O Estado de São Paulo, n. 44788, 02/06/2016. Economia, p. B8

Governo não vai controlar preço da gasolina, diz Parente

Novo presidente da Petrobrás afirmou, ao tomar posse ontem em Brasília, que decisões sobre preços serão de ‘natureza empresarial’

 

Em recado direto aos investidores da Petrobrás, o novo presidente da companhia, Pedro Parente, assegurou que não haverá interferência do governo na gestão de preços dos combustíveis. Em entrevista após tomar posse ontem, no Palácio do Planalto, Parente disse que a decisão sobre preços será de “natureza empresarial”. Parente frisou que a interferência política na estatal não existe mais. “Já acabou”, afirmou, ao responder de forma bem sucinta a uma pergunta depois da cerimônia. Segundo ele, a orientação do presidente em exercício Michel Temer é de que a empresa tenha uma gestão profissional e sem interferência do governo.

A posse do presidente da Petrobrás ocorreu numa cerimônia conjunta na qual também foram empossados os novos presidentes do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social, Maria Silvia Bastos Marques; do Banco do Brasil, Paulo Caffarelli; da Caixa Econômica Federal, Gilberto Occhi, e do Instituto de Pesquisa Econômica e Aplicada (Ipea), Ernesto Lozardo.

Para identificar a escolha dos novos executivos com o esforço de traçar uma agenda positiva na economia, o presidente em exercício Michel Temer recomendou aos presidentes que as instituições oficiais sejam um braço do governo para a retomada da atividade.

A posse ocorreu depois de anunciada a retração de 0,3% do Produto Interno Bruto (PIB) no primeiro trimestre, que marca dois anos de recessão no País, e os executivos saíram com o discurso afinado de que os bancos oficiais continuarão agindo em apoio aos projetos do governo de reativação da economia. A meta no momento é sair da recessão e estancar o avanço do desemprego. Enquanto o discurso dos presidentes dos bancos públicos foi em direção ao alinhamento com o governo, o da Petrobrás procurou desvencilhar dos projetos da companhia a interferência do Planalto. Ao descartar uma nova capitalização, Parente deixou claro que a petrolífera terá de resolver seus problemas sem a ajuda do Tesouro. De acordo com dados divulgados pela estatal, no primeiro trimestre deste ano o endividamento total ultrapassava R$ 450 bilhões, sendo R$ 62 bilhões com vencimento no curto prazo.

Para Parente, a solução da crise passará necessariamente pela venda de ativos. “Vocês conhecem a situação do Tesouro e ouviram o presidente Temer falar que existe um déficit da ordem de R$ 170 bilhões. Como é que a empresa poderia contar com o Tesouro numa situação como essa?, argumentou. Ele evitou fazer previsões de reajuste dos preços dos combustíveis e não quis dar detalhes do plano de ação à frente da companhia.

“Não vou responder a essa pergunta. Vocês podem tentar 50 vezes que eu não vou falar especificamente sobre o que vai acontecer com os preços. Seria irresponsável da minha parte falar isso.” A forte ingerência do governo petista na gestão da empresa e nos preços dos combustíveis foi alvo recorrente das críticas de investidores e contribuiu para a perda de valor que a estatal passou a enfrentara partir do escândalo das acusações de corrupção reveladas pela Operação Lava Jato.

Operação conjunta. Paulo Caffarelli, do BB, disse que os bancos estão juntos em busca de soluções para o momento econômico do País. “Isso se faz com estímulo à exportação e aumento do crédito para as empresas”, afirmou, em uma curta entrevista. Em seguida, ao Estado, ele explicou que os bancos farão reestruturação, para atrair capital estrangeiro, de operações de infraestrutura com investimentos estimados em R$ 1,5 trilhão.

Já o novo presidente da Caixa, Gilberto Occhi, disse que o governo Temer busca a reversão dos números ruins da economia. “Vamos trabalhar para que sejam retomadas as ações produtivas para que o Brasil possa voltar a crescer. A Caixa vai continuar a ser grande contribuidora dessas medidas.” Segundo Occhi, a ordem é por o “pé no acelerador” para que o banco continue sendo “indutor” do crédito. “Vamos trabalhar em equipe, acho que vai facilitar muito para conseguirmos o que todos desejam, que é retomada da economia”, disse Maria Sílvia, do BNDES.

