Valor econômico, v. 17, n. 3995, 02/05/2016. Política, p. A5
Câmara deve barrar recurso contra Cunha
Para aliados do pemedebista, mentir em CPI e ocultar contas não são razões para cassar um mandato
Por: Thiago Resende / Raphael Di Cunto
A Mesa Diretora da Câmara deve barrar um recurso ao plenário dos defensores da cassação do presidente da Casa, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), se o Conselho de Ética decidir por uma pena mais branda, como uma suspensão.
Pela interpretação da Mesa, o plenário não teria poder para cassar o mandato do pemedebista e se limitaria a acatar o parecer do colegiado ou arquivá-lo. Para aliados do pemedebista, é possível convencer a maioria dos integrantes da comissão a votar por uma penalidade menor, mas dificilmente pelo arquivamento.
A cúpula do Conselho avalia apresentar um recurso ao plenário da Câmara dos Deputados se o resultado for mais leve que a cassação. Aliados de Cunha reconhecem ser quase impossível arquivar o processo no Conselho, cuja votação deve acontecer no fim deste semestre, caso o cronograma atual seja cumprido.
"Há muitas denúncias contra ele. Os documentos do Banco Central e do Supremo [Tribunal Federal] comprometem a situação do presidente", reconhece um integrante do colegiado próximo ao pemedebista.
Outro membro cita que, quando ocorrer a votação final do processo contra Cunha, haverá muita pressão popular, inclusive da imprensa. "Isso deixa o voto pelo arquivamento muito difícil", afirma.
Deputados de partidos de oposição a Cunha já não escondem o desânimo em relação ao processo no Conselho de Ética. Vão continuar batalhando pela cassação, mas contam com o Supremo Tribunal Federal, onde há um pedido da Procuradoria-Geral da República (PGR) para afastar o pemedebista aguardando deliberação desde dezembro, além de uma ação penal no âmbito da Operação Lava-Jato.
"É bem possível que o que vai sair do Conselho de Ética seja apenas uma notificação verbal. Dizer a ele [Cunha] que não pode mais fazer isso. Temos que ganhar no Conselho. Mas cada semana é uma surpresa", reclama um parlamentar empenhado na cassação do mandato do presidente da Câmara.
Desde que o pedido de impeachment da presidente Dilma Rousseff passou pela Câmara, as bancadas do PT, PCdoB e PSOL, além de deputados do Rede e PSB têm pressionado pela saída de Cunha. As votações no plenário estão sendo obstruídas, chamando a atenção do STF. "Esse Conselho se tornou impotente", declarou, em reunião na semana passada, Zé Geraldo (PT-PA), integrante do colegiado.
Na sessão em que o Conselho decidiu pela abertura de processo, o placar ficou empatado: 10 a 10. Coube ao presidente do Conselho, José Carlos Araújo (PR-BA), desempatar, opinando pela continuidade da apuração.
À época, o relator, Marcos Rogério (DEM-RO), teve que retirar parte das acusações do parecer preliminar para garantir maioria pela abertura do processo. Saiu da peça acusadora a suspeição de corrupção. Ficou a denúncia da mentira à Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Petrobras ao negar ter contas no exterior.
A Mesa Diretora defende que não é possível o Conselho ampliar o escopo das investigações, reincorporando a suposta propina em contratos da Petrobras. Rogério e a cúpula do colegiado insistem que não há limitações.
Mesmo a denúncia de mentira e ocultação de contas à Receita Federal, é suficiente para cassar o mandato do presidente da Câmara por quebra de decoro. Mas aliados dele argumentam que "não é para tanto". Ou seja, caberia "no máximo" uma suspensão.
Araújo diz que o processo será concluído pelo Conselho até o fim de junho. Cunha já recorreu à Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), que deve ser comandada por um aliado dele. O pedido pode devolver o caso à fase inicial.