Sob risco de prisão, Cunha pressiona partidos para tentar salvar mandato

Isabel Braga, Simone Iglesias, Maria Lima e Renan Xavier

09/06/2016

 

Para ajudar peemedebista, PR troca integrantes da comissão que votará mudança de regra

Sob ameaça de prisão, o presidente afastado da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), tem atuado, com apoio de seus aliados, em várias frentes para garantir o mandato. Após forte pressão sobre o PRB, partido sobre qual Cunha já exercia influência, para garantir o voto da deputada Tia Eron, ontem a atuação foi junto ao PR, com a mudança de integrantes do partido na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ).

A estratégia de Cunha é garantir no Conselho de Ética a aprovação de uma pena mais branda, e validar na CCJ a consulta que impede que o plenário da Câmara retome uma pena mais dura. Cunha e seus aliados sabem que, em plenário, com o voto aberto e a pressão da sociedade por sua cassação, será difícil conseguir formar uma maioria que o proteja.

Para evitar revezes a Cunha na CCJ, o PR retirou ontem da comissão os deputados Jorginho Mello (SC) e Paulo Freire (SP), e colocou dois defensores explícitos do presidente afastado: Wellington Roberto (PB) e Laerte Bessa (DF). Também foi nomeado como suplente o deputado João Carlos Bacelar (PRBA), autor do voto em separado que defende a suspensão do mandato por três meses.

Cunha teria atuado diretamente para garantir a mudança. Segundo deputados, na noite de anteontem, um grupo de parlamentares do PR foi à residência de Cunha para discutir as substituições na CCJ. Estavam presentes o líder do PR, Aelton de Freitas (MG), o líder do governo na Câmara, André Moura (PSC-SE), e o ex-deputado Sandro Mabel, que já foi do PR e hoje é do PMDB e assessor especial do presidente Michel Temer. Cunha disse ao GLOBO, por mensagem, que não teve influência “nenhuma” e que “jamais” conversou sobre isso com o líder do PR.

O deputado Jorginho Mello, que anteontem tinha criticado o relatório do deputado Arthur Lira (PP-AL) sobre a consulta que pode beneficiar Cunha em plenário, foi surpreendido pela manhã com sua substituição. Mais tarde, Aelton divulgou nota afirmando que Jorginho tinha sido substituído porque a “maioria da bancada estava insatisfeita” com sua atuação na CCJ.

Assim como o PR, o PP, se for preciso, também está disposto a mudar deputados na CCJ para favorecer Cunha na votação da consulta. O deputado Fausto Pinato (PP-SP) vem sendo apontado por colegas de bancada como substituível. Esperidião Amin (PP-SC), que é titular da CCJ, disse que independentemente do resultado no conselho, cabe mudança no plenário da Câmara.

— O plenário é soberano. O resto é o resto. As comissões são importantes mas nenhuma delas substitui o plenário — disse Amin, que criticou a saída de Mello:

— Esse é um precedente inédito. Muito grave, cheira mal. Mello é um deputado assíduo, não tem justificativa.

No Conselho de Ética, nova reunião para votar o parecer foi marcada para a próxima terçafeira. O relator, Marcos Rogério (DEM-RO), disse que mantém a pena de cassação e rechaçou a acusação de Cunha de que houve “manobra espúria” com o adiamento da sessão:

— Mesmo afastado, Eduardo Cunha está construindo o resultado que ele quer, que é punição zero. No Conselho de Ética, ele tirou o Pinato e colocou Tia Eron. Na CCJ, está fazendo a mesma coisa: tirando quem é contra e colocando quem é a favor da consulta que engessa a pena do conselho na votação em plenário.

No PRB, dirigentes evitam a pressão de Marcelo Crivela e Celso Russomano, candidatos a prefeito do Rio e São Paulo pelo partido, por uma reunião de emergência para debater o voto de Tia Eron.

— Reunião da bancada, quem convoca é o líder, e eu não vou convocar para isso. O voto é uma questão pessoal da deputada Tia Eron — disse o líder Márcio Marinho (PRB-BA), conterrâneo da deputada. (*Estagiário sob supervisão de Maria Lima).

 

 

O globo, n. 30257, 09/06/2016. País, p. 6.