A devolução de R$ 100 bilhões do BNDES ao Tesouro, anunciada pelo ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, não deve diminuir o papel do banco de fomento. Segundo ela, as parcelas foram calculadas em conformidade com a expectativa da instituição para desembolsos nos próximos anos.

Occhi disse que vai retomar “imediatamente” as obras de 80 mil unidades do Minha Casa Minha Vida que estão paradas, sendo a maioria destinada a famílias com renda mensal de até R$ 1,8mil, e de outros projetos que estavam parados no banco com a indefinição sobre quem assumiria a presidência da instituição. Occhi pretende apresentar a Meirelles alternativas para que o banco não precise de injeção de recursos do Tesouro Nacional acurto e médio prazos. Ele afirmou que a ideia é que a Caixa se concentre apenas na atividade bancária, ganhe eficiência e valorize seus ativos. / ADRIANA FERNANDES, MURILO RODRIGUES ALVES, CARLA ARAÚJO e LU AIKO OTTA

 

Prematuro

“Seria irresponsável da minha parte falar sobre o que vai acontecer com o preço dos combustíveis agora.”

Pedro Parente

PRESIDENTE DA PETROBRÁS

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Foco do BNDES deve ser em privatizações e concessões

A nova presidente do banco, Maria Silvia Bastos Marques, disse que financiamentos devem beneficiar a sociedade

Por: Vinicius Neder, Idiana Tomazelli e Mariana Sallowicz

 

 

O foco na privatização de serviços de infraestrutura, com mais recursos privados e menos dinheiro público para crédito subsidiado, deu o tom da posse de Maria Silvia Bastos Marques como presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Diretora do banco no início dos anos 1990, ela voltou sob respaldo do ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, falando em privatização e negando que vá fazer uma “devassa” nos empréstimos dos últimos anos. “A sociedade questiona a alocação de recursos públicos escassos”, afirmou Maria Silvia, no discurso de posse. Aplicações do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT) e aportes do Tesouro Nacional são as principais fontes de baixo custo do BNDES, que assim empresta com taxas subsidiadas, inferiores à Selic, a taxa básica de juros, hoje em 14,25%. Sem recursos públicos, Maria Silvia ressaltou que o BNDES precisa escolher prioridades. “Cabe ao BNDES financiar projetos cujos retornos sociais superem os privados, sem deixar de lado empresas sem fonte de longo prazo”, afirmou.

Isso significa, explicou depois em entrevista coletiva, oferecer menos crédito subsidiado a grandes empresas com acesso ao mercado financeiro e ajudar a desenvolver fontes privadas de financiamento. De manhã, em Brasília, Maria Silvia destacou que a política operacional do banco seria alterada nesse sentido. Como desafio de atrair recursos privados para as concessões de infraestrutura, Maria Silvia incluiu um novo cargo na remodelada diretoria apresentada ontem. Um assessor, ligado diretamente à Presidência, trabalhará com concessões, parcerias público-privadas (PPPs) e privatizações, em coordenação com a secretaria executiva do Programa de Parceria em Investimentos (PPI), comandada por Moreira Franco.

Na posse, Maria Silvia lembrou o papel do BNDES nas privatizações, área na qual trabalhou.

“O banco também possui notória capacidade como gestor, executor e apoiador de processos de diversas formas de desmobilização de ativos, como concessões, PPPs e privatizações”, disse. Depois, reconheceu que não há mais muitas estatais para privatizar e que o foco é mesmo nas concessões. Meirelles, que viajou ao Rio especialmente para acompanhar a posse, reforçou o tom.

“O BNDES deve atuar de forma decisiva em algo que é crucial, que é o processo de concessões e a retomada das privatizações”, disse o ministro, fazendo questão de frisar que falava em “privatizações”. A menção não passou em branco para o ex-presidente do Banco Central (BC) Gustavo Franco, presente à posse. “Muito interessante ouvir a palavra privatização pronunciada nesta casa de forma tão enfática”, disse.

