Correio braziliense, n. 19350, 18/05/2016. Política, p. 2

Veto à CPMF e apoio a aliado de Cunha

Paulo de Tarso Lyra

Julia Chaib

Natalia Lambert

Os líderes do chamado centrão — bloco parlamentar formado por 13 partidos e que pode chegar a 295 congressistas, se contar com a adesão do PMDB — impôs ontem o primeiro revés ao governo de Michel Temer. Em reunião com o presidente interino, eles avisaram que a proposta de recriação da CPMF, o imposto sobre transações financeiras, não passará em hipótese nenhuma na Câmara. O mesmo conjunto de deputados quer empurrar goela abaixo do Planalto outro abacaxi: a escolha do deputado André Moura (PSC-SE) para o cargo de líder do governo.

A proposta de sepultar a CPMF neste momento serviu para unificar o discurso da base, que conta ainda com o PSDB, DEM, PSB e PPS. Mas a escolha de André Moura causa uma cizânia nos partidos que dão sustentação a Temer na Casa. “É claro que a indicação do André tem o dedo do Eduardo Cunha. Se ele for nomeado líder do governo na Casa, a cassação de Cunha não andará nunca”, alertou o líder do PPS na Câmara, Rubens Bueno (PR).

Antes da reunião no Planalto, correu a informação de que os líderes aliados levariam a Temer um abaixo-assinado com quase 300 assinaturas demonstrando apoio a André Moura. Levando-se em conta que, durante a votação do impeachment na Câmara, Temer contou com 367 votos favoráveis ao afastamento de Dilma Rousseff, a intenção, em tese, era emparedar o peemedebista e forçá-lo a anunciar o nome do afilhado de Eduardo Cunha.

O grupo recuou na última hora, mas continua não achando constrangedor que o novo governo tenha como líder na Casa um deputado tão afinado com o presidente afastado da Câmara. “Não vejo constrangimento nenhum. Um líder do governo precisa, sim, ter bom trânsito entre todos os parlamentares. Isso o André tem”, afirmou o líder do PSD, Rogério Rosso (DF).

O ministro da Secretaria de Governo, Geddel Vieira Lima, negou que tenha sido batido o martelo quanto a uma indicação para a liderança do governo. “O presidente não recebeu indicação de líderes. Este assunto será negociado, tratado, mas é prerrogativa do presidente”, disse. O governo estuda uma terceira via que fuja à indicação de Moura e de Rodrigo Maia, que seria a opção capitaneada por DEM e PSDB.  “Enquanto o presidente não designa quem vai exercer a liderança, os líderes dos partidos tocarão a pauta sem nenhuma dificuldade, não tenho dúvida disso”, afirmou Geddel.

Em relação à CPMF, o Planalto concordou em recuar na defesa da volta do imposto neste momento. Temer, inclusive, avisou que vai retirar o projeto sobre o tema que tramita na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara.

O presidente em exercício pediu, contudo, que os parlamentares retomem a normalidade de votações na Câmara. Temer quer aprovar as medidas provisórias que trancam a pauta e aceitou retirar a urgência do projeto que renegocia a dívida de estados e municípios com a União para facilitar o debate interno. Hoje, o peemedebista se reúne com os líderes do Senado, às 9h, no Jaburu.

Com mais ênfase, os líderes do PPS, Rubens Bueno (PR), e do DEM, Pauderney Avelino (AM), cobraram uma atuação do Planalto na crise que envolve a permanência do deputado Waldir Maranhão (PP-MA) na Presidência da Câmara. Temer lavou as mãos e disse que não tinha como interferir nessa questão. E que o assunto deveria ser resolvido pelos líderes aliados, para que a Câmara volte a funcionar normalmente.

 

Renúncia

Na primeira sessão em que se sentou à cadeira como presidente interino da Câmara dos Deputados, Waldir Maranhão (PP-MA) enfrentou um plenário agressivo e agitado. O parlamentar esteve na posição por pouco mais de uma hora. Discursos pediam a sua renúncia e, em vários momentos, ouviu gritos de “fora, fora”. Teve, inclusive, dificuldades para encerrar a sessão, às 18h55, por causa dos gritos de ordem que parlamentares bradavam no plenário pedindo a saída dele. Uma nova sessão está marcada para as 14h, e a reunião de líderes, para definir a pauta, será às 10h.

Com um discurso inflamado, o líder do DEM, Pauderney Avelino (AM), pediu a renúncia do parlamentar. “Levante-se dessa cadeira. A Câmara dos Deputados não merece o que o senhor está fazendo. O Brasil não merece o que o senhor fez na semana passada”, disse, em referência ao ato assinado por Maranhão que revogava a sessão de votação do impeachment de Dilma Rousseff na Câmara em 17 de abril e anulado horas depois.

Em resposta imediata, deputados do PT, PDT e PSol se manifestaram favoráveis à permanência de Maranhão. “Quem pariu Matheus que o embale. Ele teve o voto de vocês. Foi eleito. O PSol não apoia Waldir Maranhão, mas não tolerará qualquer manobra que fuja da legalidade’, afirmou o líder do PSol, Ivan Valente (SP).

 

Defesa ao vivo no Conselho de Ética

 

Afastado pelo Supremo Tribunal Federal da Presidência da Câmara desde o começo do mês, Eduardo Cunha (PMDB-RJ) decidiu ir pessoalmente ao Conselho de Ética se defender no processo que analisa a cassação de seu mandato por quebra de decoro parlamentar. Por meio de um ofício entregue pelo advogado Marcelo Nobre ao colegiado, o peemedebista manifestou o “interesse em se defender”. O depoimento será amanhã, às 9h30, último dia da fase de instrução probatória — momento em que se colhem provas dos fatos apresentados. Para o relator do processo, deputado Marcos Rogério (DEM-RO), Cunha será muito importante para o esclarecimento dos fatos e a presença dele não atrasa o cronograma de entrega do relatório, que ficará pronto até o fim do mês. (NL)