-BRASÍLIA- Um dia depois do afastamento de Romero Jucá (PMDB-RR) do Ministério do Planejamento por suspeita de tentar barrar investigações da Operação Lava-Jato e em meio a sucessivos recuos em suas primeiras medidas como presidente interino, Michel Temer prometeu ontem que não irá interferir nas atividades de outros poderes, que não vê problema em reconhecer erros e que sabe governar.
A queda de Jucá com apenas 11 dias de governo foi um baque para Temer, que tratou de dizer que não pretende prejudicar o andamento da Lava-Jato. Em conversa gravada com o ex-presidente da Transpetro, Sérgio Machado, o ex-ministro do Planejamento falou que era necessário “mudar o governo”, em referência à gestão de Dilma Rousseff, para “poder estancar a sangria”, causada pela Lava-Jato.
— Muitas e muitas vezes se diz que estamos em busca de eliminar ou dificultar qualquer investigação apuratória, isso contestaria o que disse em outros momentos, não posso invadir a competência de outro poder — disse Temer, completando: — Não vamos impedir a apuração com vistas à moralidade pública e administrativa. Ao contrário, vamos sempre incentivá-la.
COMPARAÇÃO COM JK
O presidente interino utilizou ontem o primeiro pronunciamento desde que deu posse a seus ministros, há duas semanas, para demarcar diferenças entre seu governo e o de Dilma. Em contraponto a algumas das principais críticas feitas a Dilma, Temer reuniu os líderes de sua base no Congresso e destacou que preza o diálogo. Apesar de só ter mencionado a gestão anterior quando lamentou tentativas de obstrução no Congresso, Temer fez questão de se colocar aberto ao diálogo com o Congresso, onde Dilma enfrentou suas maiores resistências.
— Eu quero que toda e qualquer medida que venhamos a tomar, eu vou pedir aos senhores que cheguem até aqui para eu pré-anunciar a medida e, logo depois, sim, falaremos com a imprensa — declarou no encontro, reconhecendo que, quando era parlamentar, passou por situações em que o governo lançou medidas sem comunicar à base no Congresso.
O discurso de Temer, feito sem a presença da imprensa, foi televisionado. Ele falou ao lado de parlamentares na do Planalto em que são feitas reuniões ministeriais, em um gesto que o permitiu tanto dirigir-se aos líderes, com pedidos de esforço para votação de matérias do governo, quanto dar recados e responder a críticas. O presidente interino também contestou ataques de que costumaria voltar atrás em decisões do governo. Dilma já fez essas críticas por várias vezes, inclusive na noite de segunda-feira, após a crise que levou à queda de Jucá.
— As pessoas se acostumaram a quem está no governo não poder voltar atrás. Nós somos como o JK (Juscelino Kubitschek), nós não temos compromisso com o equívoco, portanto, quando houver algum equivoco governamental nós reveremos este fato. (...) Agora, meus caros, quando eu perceber que houve um equívoco na fala, um equívoco na condução do governo, eu reverei essa posição. Não tem essa coisa de não errei, não aceito errar, posso ter errado e procurarei não errar. Mas se o fizer, consertá-loei — afirmou o presidente, dizendo estar disposto a fazer “o governo do diálogo”.
Temer também criticou ontem os ataques que vem sofrendo do parlamento e lamentou que deputados e senadores, que há duas semanas eram governistas e tentavam vencer obstruções para viabilizar um ajuste fiscal, hoje tentem “tumultuar” as tramitações.
— Lamento dizer que muitos que até propuseram a modificação da meta, hoje anunciam que vão tentar tumultuar os trabalhos para impedir a votação — afirmou, e complementou: — Na verdade, o projeto original não foi remetido por mim. O projeto original foi remetido por quem estava no poder — disse, na única ocasião em que mencionou o governo afastado.
Com o objetivo de reafirmar a legitimidade de sua posição de presidente, Temer afirmou que, apesar de estar em situação de interinidade, isso não significa que o país deve parar. Ele refutou que haja qualquer ruptura com a Constituisala ção em seu governo e disse que o cargo de vice-presidente e a possibilidade de que este assuma a chefia de Estado em caso de afastamento do titular são consequências do texto da Constituição.
— O que devemos é fazer todos os atos e fatos que possam levar o país adiante. Eu sou uma consequência da Constituição. Não eu propriamente. O vice-presidente da República é uma consequência do texto constitucional. Portanto, quero refutar aqueles que a todo instante pretendem dizer que houve uma ruptura com a Constituição. Isso não é verdade.
Temer afirmou que tem sido vítima de agressões psicológicas.
— Estou fazendo esses comentários apenas para revelar que não temos que dar atenção a isso, temos que cuidar do país. Aqueles que quiserem esbravejar, façam como quiserem, apenas o façam pela via democrática.