Maria Silvia também evitou polêmicas. Ressaltou que a devolução de R$ 100 bilhões da dívida do BNDES com a União, ao longo de três anos, como anunciado semana passada, não afetará a capacidade de emprestar diante da demanda atual e só será feita com respaldo dos órgãos de controle. Disse ainda que sua única condição para assumir o cargo foi ter autonomia para montar a diretoria. Entre os nomes conhecidos estão Solange Paiva, ex-presidente da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), que será chefe de gabinete; Marilene Ramos, recém-saída da presidência do Ibama, que cuidará da área de Infraestrutura; e Eliane Lustosa, ex-diretora do Petros, fundo de pensão dos

 

Papel do banco

“A sociedade questiona a alocação de recursos públicos escassos.” “Cabe ao BNDES financiar projetos cujos retornos sociais superem os privados, sem deixar de lado em fonte de longo prazo.”

Maria Silvia Bastos Marques

PRESIDENTE DO BNDES

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TCU aponta falhas na fiscalização de obras do banco fora do País

Relatório do tribunal aponta concentração de 99% dos empréstimos internacionais em apenas cinco empreiteiras

Por: André Borges

 

O Tribunal de Contas da União (TCU) encontrou uma série de falhas nos procedimentos usados pelo BNDES para financiar obras de infraestrutura fora do País. Em relatório apresentado ontem, o tribunal concluiu que, além de haver uma concentração de 99% dos empréstimos internacionais do banco em apenas cinco empreiteiras, todas elas investigadas pela Operação Lava Jato, o BNDES não fiscaliza a aplicação desses recursos como deveria.

As informações que a equipe de auditoria apontou, segundo o ministro Augusto Sherman Cavalcanti, permitem concluir que o BNDES não faz a análise dos componentes e dos respectivos valores (preços e custos) desde a análise da proposta de financiamento até exportação de serviço, “salvo, talvez, a uma avaliação de macro aspectos e relações entre os itens e o valor global apontado para a obra objeto do financiamento”.

Não há clareza, por exemplo, em relação a recursos usados nos financiamentos, como aqueles oriundos do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT), segundo o TCU.A corte de contas ressalta ainda que os pedidos de financiamento dificilmente são indeferidos pelo BNDES depois de já terem ultrapassado os primeiros passos dos contratos e que “não existe um procedimento específico que se destine a comprovara produção dos serviços e sua exportação”.

Na lista de empréstimos polêmicos e que necessitam de aprofundamento de investigações está o Porto de Mariel, em Cuba, que foi construído pela Odebrecht. O empreendimento recebeu financiamentos do BNDES da ordem de US$ 682 milhões em cinco etapas, o equivalente a aproximadamente R$ 2,39 bilhões. “Além de se tratar de financiamento de elevado valor, o porcentual de itens exportados, em valor, é bastante significativo frente ao valor total da obra informado, o que aponta necessidade de uma análise mais acurada sobre a lista de itens exportados, seus valores, e sua representatividade no conjunto da obra”, diz Cavalcanti.

Empresas. A construtora Odebrecht foi a empreiteira brasileira que mais concentrou empréstimos do BNDES para financiar obras de infraestrutura fora do País. Nos últimos anos, a construtora que está no centro das investigações de corrupção da Operação Lava Jato recebeu US$ 31,7 bilhões do banco de fomento, o equivalente a 81,8% de tudo o que o BNDES destinou para projetos no Exterior.

Na última década, aponta o relatório, o BNDES emprestou um total de US$ 38,7 bilhões para essas operações internacionais.

Depois da Odebrecht, a companhia que mais sacou recursos do banco público foi a construtora Andrade Gutierrez, com US$ 3,713 bilhões, ou 9,6% do total. A lista é seguida pela Queiroz Galvão, que usou US$ 1,888 bilhão , ou 5% do total; Camargo Corrêa, que obteve US$ 632 milhões (1,6%); e OAS, que foi atendida em US$ 393 milhões (1%).

Ao TCU, o BNDES afirmou que “a restrição é inerente ao próprio mercado de serviços de engenharia” e que sua atuação não contribui para concentrá-lo, “mas sim para fortalecer a capacidade de empresas brasileiras competirem no mercado internacional.”

 

Desembolso

Na última década, o BNDES emprestou US$ 38,7 bilhões para operações internacionais. A companhia que mais sacou recursos foi a construtora Odebrecht com US$ 31,7