Planalto teme reação de peemedebista

Tânia Monteiro,  Carla Araújo

15/06/2016

 

LAVA JATO NO CONGRESSO - Interlocutores de Temer adotam discurso de que processo pertence ao Legislativo, mas admitem preocupação com ‘poder explosivo’ de Cunha

A aprovação do pedido de cassação do deputado afastado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) no Conselho de Ética ampliou o clima de cautela no Palácio do Planalto. Interlocutores do presidente em exercício Michel Temer tentam reforçar o discurso de que o tema pertence ao Legislativo e não ao Executivo, mas admitem que há receio do “poder explosivo” do presidente afastado da Câmara.

Depois da votação, o ministro da Secretaria de Governo, Geddel Vieira Lima, esquivou-se de falar sobre o assunto. “Prefiro não comentar. Esse é um assunto da Câmara”, disse Geddel. Mais cedo, em agenda no Rio, o próprio Temer declarou que o Executivo não interferiria nos demais Poderes e que, ao assumir interinamente a presidência, pregou a “reconstitucionalização” do País. “É preciso acabar com o Executivo se meter nas coisas do Legislativo e do Judiciário”, afirmou.

Apesar da tentativa de deixar esse assunto “do outro lado da rua”, um aliado de Temer que esteve no Planalto após o resultado demonstrava claramente a sua preocupação com Cunha. “Essa conta vai ser alta. Ele não vai cair sozinho”, disse.

Ainda não se tem a exata dimensão de como esse primeiro momento pós aprovação da cassação de Cunha no Conselho de Ética poderá interferir nas votações das medidas econômica que Temer está encaminhando à Câmara, consideradas “cruciais” para o governo interino.

Proximidade. Apesar da tentativa de Temer se manter “neutro” quanto à situação de Cunha, a relação de todos os peemedebistas com o presidente afastado da Câmara é muito próxima. Embora Temer não esteja se encontrando com Cunha, como acontecia antes, vários interlocutores fizeram este papel. Geddel, por exemplo, chegou a visitá-lo, dias depois de ele ser afastado pelo Supremo Tribunal Federal. Sempre houve solidariedade implícita ao peemedebista e nos bastidores sabe-se que o Planalto, nos bastidores, de alguma forma, trabalhou para protegê-lo. “Não há alívio mas sim lamento”, observou um assessor palaciano.

Com o avanço das investigações da Operação Lava Jato e o cerco se fechando contra Cunha também criou- se um temor de que, como vingança, ele possa “sair atirando”, atingindo o próprio Temer. No pedido de afastamento de Cunha do mandato e da presidência da Câmara, o ministro do STF Teori Zavascki transcreveu mensagens por celular entre o deputado e o empreiteiro Léo Pinheiro, sócio da construtora OAS. Uma delas fala de um certo “Michel” que teria sido contemplado com R$ 5 milhões pelo empreiteiro. Para os investigadores da Lava Jato, é uma referência a Temer. No entanto, não há nenhuma Investigação contra o presidente em exercício.

A assessoria de Temer justifica a citação a uma “doação eleitoral declarada dentro da prestação de contas da candidata Dilma Rousseff, na conta Michel Temer 2014” no valor exato de R$ 5 milhões e na qual não “há nenhuma ilegalidade ou ilícito”.

Surpresa. Também houve surpresa no Planalto com o posicionamento do deputado Wladimir Costa (SD-PA), que todos consideravam voto certo contra a cassação do peemedebista e com o voto considerado decisivo da deputada Tia Eron (PRB-BA).

 

O Estado de São Paulo, n. 4480, 15/06/2016. Política, p. A5