Correio braziliense, n. 19344, 12/05/2016. Política, p. 2

Com Dilma afastada, Temer vai pedir união

No primeiro discurso à nação, hoje à tarde, o peemedebista pedirá o apoio da sociedade e apresentará a diretriz do novo governo: a redução do tamanho da máquina administrativa

Por: Paulo de Tarso Lyra e Denise Rothenburg

 

O primeiro discurso de Michel Temer como presidente em exercício da República vai ser uma convocação para que todos — políticos, empresários e sociedade — se unam neste momento de transição para o êxito de “um governo de salvação nacional”. Embora ciente de que tem pouco tempo para apresentar propostas concretas ao país, sob pena de se acabar a lua de mel com os brasileiros, Temer não apresentará hoje nenhuma ação imediata. “Não mostraremos um pacote. Daremos as diretrizes políticas e econômicas do nosso governo”, disse um aliado direto do vice-presidente. Até o fechamento desta edição, às 2h, a votação da admissibilidade do impeachment de Dilma Rousseff não havia terminado no Senado, mas, pelos discursos proferidos, ficava claro que o afastamento seria aprovado.

Temer estava ontem, no Palácio do Jaburu, rascunhando o discurso que pronunciará no meio da tarde hoje, assim que assumir definitivamente o governo. Ele pediu a um conjunto de deputados aliados que estejam ao lado dele durante o primeiro pronunciamento ao país. A intenção do peemedebista é deixar claro que todos têm um papel fundamental neste momento de dificuldade.

O peemedebista dirá que o próprio Executivo Federal está ciente da gravidade do momento e que decidiu, por isso, reduzir o tamanho da máquina administrativa, com o corte de ministérios e de cargos comissionados e de confiança. Para Temer, esses gestos, além de possíveis revisões de gastos supérfluos, poderão contribuir com a redução do deficit fiscal e permitir que, ainda este ano, as taxas de juros comecem a ser reduzidas, abrindo espaço para a retomada do crescimento no início de 2017.

Temer também reservará espaço no discurso para dois pontos que têm sido alvo de profundas críticas. O vice-presidente vai reiterar o que já dissera no áudio vazado antes da votação do impeachment na Câmara, em 17 de abril: não vai acabar com os programas sociais. O cuidado do peemedebista é tanto que ele acabou ficando atado em relação ao reajuste do Bolsa Família, anunciado pela presidente Dilma Rousseff no 1º de maio — ela ficará 180 dias afastada, prazo máximo para o julgamento final do processo de impeachment pelo Senado. Em um primeiro momento, Temer pensou em vetar o reajuste. Recuou, para não tomar uma medida impopular logo de saída.

O outro ponto que o vice-presidente deixará bem claro é que, em hipótese alguma, impedirá os desdobramentos da Operação Lava-Jato. Esse tema ficou de fora do áudio vazado, o que deixou dúvidas, especialmente entre os procuradores e petistas, se o novo governo tentaria tolher as investigações conduzidas pelo juiz Sérgio Moro, em Curitiba.  O vice-presidente reforçará o argumento de que o Brasil precisa manter o combate à corrupção para ganhar maturidade institucional e democrática.

Para o professor de ciência política da Universidade de Brasília (UnB) Ricardo Caldas, a tarefa de Michel Temer não é fácil. Mas ele precisa, de imediato, dar sinais de um esforço para reduzir o deficit tributário do país. Caldas acredita que a equipe do futuro presidente insistirá na recriação da CPMF, mas não agora. “Ele sabe que é um tema polêmico. O próprio PSDB e a Federação das Indústrias de São Paulo (Fiesp) são contra o aumento da carga tributária”, lembrou o professor da UnB.

Temer também enfrentará dificuldades com a oposição empedernida que o PT vai praticar, na opinião de Ricardo Caldas. “Eles vão insistir na tese do golpe, de que o impeachment é injusto por não haver crime de responsabilidade. O PT precisa manter esse discurso aceso, por uma questão de sobrevivência, até as eleições de 2018”, reforçou.

Já o mercado tem clara uma coisa. A saída de Dilma é motivo de celebração. A entrada de Temer é algo que precisa de mais tempo para ser avaliado. “Temer está em um dilema. Ele não pode dar calote nem no mercado nem na classe política. Se fizer algo contra qualquer um dos dois, perde as condições de governar”, resumiu um representante de uma agência de investimentos internacional.

Esse mesmo investidor lembra as palavras do vice-presidente em um evento com socialites no ano passado, quando disse que um governo com 8% de popularidade não tem condições de terminar. “Essa é, justamente, a aprovação popular que o Temer tem agora. Ele sabe que precisa enviar reformas importantes e impopulares para o Congresso, como a trabalhista e a previdenciária. Mas dificilmente fará isso num primeiro momento”, completou o especialista financeiro.

Os investidores também estão esperançosos de que a secretaria a ser conduzida por Moreira Franco crie condições para destravar concessões e parcerias público-privadas no setor de infraestrutura.

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