Valor econômico, v. 16, n. 3978, 06/04/2016. Política, p. A8

Negociação sobre espólio do PMDB avança

Thiago Resende

Raphael Di Cunto

Lucas Marchesini

Bruno Peres

 

A presidente Dilma Rousseff avançou ontem nas negociações para barrar o pedido de impeachment que tramita na Câmara, sinalizando que pode retirar dois pemedebistas da Esplanada dos Ministérios a fim de obter o apoio das bancadas do PP e PR. Estão também na mira dos articuladores Palácio do Planalto o PSD e o PRB. O PP promove reunião de bancada hoje.

Paulo Magalhães: PSD estaria fazendo "um processo de conscientização de cada deputado da bancada" para votar contra oimpeachment da presidente

O mais recente desenho da reforma ministerial exclui o PMDB do Ministério da Saúde, que iria para o PP, e da pasta da Agricultura, que seria destinada ao PR. Essa nova formatação desagrada ao líder do PMDB na Câmara, Leonardo Picciani (RJ), que articulou a nomeação de Marcelo Castro para a Saúde.

"O PMDB rompeu. As conversas não são mais com a cúpula, mas sim com parlamentares do partido. PP, PR e PSD, juntando com partidos fiéis à base - PT e PCdoB, por exemplo - dariam a governabilidade", disse uma fonte.

A configuração, que se concretizará apenas depois da votação do processo de impeachment, inclui ainda a transferência da presidência da Caixa para o PP legenda presidida pelo senador Ciro Nogueira (PI), investigado pela Operação Lava-Jato. A sigla cresceu na "janela partidária" e hoje é a quarta maior bancada na Câmara.

Numa tentativa de reconquistar o apoio do PRB, o partido teria a preferência na escolha de dois ministérios: voltar para o Esporte ou assumir o Turismo, que foi abandonado por Henrique Eduardo Alves pouco antes de o PMDB romper com o governo. A pasta que não for escolhida pelo PRB será transferida para o PSD, sigla da base com maioria consolidada a favor do impeachment da presidente Dilma Rousseff.

Ontem, Dilma intensificou a sua agenda positiva com dois eventos públicos. Ao conversar com a imprensa após o primeiro deles, ainda pela manhã, Dilma oficializou o recuo em relação ao prazo inicial dado para a repactuação da base aliada e afirmou que "o Palácio do Planalto não está pretendendo transformar qualquer reestruturação ministerial antes de qualquer processo de votação na Câmara".

PP, PR e PSD também decidiram que só assumirão cargos depois que o impeachment for votado no plenário da Câmara ou após a votação inicial no Senado. Não faz sentido, diz o dirigente de um dos partidos, nomear um ministro sem a certeza se ficará mais de 10 dias no cargo. Ninguém garante ainda que o governo terá força suficiente para manter Dilma.

Pressionado pela ala oposicionista do PP, Ciro Nogueira, em nota, declarou que nenhum filiado será indicado para cargos no governo antes da deliberação do diretório nacional, que ainda não tem data para ocorrer. O presidente do partido articula para hoje, em reunião das bancadas da Câmara e do Senado, a declaração de apoio ao governo, o que fez os oposicionistas tentarem esvaziar a reunião no fim do dia.

O PR está com posição fechada contra o impeachment, afirmam parlamentares que defendem a saída de Dilma. "O PR é governo e continuará assim. Não teve nem negociação, é ponto final", afirmou o deputado Capitão Augusto (SP). "Vamos votar a favor do impeachment, mas terá consequências", emendou o deputado Paulo Freire (SP).

No PSD, a ordem é liberar a bancada e "respeitar as diferenças de opinião" dos deputados que não apoiaram a eleição de Dilma ou que ingressaram no partido recentemente. "Mas a orientação é votar contra o impeachment. Não vemos razão para uma medida tão drástica", defendeu o presidente do partido, o ex-deputado Guilherme Campos.

"O compromisso está firmado. O PSD está apoiando e vai dar uma votação surpreendente. Estamos num processo de conscientização de cada deputado da bancada, mostrando, inclusive, como é importante manter o governo, ainda mais depois da possibilidade de um impeachment do vice-presidente [Michel] Temer", disse o líder em exercício do PSD na Câmara, PauloMagalhães (BA).

Ontem, Dilma assegurou que está descartada uma possível mudança no Ministério da Educação (MEC). Rumores sobre a eventual saída de Aloizio Mercadante da pasta circularam nos últimos dias, mas, em uma demonstração de apoio ao ministro, a presidente o levou de última hora para o Palácio do Planalto uma cerimônia prevista inicialmente para acontecer no Instituto Federal de Brasília (IFB).

De acordo com Mercadante, isso foi feito a pedido de Dilma, quando ela soube do lançamento da "Hora do MEC", site na internet com simulados do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) e outros conteúdos. "Sempre tivemos todo apoio", disse o ministro.

A presidente classificou as notícias sobre a saída de Mercadante do MEC de "especulações sem base na verdade, sem consulta ao Palácio do Planalto". Essas especulações, prosseguiu Dilma, geram "um tipo de clima e instabilidade extremamente nocivo, transformando factóides em realidade".

"Todo mundo sabe que sem estabilidade política não se tem crescimento econômico, recuperação da economia, não se tem basicamente a volta do crescimento com geração de emprego", apontou a presidente. "A oposição, desde o dia em que eu assumi, criou todo tipo de instabilidade, uma quantidade enorme de pautas pautas-bomba."

 

Dilma citou como exemplo a proposta que transforma em juros simples a correção paga na dívida dos Estados. "Ela simplesmente é uma pauta-bomba e de hidrogênio, porque ela tem um impacto de R$ 300 bilhões", alertou a presidente.