o direito de defesa. Não podemos acelerar o processo de modo que pareça atropelo"

Em um cenário mais razoável, com os senadores trabalhando inclusive nas segundas e sextas-feiras, ainda é mais provável que o plenário vote uma saída provisória de Dilma, por até seis meses, por volta do dia 11.

Hoje os líderes se reúnem para definir os prazos e o preenchimento das vagas na Comissão Especial do impeachment, com 21 integrantes. Pela proporcionalidade das bancadas, o PMDB ficará com 5 cadeiras; PT e PSDB com 3 vagas cada; PP e PSB com duas, enquanto PSD, DEM, PR, PDT e PTB terão um senador na comissão. Outros sete partidos terão que entrar em acordo para ocupar a última vaga.

A escolha do presidente e do relator da comissão é outro motivo de embate entre os senadores. Pela tradição do Senado, os dois maiores partidos fariam a indicação, cabendo ao maior deles, no caso o PMDB, escolher um dos postos. Mas tanto PSDB quanto PT tem hoje 11 senadores em exercícios e não abrem mão da indicação. Por isso, as duas cadeiras de comando devem ser definidas em votação do colegiado.

Até a semana passada, o acerto entre PMDB, PSDB e PP era que um tucano seria o presidente e a senadora Ana Amélia (PP-RS) a relatora. Mas segundo um integrante do partido, se o líder do PMDB, Eunício Oliveira (CE) abrir mão dos cargos, "a bancada vai matar".

Os senadores petistas Jorge Viana (AC) e Lindbergh Farias (RJ) reclamaram que Ana Amélia não pode ser considerada isenta, pois há tempos se declara favorável à destituição de Dilma e seu partido, o PP, fechou questão nesse sentido. Eles acusaram o presidente do PMDB, senador Romero Jucá (RR) de liderar essa articulação. "O Romero Jucá está colocando a carroça na frente dos bois. Já está querendo dizer quem é presidente, quem é relator", disse Lindbergh. "Neste momento nós somos juízes, é preciso um relator isento. Nós não vamos aceitar a Ana Amélia".

Segundo Lindbergh, há vários senadores que se encaixam nesse perfil de isenção, inclusive pemedebistas, cujos nomes não citou.

Na entrega da decisão da Câmara, Renan reafirmou que não pretende "acelerar nem procrastinar" o trâmite, sob risco de uma eventual manobra ser contestada na justiça. "Amanhã [terça] vamos conversar sobre a indicação dos nomes das bancadas e os líderes partidários certamente precisarão de 48 horas para que possam definir o que vai acontecer com a eleição de presidente e relator", disse Renan. "Vou pedir aos líderes a presteza e celeridade, mas não podemos obrigar que eles façam isso em menos de 48 horas", afirmou. Com esse prazo, ou os senadores se reunirão na sexta-feira, entre o feriado e o fim de semana, ou na segunda-feira, como é mais provável.

Renan fez a afirmação ao lado de Eduardo Cunha, que por sua vez pediu que o procedimento no Senado "seja feito da maneira mais célere possível".

"Vamos garantir o contraditório e o direito de defesa, respeitar o devido processo legal", afirmou Renan. "Pretendemos fazer isso com absoluta isenção e imparcialidade. Não podemos acelerar o processo de modo que pareça atropelo. Nem podemos demorar, de modo que pareça procrastinação". Na mesma entrevista coletiva, Cunha disse que "a demora no processo é muito prejudicial ao país". "Hoje, o Brasil não tem governo, mas um meio governo. E isso não é bom para ninguém", afirmou.

Ainda segundo Cunha, a Câmara com seu voto deixou de reconhecer o governo Dilma. E dificilmente projetos importantes propostos pelo governo serão aprovados pelos deputados. Por isso, completou, "é preciso que [o trabalho dos senadores] seja feito de maneira mais célere possível".

 

Já Jucá voltou a insistir que o Senado precisa decidir rapidamente sobre a admissibilidade do processo de impeachment, sob pena de agravar a crise. "A economia depende dessa decisão", disse. Para Jucá, a indefinição atual mantém o país travado. "Hoje temos uma presidente que foi desautorizada pela Câmara, está em processo de impeachment convalidado, com uma condição operacional e decisória muito frágil. A Casa da federação não pode faltar à República".